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Bens móveis e imóveis
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Everaldo Augusto Cambler
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Última publicação, Tomo Direito Civil, Edição 3, Julho de 2024
A Constituição Federal de 1988, como doutrina Arruda Alvim, ao prever e garantir o Direito de propriedade (art. 5º, inciso XXII), não nos apresenta um conceito, uma definição ou indica o que pode ser objeto de propriedade. Destarte, podemos englobar, na previsão constitucional, não apenas os bens imóveis e móveis, mas todo e qualquer bem de valor econômico, material ou imaterial, significativos de patrimonialidade.1
De uma maneira abrangente, encontramos a expressão “patrimônio” utilizada, não somente para designar o complexo de relações jurídicas de uma pessoa, que possua valor econômico, mas também para referir aquilo que é produzido, material ou imaterialmente, por determinada comunidade – o patrimônio histórico e artístico -, previsto, por exemplo, no §1º do art. 1.228 do Código Civil,2 bem como para reportar a segregação de bens – o patrimônio de afetação –, reconhecida pelo ordenamento, voltada para a consecução de determinado objetivo, v.g, a incorporação imobiliária submetida ao regime da afetação (arts. 31-A e seguintes da Lei 4.591, de 16 de dezembro de 1964).3
O Livro II da Parte Geral4 do Código Civil brasileiro (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002), em seu título único, cuida das diferentes classes de bens (arts. 79 a 103), assim considerados os valores materiais ou imateriais, que servem de objeto a uma relação jurídica,5 dedicando um capítulo aos bens considerados em si mesmos (arts. 79 a 91), um capítulo aos bens reciprocamente considerados (arts. 92 a 97) e um capítulo aos bens públicos (arts. 98 a 103). O objeto jurídico mediato da relação jurídica, portanto, corresponde a bens materiais (coisas) ou imateriais (energias, direitos), enquanto seu objeto imediato compreende o regime jurídico ou a estrutura mesma da relação – prestações omissivas ou comissivas.6
Dentre os bens considerados em si mesmos, o diploma civil dispõe sobre os bens imóveis e móveis, os fungíveis e consumíveis, os divisíveis, os singulares e os coletivos. O presente verbete analisará os aspectos jurídicos atinentes aos bens imóveis e móveis, procurando trazer a lume o regime jurídico reservado a eles no âmbito do ordenamento brasileiro.
1. Prolegômenos
Tormentosa na doutrina a conceituação de bem e de coisa, admitindo-se, mais correntemente, que a noção jurídica de bem é mais ampla e a relação entre bem e coisa é a do gênero para a espécie.7 Precedendo o Código Civil alemão, que distingue as coisas dos bens pela sua materialidade (“§ 90. Coisas, no sentido da lei, são somente objetos corporais”),8Teixeira de Freitas definiu coisa como “todo o objeto material suscetível de medida de valor”, criticando, inclusive, a definição romana da coisa corpórea e incorpórea.9
Adotando essa mesma linha de pensar, Orlando Gomes sublinha a maior amplitude da noção jurídica de bem – gênero do qual “coisa” é espécie -, abrangendo toda a utilidade, material ou ideal, que possa incidir na faculdade de agir do sujeito, quer possua o bem imaterial valor pecuniário ou não (direito autoral, direito à vida),10 cumprindo observar que o vocábulo “coisa’ também é empregado para designar tudo quanto existe, fora ou além do homem, inclusive aquelas que escapam à sua esfera de ação, como os corpos celestes, que não são bens no sentido jurídico.
No escólio de Arruda Alvim, o objeto material do Direito das Coisas, e, por extensão, objeto da atividade do Registro de Imóveis, são as coisas propriamente ditas, ou seja, objetos corpóreos, tangíveis e, por isso, que tenham consistência, o que excluiria a água corrente, por exemplo. Aliás, o Código Civil português possui texto expresso a respeito (“Artigo 1302º - Objecto do direito de propriedade. Só as coisas corpóreas, móveis ou imóveis, podem ser objecto do direito de propriedade regulado neste código”) e retrata a mesma realidade que encontramos no ordenamento jurídico brasileiro.11 Assim, estariam fora do âmbito de incidência real os direitos autorais e os intelectuais, por absoluta incompatibilidade entre o regime jurídico dessa espécie de direito e os ditames gerais do direito das coisas, merecendo, inclusive, regulamentação própria.12
Todavia, isto não significa que, de modo expresso e excepcional, uma realidade, que não seja coisa, possa ser admitida no âmbito do regime do Direito das Coisas, v.g., o fundo de investimento (“Art. 1.368-C. O fundo de investimento é uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de natureza especial, destinado à aplicação em ativos financeiros, bens e direitos de qualquer natureza” – destaque nosso – Código Civil); o penhor de direitos (“Art. 1.451. Podem ser objeto de penhor direitos, suscetíveis de cessão, sobre coisas móveis” – Código Civil).
2. Dos bens imóveis
Ao tratar das diferentes classes de bens, o diploma civil distingue, dentre os bens considerados em si mesmos, os bens imóveis dos móveis, seguindo a tradição do Direito Romano, que apresentava várias classificações para tudo que pode ser objeto de um direito patrimonial (res). Dentre elas, há aquelas que dizem respeito às coisas concebidas como objeto de um direito em geral: res corporales e res incorporales, res mancipi e res nec mancipi. São coisa corpóreas (res corporales) as que podem ser tocadas, como, v.g., os prédios urbanos e os rústicos;13 são incorpóreas (res incorporales) aquelas intocáveis, como as que consistem em um direito, v.g., a herança, usufruto e as obrigações.
A distinção das coisas em res mancipi e res nec mancipi, sob muitos aspectos, corresponde à moderna distinção entre coisas imóveis e móveis, cujo interesse prático, em particular, decorre da necessidade da observância de formas especiais para a transferência da propriedade imóvel, bem como pela diversidade de prazos para a usucapião. De fato, o ius civile exigia, para a transferência da res mancipi, atos solenes que, por sua publicidade, ofereceriam a certeza das relações jurídicas realizadas. Já as res nec mancipi podiam mudar de proprietário pela simples entrega (traditio). A propriedade e as construções, portanto, poderiam ser encontradas entre as res mancipi.14 A seguir, apresentamos as quatro classes de imóveis usualmente reconhecidas no sistema do nosso Código Civil.15
2.1. Classificação
2.1.1. Imóveis por natureza
Nos termos do art. 79 do Código Civil, “[s]ão bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente”; dito de outro modo, bens imóveis são aqueles que se não podem transportar, sem destruição, de um lugar para outro, compreendendo o solo com a sua superfície, os seus acessórios e adjacências não artificiais (as árvores e frutos pendentes), o espaço aéreo e o subsolo.16
Destarte, a propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, reconhecendo o legislador, como critério de aproveitamento, a altura e a profundidade úteis ao exercício do titular (art. 1.229 do Código Civil), somente podendo opor-se o proprietário às atividades de terceiros realizadas a uma altura e profundidade que interfiram na implementação das faculdades inerentes ao seu direito subjetivo de propriedade, descritas no art. 1.228, caput, do Código Civil.17
As águas, que constituem a porção líquida do solo, estão submetidas às normas do direito de vizinhança estabelecidas no Código Civil (arts. 1.288 a 1.296), bem como ao regime de lei especial, designada Código de Águas – Decreto-lei 24.643/1934 combinado com o Decreto-Lei 852/1938. Assim, também, além do regramento encontrado no art. 1.230 do Código Civil,18 as jazidas e demais riquezas do subsolo, consideradas de titulação da União,19 estão sujeitas à legislação específica – Decreto-Lei 227/1967 combinado com a Lei 9.314/1996 (Código de Mineração).
Alguns acréscimos naturais podem ser incorporados aos imóveis e considerados modos de aquisição da propriedade imobiliária por acessão (art. 1.248 do Código Civil). São as acessões por formação de ilhas (as ilhas que se formarem em correntes comuns ou particulares pertencem aos proprietários ribeirinhos fronteiros); por aluvião (os acréscimos formados, sucessiva e imperceptivelmente, por depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes); por avulsão (quando, por força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um prédio e se juntar a outro); por abandono de álveo (o álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários ribeirinhos das duas margens).
2.1.2. Imóveis por acessão física artificial
Bem imóvel por acessão física artificial é tudo quanto o homem incorpora permanentemente ao solo, como a semente lançada à terra, os edifícios e construções, de modo que não possa retirar sem destruição, modificação, fratura, ou dano. Forma de aquisição da propriedade imóvel, a acessão pode dar-se por plantações ou construções (art. 1.248, V, do Código Civil), de maneira que todo aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio adquire a propriedade da plantação ou da construção resultante (arts. 1.253 e 1.254 do Código Civil).
Dentre os bens imóveis adquiridos por acessão física artificial, os edifícios, urbanos ou rurais, edificados ou em construção, ocupam lugar de destaque, conforme podemos observar na acepção do § 1º do art. 1º da Lei 7.989/1989: “´[p]ara os efeitos desta Lei, considera-se bem imóvel o prédio urbano ou rural, edificado ou em construção, assim como o lote de terreno ou gleba, urbano ou rural”. Respeitados o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos, o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver (art. 1.299 do Código Civil).21
No âmbito das grandes metrópoles, a incorporação imobiliária ocupa lugar de destaque como instituto jurídico conducente à obtenção de imóveis por acessão física artificial e à instituição do condomínio edilício. O condomínio edilício, antes designado propriedade horizontal, resulta da combinação de propriedade comum e de propriedade exclusiva, formando um todo incindível: as unidades autônomas do edifício, de propriedade exclusiva, somente podem existir quando conjugadas às partes comuns a todos os condôminos e às frações ideais de terreno e vice-versa.
A unidade autônoma, concebida sob a forma de edifício ou casa – apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas (§ 1º do art. 1.331 do CC/2002), casas térreas ou assobradadas (art. 8º, “a”, da Lei 4.591/1964), ou casas situadas em áreas rurais (art. 68 da Lei 4.591/1964) –, constitui o bem sobre o qual o domínio é exercido em sua plenitude. Contudo, naquelas dependências, instalações ou construções necessárias à utilização econômica da unidade, tais como o solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais etc. (§ 2º do art. 1.331 do CC/2002), estabelece-se um estado de comunhão, do qual devem participar todos os proprietários singulares das unidades, fundindo-se, assim, o singular e o coletivo numa só situação jurídica.22
Além disso, a cada unidade imobiliária caberá, como parte inseparável, uma fração ideal no solo e nas outras partes comuns, que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio (§3º do art. 1.331 do CC/2002). Com a inclusão no Código Civil do condomínio em multipropriedade (Lei 13.777/18) e adotado esse regime jurídico no condomínio edilício em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas (art. 1.358-O do Código Civil), a estas corresponderão frações de tempo, sendo certo que as convenções dos condomínios edilícios poderão limitar ou impedir a instituição da multipropriedade nos respectivos imóveis, vedação que somente poderá ser alterada no mínimo pela maioria absoluta dos condôminos (art. 1.358-U do CC).
O condomínio edilício, espécie condominial, não decorre, portanto, de um fato jurídico natural, mas sua existência sempre depende da vontade específica de seus instituidores e do cumprimento de exigências legais. Interessado em instituir o condomínio edilício, pode o proprietário do solo construir um edifício, para fins residenciais ou comerciais, e, depois de encerrada a construção, colocar à venda as unidades autônomas, ocasião na qual estará se submetendo ao campo de incidência da legislação do condomínio em edifícios. No entanto, caso o proprietário resolva alienar as unidades antes ou durante a construção do edifício, deverá utilizar o sistema designado incorporação imobiliária, modo de instituição do condomínio edilício e de aquisição da propriedade das unidades autônomas por acessão artificial obrigando-se, o incorporador, a promover a construção e entregar os apartamentos, salas ou lojas.23
Nessa forma de instituição do condomínio edilício, é imprescindível para a configuração jurídica da incorporação imobiliária, que a unidade autônoma, ao ser comercializada, ainda esteja em construção ou apenas projetada, prevalecendo a noção de coisa futura, assim entendido aquele bem que não existe no momento da negociação. O Código Civil português assim dispõe a respeito: “art. 211 (coisas futuras). São coisas futuras as que não estão em poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da declaração negocial”.24
Na incorporação imobiliária, onde o negócio jurídico é realizado antes ou durante a construção das unidades condominiais, dizemos que o bem é futuro, ou seja, trata-se de uma realidade que não têm existência atual. Isto não obstante, a unidade condominial, mesmo antes de existir concretamente, é objeto de direito real, fugindo à noção tradicional, de acordo com a qual somente poderia ser considerada objeto de um direito real a coisa presente e com realidade atual.
Deveras, as coisas incorporáveis, ao tempo em que é firmado o contrato incorporativo, não existem, constituindo-se em imóveis por acessão física mediante incorporação ao solo dos edifícios e construções, por efeito de trabalho do homem. Assim, formam-se os prédios, imóveis por acessão física artificial, resultado da reunião de coisas simples que a ação do homem une, efetuando a sua fusão com outras, como o cimento empregado na construção de uma casa.
2.1.3. Imóveis por acessão intelectual
Consideramos imóveis por acessão intelectual tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento ou comodidade.25 Em assim sendo, a qualquer tempo, esses bens poderão ser mobilizados, dependendo, sempre, essa mobilização, da mudança de destinação na sua exploração.
São exemplos de móveis imobilizados intencionalmente no prédio pelo proprietário – bens imóveis por acessão intelectual - as máquinas, quando a exploração é industrial; o gado de uma fazenda, quando o proveito é pertinente ao agronegócio; o elevador, quando a intenção é expandir a comodidade; os quadros, as estátuas, quando sua utilização se destina ao aformoseamento.26
2.1.4. Imóveis “ope legis”
Imóveis “ope legis” são aqueles direitos, cuja natureza é imaterial, considerados imóveis por determinação legal, de maneira a garantir maior segurança e proteção às relações jurídicas contempladas pela norma. O art. 80 do Código Civil considera imóveis para os efeitos legais: os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram; o direito à sucessão aberta.27
2.1.4.1. Os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram
Deriva da determinação legal que não só os direitos reais sobre imóveis – a propriedade, a superfície, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, o direito do promitente comprador do imóvel, o penhor incidente sobre imóveis (o penhor rural),28 a hipoteca, a anticrese, a concessão de uso especial para fins de moradia, a concessão de direito real de uso, a laje (art. 1.225 do Código Civil), a alienação fiduciária sobre bens imóveis (Lei 9.514/1997)29 – mas também as ações que os asseguram, como, por exemplo, as reivindicatórias, as hipotecárias, as negatórias de servidão, as de nulidade, ou de rescisão de contratos translativos de propriedade, são bens imobiliários.30 Como exemplo dessa extensão de eficácia, podemos lembrar, por exemplo, a aceitação, pelo Oficial de Registro de Imóveis, do requerimento de registro das citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias, relativas a imóveis (art. 167, I, 21, da Lei 6.015/1973).
Cumpre lembrar que a observância dos princípios regentes dos direitos reais – princípios da taxatividade e da tipicidade – proporcionam, por um lado, com o numerus clausus, um ambiente de segurança jurídica e permite a organização da propriedade imobiliária, cujo situação pode ser verificada mediante análise dos elementos constantes no Oficial de Registro Imobiliário competente;31 por outro, com a tipicidade, o sistema jurídico brasileiro reconhece que o direito real depende dos elementos definitórios descritos nas normas cogentes, salvo naquelas hipóteses em que a própria lei permite a interferência da vontade para amoldar o interesse dos particulares às necessidades expressas nos negócios jurídicos entabulados (v.g., servidão, superfície, usufruto). De toda forma, não existe espaço para a vontade no que concerne à criação ou redefinição dos modelos de direitos reais.32
Na legislação alienígena, encontramos expressões dessa equiparação de direitos e ações a bens imóveis, como, por exemplo, o art. 526 do Código Civil francês (“São imóveis pelo objeto ao qual se aplicam: o usufruto das coisas móveis; as servidões ou serviços prediais; as ações que tendem a reivindicar um imóvel”); o art. 815 do Código Civil italiano (“Bens móveis inscritos em registros públicos - Os bens móveis registados em registos públicos estão sujeitos às disposições que lhes dizem respeito [Código Civil, arts. 507, 534, 609, 819, 1.156, 1.162, 2.683 e seguintes, 2.750, 2.779, 2.810, 2.914, 2.915; Código Nav. art. 245 e seguintes, 861 e seguintes] e, na sua falta, às disposições relativas aos bens móveis”).33
2.1.4.2. O direito à sucessão aberta
Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários (art. 1.784 do Código Civil).34 Logo, com o falecimento do autor da herança, os herdeiros recebem, por efeito direto da lei, as obrigações, a propriedade sobre bens móveis e imóveis e os créditos (droit de saisine – art. 724 do Código Civil francês: “Os herdeiros legítimos e os herdeiros naturais adquirem, de pleno direito, os bens direitos e ações do de cujus (...)”).35
A proteção resultante da aquisição, de pleno direito, dos bens, direitos e ações do de cujus, tem por finalidade preservar os bens deixados pelo falecido, que ficaram sem a guarda de seu titular. No entanto, a herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros, resultando da equiparação do direito à sucessão aberta a um bem imóvel que, até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, seja indivisível, regulando-se pelas normas relativas ao condomínio, somente podendo ser objeto de cessão por escritura pública, com autorização do cônjuge, o direito à sucessão aberta e o quinhão de que disponha o co-herdeiro (arts. 1.791 e 1.793 do Código Civil).
Além disso, consistindo a renúncia da herança a renúncia de imóvel, deve ser feita por escritura pública ou termo nos autos (art. 1.806 do Código Civil), mediante autorização do cônjuge, ficando os efeitos da perda da propriedade imóvel subordinados ao registro do ato renunciativo no Registro de Imóveis (art. 1.275, parágrafo único, do Código Civil).
Como leciona Arruda Alvim, é o evento morte que conduz à aquisição por sucessão universal, nos termos do art. 1.784 do Código Civil. Mas, em realidade, o que ocorre é que os herdeiros adquirem uma quota da herança, sem discriminação do que lhes cabe. É ao cabo do procedimento de inventário, judicial ou extrajudicial, com a partilha, que se lhes atribuirão, concreta e especificamente, a titularidade em relação a certos e determinados bens, formalmente reconhecida com o registro correspondente.36
2.2. A titulação da fração de tempo
A Lei 13.777, de 20 de dezembro de 2018, alterou o Código Civil e a Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei dos Registros Públicos), para dispor sobre o regime jurídico da multipropriedade e seu registro, consistente no “regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada” (destaque nosso - art. 1.358-C do Código Civil).
O imóvel, objeto da multipropriedade, poderá ser ou não uma unidade condominial autônoma. Para tanto, a multipropriedade deverá ser instituída “(...) por ato entre vivos ou testamento, registrado no competente cartório de registro de imóveis, devendo constar daquele ato a duração dos períodos correspondentes a cada fração de tempo” (art. 1.358-F do CC), servindo o instrumento de instituição para estabelecer o limite máximo de frações de tempo, no mesmo imóvel, que poderão ser tituladas pela mesma pessoa natural ou jurídica.
Caso o condomínio edilício adote o regime de multipropriedade, em parte ou na totalidade de suas unidades autônomas, disposições específicas deverão ser obedecidas, conforme previsto nos arts. 1.358-O a 1.358-U do Código Civil. Na hipótese de estar prevista no instrumento de instituição do condomínio, a iniciativa e a responsabilidade para a instituição do regime da multipropriedade serão atribuídas ao incorporador, observados os requisitos indicados nas alíneas “a”, “b” e “c” e no § 1º do art. 31 da Lei 4.591/1964. Destinando-se o imóvel à multipropriedade, além da sua matrícula, haverá uma matrícula para cada fração de tempo, na qual se registrarão e averbarão os atos referentes à respectiva fração de tempo (art. 167, § 10, Lei 6.015/1973).37
2.3. Bens que não perdem o caráter de imóveis
Não perdem o caráter de imóveis as edificações que, existindo viabilidade técnica adequada, são separadas do solo, conservam sua unidade e são removidas para outro lugar; o mesmo se dá com os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem (art. 81 do Código Civil).38
3. Dos bens móveis
Moreira Alves ensina que, no Direito Romano dos períodos pré-clássico (149 a 126 a.C.) e clássico (125 a.C. a 305 d.C.) não encontramos a distinção entre res mobiles e imobiles, a qual tem origem no período pós-clássico (306 a 565 d.C.). Dizem-se semoventes (que se move por si), a que alude uma constituição de Justiniano (C. 7,37,3, 1, “d”), do ano de 531 d. C., “as coisas móveis que se deslocam por força orgânica própria: os animais, e, em Roma, também os escravos”.39
3.1. Classificação
3.1.1. Móveis por natureza
São bens móveis por natureza aqueles suscetíveis de movimento próprio ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social (art. 82 do Código Civil).40
3.1.2. Móveis “ope legis”
Móveis “ope legis”, da mesma forma como se dá para os bens imóveis, são as energias, aqueles direitos e ações assim considerados por determinação legal, de maneira a garantir maior segurança e proteção às relações jurídicas integradas por esses objetos, de maneira que, se os direitos e as ações correspondentes incidirem sobre coisas móveis, devem ser considerados, como são, bens móveis. O art. 83 do Código Civil considera móveis para os efeitos legais: as energias que tenham valor econômico; os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes; os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.41
Portanto, no regime jurídico civil atual – até então, a equiparação, como bem móvel, das energias com valor econômico era encontrada no Direito Penal (art. 155, § 3º - “Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico”) - devem ser incluídas, como energias que assumem valor econômico e são equiparadas a bens móveis, o gás, a corrente elétrica, dentre outras.42
Avultam, como direitos pessoais considerados bens móveis, os direitos autorais, assim expressamente compreendidos no art. 3º da Lei 9.610/1998 (“Os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis”); os direitos de propriedade industrial, nos termos do art. 5º da Lei 9.279/1996 (“Consideram-se bens móveis, para os efeitos legais, os direitos de propriedade industrial”); as quotas de capital ou ações que possuem os empresários em uma sociedade, seja esta de que natureza for.43
3.2. Bens que não perdem o caráter de móveis
Os bens móveis e materiais destinados a alguma construção, enquanto não empregados, conservam essa qualidade, readquirindo essa condição quando provenientes da demolição de algum prédio (art. 84 do Código Civil).44
3.3. Semoventes – seres “sencientes”
O Código Civil de 2002, ao tratar dos bens móveis por natureza, inclui nessa categoria os bens suscetíveis de movimento próprio, o que permite considerar que os animais estão incluídos na tradicional concepção de semoventes, contida no art. 82 do Código Civil. Aliás, embora a Constituição Federal, em seu art. 225, § 1º, VII,45 ao tratar do meio ambiente, vede as práticas que submetam os animais à crueldade, as disposições do diploma civil impõem aos animais o regime jurídico dos bens móveis por natureza.
Assim, por exemplo, tratando-se de venda de animais, incidem as regras correspondentes aos vícios redibitórios (art. 445, § 2º, do Código Civil); é reconhecido o privilégio especial, do credor por animais, sobre os produtos do abate (art. 964, IX, do Código Civil); obriga o proprietário ou ocupante do imóvel a tolerar que o vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para apoderar-se de coisas suas, inclusive animais, que aí se encontrem casualmente (art. 1.313, II, do Código Civil); inclui, dentre os direitos do usufrutuário, as crias dos animais, deduzidas quantas bastem para inteirar as cabeças de gado existentes ao começar o usufruto (art. 1.397 do Código Civil).
Alterações na legislação europeia têm conduzido a uma distinção de tratamento dos animais como semoventes, negando-se a eles o status de meras coisas e reconhecendo sua condição de seres “sencientes”. Nesse sentido, o Código Civil Francês foi alterado em 2015 para fazer constar, expressamente, o reconhecimento de que os animais são seres vivos que possuem sensibilidade, conforme se verifica na redação do art. 515-14: “[o]s animais são seres vivos dotados de sensibilidade. Os animais estão submetidos ao regime de propriedade, com as ressalvas das leis que os protegem” (tradução nossa);46 o Código Civil alemão, por sua vez, reconhece que os animais não são coisas: “§ 90a – Animais. Animais não são coisas. Eles são protegidos por estatutos especiais. Regem-se pelas disposições que se aplicam às coisas, com as modificações necessárias, salvo disposição em contrário” (tradução nossa);47 ainda, estipula o Código Civil português: “Artigo 201-B - Os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua natureza. Art. 201-D - Na ausência de lei especial, são aplicáveis subsidiariamente aos animais as disposições relativas às coisas, desde que não sejam incompatíveis com a sua natureza” (Lei 8/2017).
4. Dos bens imóveis e móveis como produtos de consumo
O Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), ao fixar a noção de “produto”, o equiparou a qualquer bem, imóvel ou móvel, material ou imaterial: “[p]roduto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” (art. 3º, § 1º). A inclusão, pelo legislador, do bem imóvel como produto levou em considerando que a habitação é uma necessidade básica e um bem de difícil aquisição para o consumidor, a merecer um tratamento diferenciado do ordenamento jurídico.
No entanto, ao fazê-lo, não estabeleceu qualquer ressalva no que concerne às peculiaridades que cercam o bem imóvel, de maneira que, para uma adequada aplicação do Código de Defesa do Consumidor, faz-se necessária a observância de algumas peculiaridades que o distinguem, sobremaneira, dos demais bens ou produtos perecíveis e consumíveis: (a) a aquisição do bem imóvel é, em geral, mais ponderada e complexa do que a de outros bens; (b) a produção não é instantânea, demandando prazos longos; (c) o prazo de pagamento pressupõe um vínculo igualmente prolongado entre quem fornece e quem consome; (d) o processo produtivo artesanal é, em geral, a regra; (e) a vida útil variável do produto depende de uma manutenção e utilização adequadas; (f) o imóvel incorpora inúmeros componentes de outros fornecedores, assemelhando-se a uma linha de produção e gerando responsabilidades conjuntas.48
De fato, o processo produtivo é artesanal, dependendo a vida útil variável do produto de seu prazo de validade, bem como de uma manutenção e utilização adequadas. Em sendo aparentes os vícios (v.g., pintura, esquadrias de madeira, ferragens, gesso, revestimentos de pisos e paredes, vidros, forros de madeira, caixilhos etc.), o art. 26 do CDC dispõe que o direito de demandar decai em trinta dias para os bens não-duráveis e em noventa dias para os bens duráveis, dentre os quais se encontra o bem imóvel, iniciando-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.
No produto imobiliário incorporável, contudo, é usual que a verificação da existência de vícios aparentes ocorra não da entrega efetiva do produto (imissão na posse) ou do término da execução dos serviços (término da construção), mas da realização, com a presença do adquirente, de vistoria prévia à entrega efetiva da unidade condominial. Nessa ocasião, são identificados os vícios aparentes existentes, que deverão ser sanados pelo incorporador, com o posterior aceite da obra mediante a realização das retificações cabíveis; ou é declarada a ausência de vícios aparentes no imóvel, liberando-se o incorporador da responsabilidade decorrente da existência de tais vícios.
De toda forma, essas características peculiares fazem com que a aplicação da norma codificada deva ser feita com parcimônia, ajustando-se a generalidade e a abstração da regra jurídica à realidade da produção do produto imobiliário, aplicando-se, no que for cabível, as normas especiais e codificadas vigentes.
Notas
1ALVIM, Arruda Comentários ao Código Civil brasileiro: livro introdutório ao Direito das Coisas e o Direito Civil, pp. 38-42.
2Art. 1228, § 1º, do CC: “O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” (destaque nosso).
3Outro exemplo de patrimônio de afetação encontramos no “patrimônio segregado”, previsto no âmbito dos fundos de investimento (arts. 1.368-D e 1.368-E do CC). Realidade jurídica distinta é aquela presente na destinação de parte do patrimônio para a instituição do bem de família (arts. 1.711 e seguintes do Código Civil), correspondente à segregação de parte do patrimônio, que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo de instituição, isenta de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio.
4Na síntese de Clóvis Bevilaqua, a Parte Geral do direito civil destina-se à exposição dos princípios sobre o sujeito e o objeto do direito; da teoria dos fatos jurídicos, ou seja, os elementos propulsivos do direito; das matérias de aplicação a todas as categorias de relações jurídicas, como, v.g., a prescrição; e de tudo quanto não encontra espaço apropriado na parte especial (Teoria geral do direito civil, pp. 68-69).
5BEVILAQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, p. 269.
6Cf. trabalho de nossa lavra Comentários ao Código Civil brasileiro, p. 12.
7Cf. LOPES, Serpa. Curso de direito civil, p. 381.
8Código Civil Alemão, § 90, traduzido por Souza Diniz. Com base nesse dispositivo, J. W. Hedermann (Tratado de derecho civil: derechos reales, §§ 1º, II e 4º, II) afirma que não se dá a propriedade sobre valores econômicos não materializados, como, v.g., os créditos subsistentes de um negociante contra outro. Nesse caso, há um vínculo obrigacional, um crédito, e não um direito real.
9FREITAS, Teixeira de. Esboço do código civil, p. 115.
10GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil, p. 174. Podemos, ainda, na esfera da noção jurídica de bens, lembrar dos bens de ninguém (res nullius) e dos bens abandonados (res derelicta).
11ALVIM, Arruda. Lei de registros públicos comentada: Lei 6.015/1973, pp. 481-482.
12Cf. GATTI, Edmundo. Teoria geral de los derechos reales, p. 190. No Brasil, o direito autoral, atualmente, vem regulado pela Lei 9.610/1998, sendo considerado, para os efeitos legais, bem móvel (“Art. 3º Os direitos autorais reputam-se, para os efeitos legais, bens móveis”); de maneira semelhante, a energia elétrica (“Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: (...) § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico” – Código Penal).
13Das Institutas de Gaio: G. 2, 14.: “(...) Eodem numero sunt iura praediorum urbanorum et rusticorum. Praediorum urbanorum iura sunt veluti ius altius tollendi aedes suas et officiendi luminibus vicini aedium aut non extollendi, ne luminibus efficiatur; (...)”.
14Das Institutas de Gaio: G. 2, 14 a.: "Est etiam alia rerum divisio: nam aut mancipi sunt aut nec mancipi. Mancipi sunt veluti fundus in Italico solo, (...)”.
15Cf. trabalho de nossa lavra Incorporação imobiliária: ensaio de uma teoria geral, pp. 65-66.
16Na redação do art. 43, I, do Código Civil de 1916: “Art. 43. São bens imóveis: I. O solo com a sua superficie, os seus accessorios e adjacencias naturaes, comprehendendo as arvores, etc. e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo”. Tratando do Direito de Superfície, não da propriedade, no âmbito do Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001), veja-se o teor de seu art. 21, § 1º: “O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, atendida a legislação urbanística”.
17Na redação do art. 526 do Código Civil de 1916: “Art. 526. A propriedade do sólo abrange a do que lhe está superior e inferior em toda a altura e em toda a profundidade, uteis ao seu exercicio, não podendo, todavia, o proprietario oppor-se a trabalhos que sejam emprehendidos a uma altura ou profundidade taes, que não tenha elle interesse algum em impedi-los”.
18Dispõe o Código Civil: “Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.
Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação industrial, obedecido o disposto em lei especial”.
19Constituição Federal de 1988: “Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra”.
20Na redação do art. 43, II, do Código Civil de 1916: “Art. 43. São bens imóveis: (...) II. Tudo quanto o homem incorporar permanentemente ao solo, como a semente lançada à terra, os edifícios e construções, de modo que se não possa retirar sem destruição, modificação, fratura, ou dano”.
21Regra semelhante pode ser observada no art. 544 do Código Civil francês: “A propriedade é o direito de fazer e de dispor das coisas do modo mais absoluto, contanto que delas não se faça um uso proibido pelas leis ou pelos regulamentos”.
22Cf. trabalho de nossa lavra Responsabilidade civil na incorporação imobiliária, p. 38.
23Idem, pp. 73-74.
24No âmbito do Código Civil brasileiro, encontramos referências às coisas futuras na passagem legislativa que trata dos contratos aleatórios (arts. 458 a 461).
25Este o teor do art. 43, III, do Código Civil de 1916: “Art. 43. São bens imóveis: (...) III. Tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento, ou comodidade”.
26Tratando das pertenças (“Art. 93. São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro” – Código Civil), veja-se o verbete referente aos bens reciprocamente considerados.
27O artigo correspondente no Código Civil de 1916 é o seguinte: “Art. 44. Consideram-se imóveis para os efeitos legais: I. Os direitos reais sobre imóveis, inclusive o penhor agrícola, e as ações que os asseguram. II. As apólices da dívida pública oneradas com cláusula de inalienabilidade. III. O direito à sucessão aberta”.
28Dispõe o art. 1.438, caput, do Código Civil: “Constitui-se o penhor rural mediante instrumento público ou particular, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição em que estiverem situadas as coisas empenhadas”.
29Prevê o art. 22, caput, da Lei nº 9.514/1997: “A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel”.
30Cf. DINIZ, Maria Helena Código Civil anotado, p. 157.
31Em nosso sistema jurídico, a transferência entre vivos da propriedade somente se dá com o registro do título translativo no Registro de Imóveis, o que lhe confere caráter constitutivo (art. 1.245, caput, c/c art. 1.227 do Código Civil – “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código”); outrossim, o princípio da taxatividade vem expresso no art. 172 da Lei nº 6.015/1973 nos seguintes termos: “No Registro de Imóveis serão feitos, nos termos desta Lei, o registro e a averbação dos títulos ou atos constitutivos, declaratórios, translativos e extintos de direitos reais sobre imóveis reconhecidos em lei ‘inter vivos’ ou ‘mortis causa’ quer para sua constituição, transferência e extinção, quer para sua validade em relação a terceiros, quer para a sua disponibilidade” (destaque nosso).
32Cf. trabalho de nossa lavra Impossibilidade de registro da alienação fiduciária superveniente ou condicionada (2º grau), p. 111-116.
33Do Código Civil francês: “Article 526 Sont immeubles, par l'objet auquel ils s'appliquent: L'usufruit des choses immobilières; Les servitudes ou services fonciers; Les actions qui tendent à revendiquer un immeuble” (tradução: Souza Diniz); Do Código Civil italiano: “Art. 815 Beni mobili iscritti in pubblici registri - I beni mobili iscritti in pubblici registri sono soggetti alle disposizioni che li riguardano (Cod. Civ. 507, 534, 609, 819, 1156, 1162, 2683 e seguenti, 2750, 2779, 2810, 2914, 2915; Cod. Nav. 245 e seguenti, 861 e seguenti) e, in mancanza, alle disposizioni relative ai beni mobili” (tradução livre).
34Na redação do art. 1.572 do Código Civil de 1916: “Aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.
35Artigo 724 do Código Civil francês: “Les héritiers désignés par la loi sont saisis de plein droit des biens, droits et actions du défunt” (destaque nosso tradução: Souza Diniz).
36ALVIM, Arruda Comentários ao código civil brasileiro: livro introdutório ao direito das coisas e o direito civil, pp. 330-331.
37A propósito da multipropriedade, confira-se a já clássica obra de Gustavo Tepedino (Multipropriedade imobiliária), escrita na década de noventa do século XX. Na legislação portuguesa, encontramos o correspondente direito real de habitação periódica, voltado para unidades de alojamento integradas em empreendimentos turísticos, hoje regulado pelo Decreto-Lei 275/1993 (alterado pelos Decretos-leis 180/1999, 22/2002, 76-A/2006, 116/2008), que revogou o Decreto-Lei 130/1989 (antes, Decreto-lei 355/1981), que prevê, em seu art. 1º: “Sobre as unidades de alojamento integradas em empreendimentos turísticos qualificados como hotéis-apartamentos, aldeamentos turísticos, conjuntos turísticos e apartamentos turísticos podem constituir-se direitos reais de habitação limitados a um período certo de tempo de cada ano”.
38De modo semelhante, o teor do art. 46 do Código Civil de 1916: “[n]ão perdem o caráter de imóveis os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele mesmo se reempregarem”.
39ALVES, José Carlos Moreira. Direito romano, pp. 146-147.
40Na redação do Código Civil de 1916: “Art. 47. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia”.
41Na redação do Código Civil de 1916: “Art. 48. Consideram-se móveis para os efeitos legais: I. Os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes. II. Os direitos de obrigação e as ações respectivas. III. Os direitos de autor”.
42TERRA, Marcelo. Comentários ao Código Civil brasileiro, p. 619.
43PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: introdução ao direito civil. teoria geral de direito civil, p. 425.
44No mesmo sentido, o revogado art. 49 do Código Civil de 1916: “Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam a sua qualidade de móveis, Readquirem, em vem de readquirindo. essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio”.
45Dispõe o art. 225, § 1º, “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade” (destaque nosso).
46“Article 515-14 Les animaux sont des êtres vivants doués de sensibilité. Sous réserve des lois qui les protègent, les animaux sont soumis au régime des biens” (Código Civil francês).
47“§ 90a Tiere - Tiere sind keine Sachen. Sie werden durch besondere Gesetze geschützt. Auf sie sind die für Sachen geltenden Vorschriften entsprechend anzuwenden, soweit nicht etwas anderes bestimmt ist” (BGB).
48Cf. trabalho de nossa lavra A relação incorporativa de consumo, pp. 350-352.
Referências
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ALVIM, Arruda. Comentários ao Código Civil brasileiro: livro introdutório ao direito das coisas e o direito civil. Arruda Alvim, Thereza Alvim e Alexandre Laízo Clápis (coords). Rio de Janeiro, Forense, 2009.
__________________. Lei de registros públicos comentada: lei 6.015/1973. Arruda Alvim, Thereza Alvim, Alexandre Laízo Clápis e Everaldo Augusto Cambler (coords). 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.
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__________________. Comentários ao Código Civil brasileiro: introdução. ALVIM, Arruda; ALVIM, Thereza (coords). Rio de Janeiro: Forense, 2005.
__________________. A relação incorporativa de consumo. 25 anos do Código de Defesa do Consumidor: panorama atual e perspectivas futuras. Angélica Arruda Alvim, Eduardo Arruda Alvim e Marcelo Chiavassa de Mello Paula Lima (coords.). Rio de Janeiro: GZ Editora, 2017.
__________________. Impossibilidade de registro da alienação fiduciária superveniente ou condicionada (2º grau). Alienação fiduciária de bem imóvel: 20 anos da Lei nº 9.514/1997. Mauro Antônio Rocha e Marcus Vinicius Kikunaga (coords.). São Paulo: Lepanto, 2018.
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TEPEDINO, Gustavo. Multipropriedade imobiliária. São Paulo: Saraiva, 1993.
TERRA, Marcelo. Comentários ao Código Civil brasileiro: arts. 79 a 103. Arruda Alvim e Thereza Alvim (coords.). Rio de Janeiro: Forense, 2005.
Citação
CAMBLER, Everaldo Augusto. Bens móveis e imóveis. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Civil. Rogério Donnini, Adriano Ferriani e Erik Gramstrup (coord. de tomo). 3. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2024. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/477/edicao-3/bens-moveis-e-imoveis
Edições
Tomo Direito Civil, Edição 1,
Dezembro de 2021
Tomo Direito Civil, Edição 2,
Setembro de 2022
Última publicação, Tomo Direito Civil, Edição 3,
Julho de 2024
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