John Austin (1790-1859) foi um jurista inglês que buscou determinar o escopo da ciência do direito por meio da combinação do utilitarismo de Jeremy Bentham com os desenvolvimentos teóricos do pandectismo alemão no estudo do direito romano. Fundador da jurisprudência analítica anglo-saxã, é geralmente entendido como uma das principais figuras do positivismo jurídico do século XIX, especialmente nos países de língua inglesa.

1. Notas biográficas e influências1 


J. Austin nasceu em 1790 em uma família de classe média do condado de Suffolk, na Inglaterra.  Aos 16 anos de idade, alistou-se no exército, tendo servido em Malta e na Sicília.  Em 1812, aos 22 anos de idade, deixou a carreira miltar para estudar direito.

Aprovado no exame da ordem (Bar) em 1818, começou uma carreira sem sucesso como advogado em Londres.  Em 1819, casou-se com Sarah Taylor, que foi sua grande apoiadora e incentivadora ao longo dos anos.  Juntos tiveram, em 1821, uma única filha, Lucie Austin (posteriormente Lady Duff-Gordon).  

Logo após o casamento, mudaram-se para Queen Square, onde se tornaram vizinhos não só do grande filósofo utilitarista Jeremy Bentham, mas também de James Mill e seu filho então pré-adolescente, John Stuart Mill.  J. Austin e o jovem Mill começaram ali uma intensa amizade, tendo J. Austin sido encarregado por James Mill a iniciar seu filho no estudo do direito.  Segundo recordações do pupilo, estudavam juntos não só os comentários de Blackstone à common law inglesa, mas também direito romano, especialmente as Instituições de Justiniano.

À época, J. Austin já se declarava um discípulo do utilitarismo benthamista, bem como um admirador da economia política de David Ricardo, a qual tomava como modelo para a ciência do direito.  Seu campo de estudos incluía ainda não só a filosofia política de T. Hobbes, mas também as teorias populacionais malthusianas, que entendia serem importante complemento ao entendimento do funcionamento do mercado de trabalho e das condições necessárias para o aprimoramento da condição de vida da classe trabalhadora inglesa.

Nesse período, J. Austin publicou dois artigos de cunho jurídico.  No primeiro, criticava as regras relativas à primogenitura no direito de sucessão.2  No segundo, tratava de aspectos do direito societário.3 

Em 1826, com a criação da University of London (atualmente University College London) por um grupo de reformistas ingleses com inspirações utilistaristas, J. Austin foi convidado a assumir o cargo de professor (chair) de teoria do direito (jurisprudence).  Dedicou, então, os dois anos que se seguiram a preparar seu curso, estudando em Bonn, Alemanha, onde teve oportunidade não só de aprofundar seu conhecimento de direito romano, mas também de entrar em contato direto com os trabalhos recentes da Escola Histórica alemã, representada por Hugo, Thibaut e Savigny.

Retornando a Londres, em 1828, concluiu a preparação de suas aulas, que se iniciaram em novembro de 1829.  Em sua primeira apresentação, o curso de J. Austin foi frequentado por parte da elite política e intelectual londrina (inclusive por seu amigo e pupilo J.S. Mill), mas não tiveram sucesso em atrair novos alunos, de modo que foram descontinuadas entre 1832 e 1833, resultando em sua renúncia do cargo de professor.  Nesse ano, J. Austin publicou uma versão expandida da primeira parte de seu curso, com o título de The Province of Jurisprudence Determined, seu único livro publicado em vida.

Sendo um grande apoiador da reforma do direito inglês, em 1833, foi indicado, graças à influência de amigos do círculo utilistarista, como membro da Comissão de Direito Penal, de que logo renunciou, frustrado pela baixa repercussão de seus dois primeiros relatórios.

Em 1834, voltou a dar aulas, dessa vez no Inner Temple, uma das tradicionais associações inglesas de formação de advogados.  Nessa segunda tentativa, não obteve melhor sucesso que na primeira, acabando por abandonar em definitivo suas pretensões didáticas.

Em 1836, foi indicado para compor a comissão que trabalhou na elaboração da reforma legal e constitucional de Malta.  O trabalho final da comissão foi adotado pelo autoridades coloniais e, embora seu contrato tenha sido abruptamente terminado de forma antecipada, J. Austin foi pago a quantia de três mil libras esterlinas, no que parece ter sido o maior pagamento por ele recebido em contrapartida por seu trabalho.

De 1840 a 1844, os Austin voltaram a morar na Alemanha, indo depois para Paris, onde permaneceram até a Revolução de 1848.  Tendo J. Austin limitado sua produção acadêmica à publicação de artigos menores,4 o sustento material e as amizades da família nesse período foram em grande parte decorrentes da atuação incansável de sua esposa, que não só trabalhava como tradutora do alemão para inglês, mas ainda mantinha contatos e amizades com a pessoas influentes no meio cultural e político continental.

A reação de J. Austin contrária à Revolução de 1848 na França marcou de forma intensa seu afastamento em relação aos progressistas utilitaristas.  J. Austin não apenas retornou à Inglaterra, passando a viver em Weybridge, cidade a cerca de 25 km de Londres, mas também condenou publicamente os desenvolvimentos políticos na França.  Essa condenação foi especialmente frustrante para J.S. Mill, e é apontada como uma das causas do afastamento entre os dois no final da vida de J. Austin.5 

De seu retorno à Inglaterra em 1848 até sua morte em 1859, J. Austin viveu recluso em Weybridge.  Negou-se peremptoriamente a aceitar as diversas ofertas de publicação de novas edições de seu The Province of Jurisprudence Determined sob a alegação de que a obra carecia de uma profunda revisão.  Nesse período publicou um panfleto político, A Plea for the Constitution (1859), em que deixou clara sua posição contrária à continuidade das reformas constitucionais na Inglaterra — novamente, em contradição com a posição dos utilitaristas.  Pretendia, então, trabalhar em um novo projeto, que buscaria explicar as relações entre o direito e à moral, mas jamais chegou a desenvolvê-lo de fato.6  

Após sua morte, sua mulher dedicou-se a compilar seus trabalhos.  Em 1861, publicou uma segunda edição de The Province of Jurisprudence Determined, enquanto trabalhava na compilação das notas de J. Austin e das anotações de seus alunos quanto às aulas de seu curso na University of London, finalmente publicadas em 1863, sob o título Lectures on Jurisprudence or the Philosophy of Positive Law, posteriormente revista e completada por Robert Campbell, discípulo do autor.  Publicou ainda, também em 1863, o preâmbulo a suas aulas na University of London, sob o título de The Uses of the Study of Jurisprudence.

De modo geral, a vida J. Austin foi marcada por poucos sucessos, em grande parte devido ao perfeccionismo do autor, que o sobrecarregava mentalmente e acabava por reduzir sua capacidade de trabalho.  Tampouco lhe foram leves as restrições de ordem financeira, decorrentes do fluxo inconstante e instável de trabalho remunerado.

Em que pese suas frustrações em vida, seu trabalho foi largamente aceito nos meios jurídico-acadêmicos anglo-saxões.  Até meados do século XX, a teoria austiniana consistiu na visão padrão da teoria do direito inglesa, seja em sua metodologia analítica, seja em seu modelo do direito como comando (H.L.A. Hart 1998, p. ix-xv; N. Duxbury 2005, W.E. Rumble 2005).  Teve ainda influência sobre o realismo jurídico norte-americano (W.E. Rumble 1981; W.L. Morison 1982, p. 163-70) por meio de O.W. Holmes, um dos principais precursores e influenciadores do movimento, assim como pela inspiração à obra de W.N. Hohfeld sobre as relações jurídicas.

Essa posição de destaque foi superada apenas na segunda metade do século XX, em razão da intensa crítica de H.L.A. Hart a J. Austin nos três capítulos iniciais de seu The Concept of Law (1961).  Desde então, a teoria austiniana passou a ser estudada principalmente como uma forma mais primitiva e incorreta do positivismo analítico, em uma espécie de contraponto à teoria hartiana, ainda que críticas a esse desenvolvimento tenham também alcançado alguma voz (V. R. Moles 1985; S. Fish 1989; F. Schauer 2001; F. Schauer 2015).


2. A teoria do Direito de J. Austin


A fim de compreender a teoria austiniana do direito, pretendo analisá-la em quatro partes.  Na primeira, abordo o escopo da teoria e a determinação do direito positivo como campo da teoria geral do direito (general jurisprudence).  Estes temas são abordados principalmente nas lições que compõem The Province of Jurisprudence Detemined, bem como no artigo The Uses of the Study of Jurisprudence, incluído nas Lectures on Jurisprudence como a lição XI.

Já na segunda parte, explico o conceito de comando e seus correlatos dever e sanção, a partir dos quais J. Austin, ponto de partida da teoria.  Na terceira parte, apresento um resumo da classificação dos comandos proposta pelo autor para isolar o direito positivo dentre outras formas de comando. Estes assuntos formam o núcleo das lições que compõem The Province of Jurisprudence Detemined

Por fim, na quarta parte, descrevo em linhas gerais as complementações a essa concepção do direito positivo, por meio das quais o autor pretendia mostrar a aplicação de seu esquema conceitual a ordens jurídicas concretas, especialmente a common law inglesa e ao direito romano.  Essas noções são desenvolvidas nas lições remanescentes das Lectures on Jurisprudence (Lições XII a LVII), recompostas com base nas anotações de aula de J. Austin e seus alunos e publicadas após sua morte.

Nessas quatro partes, pretendo ressaltar o que me parecem ser as principais características do modelo austiniano do direito. Uma dessas características é o caráter abstrato conferido à teoria do direito, entendida não apenas como descrição do conteúdo das ordens jurídicas nacionais (particular jurisprudence, ou, em termos atuais, como dogmática jurídica), mas como descrição dos conceitos formais pelos quais se descreve o funcionamento de qualquer ordem jurídica positiva (general jurisprudence, ou em termos  atuais, teoria geral do direito). Esse caráter conceitual leva a uma segunda característica relevante, que é sua natureza analítica, com foco no esclarecimento dos conceitos principais do direito.  Ainda um terceiro ponto relevante é a vinculação do direito à decisão política, fornecendo uma explicação da forma pela qual o conteúdo do direito é alterado. Trata-se, enfim, de um modelo extremamente simplificado, que, se, por um lado, indica com clareza alguns aspectos importantes do direito positivo (como seu formalismo, variabilidade e imposição forçada), por outro lado, não consegue dar a devida ênfase a outros aspectos relevantes (como a estruturação interna das normas jurídicas e as dificuldades de interpretação e aplicação do direito na sociedade complexa).



2.1. O escopo da teoria: a delimitação do direito positivo pela general jurisprudence


A teoria austiniana do direito pode ser vista como um esforço conceitual7  de esclarecimento terminológico a respeito da matéria jurídica.  Seu objetivo é identificar as características específicas do direito positivo, de forma que possa ser corretamente entendido.  Para esse fim, J. Austin adota o método da análise lógica (Moles 1985, p. 9-34), pelo qual decompõe seu objeto de estudo em vários aspectos, distinguindo aqueles necessários daqueles acidentais, e, dentre os necessários, os que são característicos do direito daqueles que são comuns a outros campos.

A escolha desse objetivo e método não deve ser confundida com menosprezo por assuntos não jurídicos, nem com a tese de que o direito existiria isolado de outras atividades sociais.  Isso é claro seja no comprovado interesse do autor por questões de economia, política e ética, seja em sua intenção, ao final da vida, de dedicar-se a nova obra voltada a esclarecer a relação entre a moral e o direito.  A posição de J. Austin é de que a identificação das especificidades do direito positivo seria um requisito de esclarecimento conceitual, a fim de que se pudesse compreender sua relação com as áreas afins.  Em resumo, seria preciso separar conceitualmente o direito da moral para poder entender como, de fato, esses campos estão interligados. 

Nesse intuito, J. Austin parte de uma distinção inicial, de inspiração benthamiana, entre a descrição do direito como é e a descrição do direito como deve ser.  Esta última corresponde ao campo da ciência da legislação, que visa a aprimorar o conteúdo do direito.  Já a primeira, a descrição do direito como é, teria caráter expositivo e visaria a explicar o funcionamento do direito vigente.  Esse seria o campo próprio da ciência do direito (science of jurisprudence), a cujos contornos o autor dedica seu único livro publicado em vida.

No campo ciência do direito (jurisprudence), J. Austin distingue ainda a análise geral da análise particular (J. Austin 1998b; D. López Medina 2004, p. 91-6).  Enquanto esta se volta para a descrição do funcionamento de ordens jurídicas concretas existentes, como o direito inglês ou o direito francês, aquela visa a identificar aspectos do funcionamento do direito compartilhados por todas as ordens jurídicas existentes — ou, ao menos, aquelas mais desenvolvidas, dentre as quais o autor inclui, especialmente, o direito inglês e o direito romano.  Assim, sob a perspectiva austiniana, cabe à teoria geral do direito (general jurisprudence) a descrição da forma como as ordens jurídicas desenvolvidas operam, sem ater-se às características pontuais do funcionamento dos direitos nacionais.

Em linha com seu objetivo e método, J. Austin buscou delimitar o escopo de sua análise de forma a buscar um entendimento mais completo do direito positivo, que lhe fornecesse um ponto de partida para esclarecer seu modo de funcionamento, e para, em etapa subsequente (por infortúnio, nunca desenvolvida), expor as relações entre o direito positivo e outros campos sociais.


2.2. Os conceitos-chave da teoria: comando e seus correlatos, dever e sanção


A fim de especificar o conceito de direito positivo, objeto da teoria geral do direito (general jurisprudence), J. Austin adota a noção de comando como conceito-chave.  Em sua conhecida expressão, o comando é a chave para a ciência do direito (The key to the science of jurisprudence) (J. Austin 1998, p. 13).  Para ele, é a partir dessa noção que se pode entender corretamente o direito.

J. Austin define comando como a expressão de um desejo de que alguém faça ou não faça algo, acompanhado de um mal a ser imposto pelo emissor ao destinatário se descumprido esse desejo (J.Austin 1998, p. 13-8).  A característica específica que diferencia o comando dos outros tipos de desejos é capacidade de o emissor punir o destinatário em caso de violação da ordem expressa. Assim, a definição austiniana de comando implica as noções de dever e sanção.  

Dever, para o autor, é a conduta do destinatário desejada pelo emissor do comando.  Esse conceito exprime a mesma ideia que aquela de comando, mas de outra forma.  Enquanto o comando expressa o fenômeno na perspectiva do emissor, o dever expressa-o na perspectiva do destinatário, que se sujeita ao comando.  Assim, comando e dever implicam-se mutuamente: só existirá um se houver também o outro.

Essencial à noção de comando é estar acompanhado de sanção.  A sanção é entendida como um mal8 imponível ao destinatário do comando em caso de descumprimento do desejo a ele imposto.  Note-se que, para o autor, não é preciso que a sanção seja, de fato, imposta para que se caracterize o comando.  A simples possibilidade de imposição, por mais remota que seja, seria suficiente para caracterizar o comando (J. Austin 1998, p. 16).  Nesse sentido, J. Austin pode ser visto como um expoente não só do imperativismo (a definição da norma jurídica como comando), pelo qual é principalmente conhecido, mas também do coercitivismo (a definição do direito a partir da sanção). 

J. Austin adota, assim, a ideia de um desejo expresso por um emissor poderoso a destinatários sujeitos a punição como o conceito central a partir do qual se deve promover a classificação conceitual que permite localizar o direito dentre as diversas formas de regulação da conduta humana. É nesse sentido que o autor designa a noção de comando como a chave para a ciência da jurisprudência.


2.3. O objeto da teoria: direito positivo e figuras assemelhadas


A partir da noção central de comando, J. Austin desenvolve sua teoria do direito positivo com base em três sucessivas classificações conceituais de ordem lógica.  A primeira delas refere-se ao conteúdo do comando e distingue comandos gerais de comandos particulares.  Já a segunda classificação aponta para o emissor do comando a fim de separar comandos com emissores de comandos sem emissores.  Por fim, a terceira distinção classifica os comandos com emissores de acordo com a natureza do emissor, dividindo os comandos entre aqueles emitidos por deus, pelo soberano e por homens não soberanos.9  É com esses três movimentos lógicos, acompanhados de alguns refinamentos, correções e esclarecimentos adicionais, que o autor pretende especificar o direito positivo.  Vejamos então cada um deles.

A primeira classificação austiniana distingue comandos gerais de comandos particulares.  Nessa distinção, comandos gerais aplicam-se a uma uma classe de atos e pessoas.  Já comandos particulares aplicam-se a indivíduos, grupos ou ações específicos.  O autor classifica os comandos gerais como leis, mas não reconhece comandos particulares  como tal.  Com isso, parece indicar a necessidade de algum grau de estabilidade temporal para a caracterização das leis.  Nesse esquema, essa permanência mínima decorre da generalidade do comando.  Ainda assim, o autor admite que comandos particulares fazem parte do direito, se bem que não atinjam o mesmo grau de relevância que os comandos gerais.  As decisões judiciais são bons exemplos de comando particulares no âmbito jurídico. 

A segunda classificação proposta por J. Austin ocorre no campo dos comandos gerais.  O autor distingue, então, comandos com emissor de comandos sem emissor (ou, ao menos, sem emissor definido).  Comandos com emissor são leis em sentido próprio.  Comandos sem emissor são leis em sentido impróprio, porque não é possível determinar de quem é o desejo expresso no comando, nem quem será o responsável por aplicar a punição em caso de seu descumprimento.  Cada um dos lados dessa distinção apresenta subdivisões relevantes.

De um lado, comandos sem emissor são subdivididos em comandos em sentido metáfórico (sem emissor algum) e comandos por analogia próxima (sem emissor específico ou com emissor difuso). Na primeira classe encontram-se as leis da natureza (no sentido de ordem física), enquanto na segunda encontram-se os costumes e regras sociais.  Os comandos por analogia próxima formam parte da moralidade positiva, em conjunto com uma subespécie dos comandos em sentido próprio.

De outro lado, dentre as leis em sentido próprio, devem-se distinguir três categorias.  A primeira consiste naquelas cujo emissor é deus.  A segunda compõe-se daquelas cujo emissor é o soberano.  Finalmente, a terceiro comporta as leis em sentido próprio cujo emissor são autoridades humanas não soberanas.  As primeiras formam as leis de deus ou direito divino, enquanto as últimas compõem, junto com os comandos por analogia próxima, a moralidade positiva.  Já as leis do soberanos consistem no direito positivo, objeto próprio da teoria geral do direito (general jurisprudence).

As leis de deus definem o certo e o errado para os homens.  No pensamento austiniano, elas exercem o papel de moralidade crítica, servindo como critério para definição não do que o direito é, mas daquilo que o direito deve ser.  Nesse sentido, J. Austin afirma que as leis de deus são a designação correta para o direito natural, termo por ele rejeitado como causa de excessivas confusões terminológicas.

As leis de deus dividem-se em leis reveladas e leis tácitas.  As primeiras são a vontade divina comunicada expressamente aos homens e correspondem, para o autor, às Sagradas Escrituras.  Já as leis tácitas consistem nas noções de certo e errado a serem descobertas pelos homens.  Neste tópico, J. Austin distingue três métodos para determinação das leis divinas tácitas: o método do senso moral, o método da utilidade e o método misto.  

O método do senso moral pressupõe a existência de um instinto moral inato nos homens, determinado pela vontade de deus.  J. Austin rejeita esse método, com a alegação de que não se conseguiu encontrar comprovação empírica da existência de tal instinto.  Pelo mesmo motivo, o autor rejeita as teorias mistas, que combinam, em variados graus, o senso moral com o método da utilidade. 

O método da utilidade corresponde ao princípio da maximização da utilidade geral preconizado por J. Bentham.  Segundo J. Austin, esse é o método mais adequado para a compreensão das leis divinas não-reveladas, uma vez que se sujeita ao esforço racional do homem.  É, portanto, por meio do princípio da utilidade, ponderado pelas eventuais correções e complementações provenientes das leis divinas reveladas, que se estabelece a ciência da legislação, ou seja, a definição de como o direito positivo deveria ser.

No outro extremo das leis em sentido próprio encontram-se os comandos emitidos por autoridades humanas não soberanas.  Dentre essas, podem ser citadas as ordens dos pais aos filhos, dos patrões aos empregados, dos líderes da comunidade ao seus seguidores.  Elas se caracterizam por não contarem com a mesma possibilidade de imposição forçada que os comandos do soberano — salvo, é claro, na medida em que autorizadas e adotadas pelo soberano.

Finalmente, os comandos emitidos pelo soberano compõem a característica específica do direito positivo.  O direito positivo, portanto, é marcado por comandos gerais emitidos pelo soberano para seus súditos em uma sociedade política independente.  Para compreender o conceito austiniano de direito positivo, é preciso, pois, avançar na definição de soberania.

Para formular seu conceito de soberania, J. Austin inspira-se na filosofia política hobbesiana.  Assim como T. Hobbes, o autor entende a soberania como absoluta, sem limites internos ou externos.  Na visão austiniana, porém, a soberania não decorre de contrato algum, mas se revela como simples questão de fato.

Nesses termos, sua definição de soberania possui dois elementos: de um lado, o hábito de obediência da generalidade dos súditos; de outro lado, a ausência de hábito de obediência do soberano para qualquer outra pessoa.  O conjunto do soberano e seus súditos forma a sociedade política independente, que é independente por não se subordinar a qualquer pessoa externa e é política por se estruturar de forma hierárquica na divisão entre o soberano superior e súditos inferiores.

No pensamento austiniano, a noção de soberania assenta-se, como já mencionado, em uma questão de fato: o hábito de obediência por parte dos súditos e a falta desse hábito por parte do soberano.  Essa noção político-sociológica da soberania foi, como se verá, um dos principais aspectos criticados pelos principais positivistas do século XX.  Do ponto de vista do autor, contudo, o recurso ao hábito de obediência permite marcar os limites da especulação teórica jurídica, deixando de fora do direito a discussão a respeito das causas da obediência ou da legitimidade do pleito do soberano pela obediência dos cidadãos.

É interessante notar que, apesar de sua teoria parecer, à primeira vista, desenhada para abrigar um monarca absoluto de  corte hobbesiano, J. Austin frequentemente refere-se ao soberano não apenas como um indivíduo, mas como um grupo de indivíduos.  Exemplos disso são suas referências ao período republicano da Roma Antiga (em que o soberano, na sua visão, era o Populus Romanus, composto pela plebe e pelo Senado), assim como aos Estados Unidos da América (cujo soberano seria o conjunto dos eleitores das assembleias dos estados que compõem a federação) e, principalmente, à Inglaterra.  Nesta última, segundo o autor, a soberania seria compartilhada entre o rei, a Câmara dos  Lordes (House of Lords) e os eleitores da Câmara dos Comuns (House of Commons).  Esse compartilhamento, no entanto, traz uma série de dificuldades no que tange às regras jurídicas sobre o exercício conjunto da soberania, as quais não são discutidas por J. Austin com profundidade suficiente para esclarecer sua posição sobre o assunto, muito menos para lidar com a complexidade alcançada nas democracias liberais contemporâneas (P. Eleftheriadis 2013).

O autor enfrenta, porém, uma objeção relevante a sua noção de direito como comando do soberano.  Na prática do direito, encontram-se com frequência leis e outros atos normativos que não são aprovados diretamente pelo soberano.  É o caso de regulamentos definidos por autoridades subordinadas e — especialmente nos países da common law — de regras definidas por precedentes judiciais (judicial law, conforme a designação de J. Austin, que busca distanciar-se do termo depreciativo usado por J. Bentham, judge-made law).  O autor procura reconduzir tais normas a seu conceito de soberania por meio da tese da admissão tácita.  Essa tese sustenta que as normas expedidas por autoridades públicas não soberanas seriam tacitamente aprovadas pelo soberano, já que esse poderia tê-las revogado, mas optou por não o fazer.  Desse modo, também seriam normas do soberano, uma vez que aprovadas por sua inação.

Uma última decorrência a mencionar da concepção austiniana de soberania consiste na exclusão do direito constitucional e do direito internacional do âmbito estrito do direito positivo (para o direito constitucional, v. J. Austin 1998, p. 257-64; já para o direito internacional, v. J. Austin 1998, p. 200-1).  Com efeito, uma vez que o direito positivo seja entendido como ordem outorgada por alguém que não está subordinado a mais ninguém (o soberano), então o direito internacional, na condição de conjunto de regras de coordenação entre soberanos não pode ser considerado direito positivo, visto que não é ordenado por um superior político a seus inferiores.  Tampouco pode o direito constitucional ser visto como direito positivo, já que uma ordem do soberano para si mesmo a respeito da divisão de seu poder não seria vinculante, pois comandante e comandado seriam a mesma pessoa (o soberano).  J. Austin não nega que essas duas áreas da regulação de condutas humanas sejam importantes na sociedade moderna.  Nega apenas que elas sejam parte do direito positivo, cuja característica distintiva é a imposição forçada por parte do superior político.  Nesse sentido, o direito internacional e o direito constitucional são relegados à moralidade positiva, sendo vinculantes do ponto de vista moral, mas não do ponto de vista jurídico.

Ainda que pretenda valer-se dos comandos emitidos pelo soberano para demarcar a característica específica do direito positivo, o autor não deixa de reconhecer que o direito também se compõem de regras que não são comandos.  Nessa linha, para além do direito judicial e dos comandos dos subordinados (reconduzidos ao conceito central por meio da teoria da admissão tácita, acima comentada), J. Austin cita as leis declaratórias e revogatórias como exemplo de partes do direito positivo que não seriam comandos (J.Austin 1998, p. 183).  Essas leis, contudo, teriam caráter residual e de menor importância, não comprometendo, em sua visão, a correção do modelo proposto.

As classificações dos comandos por J. Austin formam, assim, um conjunto logicamente organizado que estabelece um campo bem delimitado para o direito positivo e, consequentemente, para a teoria geral do direito.  Para melhor visualização dessas classificações, verifique-se o quadro sinóptico que acompanha o texto como Anexo.10

Com base nessa combinação de distinções, J. Austin consegue formular um esquema conceitual de caráter lógico relativamente simples para localizar o objeto principal de sua ocupação teórica: o direito positivo, entendido como o conjunto dos comandos emitidos pelo soberano para seus súditos em uma sociedade política independente. 


2.4. O desenvolvimento (incompleto) da teoria: noções jurídicas fundamentais e a classificação do direito


Uma vez esclarecido o campo da ciência do direito nas aulas iniciais de seu curso, reelaboradas nos seis capítulos de The Province of Jurisprudence Determined, e esclarecida a distinção entre teoria geral do direito (general jurisprudence) e dogmática jurídica (particular jurisprudence) na aula introdutória, resumida no artigo The Uses of the Study of Jurisprudence, o curso de J. Austin prosseguiu com outras 46 aulas, de um total de 120 aulas originalmente planejadas.11  

Essas aulas dividiram-se em (i) uma análise de conceitos jurídicos fundamentais, que completaram a primeira parte do curso, voltada para o estudo das definições da ciência do direito, (ii) a análise das fontes do direito, compondo a segunda parte do curso, em que se discutiu especialmente o direito judicial, e (iii) a análise dos fins e temas do direito, em que J. Austin propõe sua classificação geral do direito, na terceira e última parte do curso.  O texto dessas aulas, que chegou até nós na forma das Lectures on Jurisprudence, não foi resultado exclusivo do trabalho do autor, mas produto do esforço de Sarah Austin e, posteriormente, Robert Campbell, que reuniram o material de preparação de aula de J. Austin e as anotações dos alunos do curso, dentre os quais J.S. Mill.

Nessas aulas subsequentes, é notável a maior influência dos autores romanos e do pandectismo alemão (A. Lewis 2013; M. Lobban, 2013), nem sempre bem harmonizados com a abordagem utilitarista adotada em The Province of Jurisprudence Determined.

Nas duas subseções que seguem, pretendo expor as noções jurídicas fundamentais que complementam a Parte I do curso e a classificação geral do direito proposta por J. Austin.  A análise das fontes do direito será postergada para seção 4, em que considero as ideias do autor a respeito do problema da aplicação e interpretação do direito.


2.4.1. Noções jurídicas fundamentais


Nas 15 aulas que compõem a seção III da Parte I do curso, J. Austin dedica-se a explicar determinadas noções, princípios e distinções que entende serem necessárias a qualquer sistema jurídico refinado, assim entendidos, principalmente, o direito romano e o direito inglês, assim como os direitos alemão e francês.  Nesse propósito, o autor elabora uma espécie de gramática conceitual do direito, de forma semelhante àquela posteriormente realizada por H. Kelsen na estática jurídica de sua Teoria Pura do Direito (H. Kelsen 1998, p. 121-213).

Interessante notar a ambiguidade da referência austiniana a "noções necessárias" do direito.  Se, de um lado, essa necessidade for entendida como necessidade lógica, então J. Austin poderia ser lido como uma espécie de jusnaturalista conceitual, uma vez que sua teoria implicaria a existência de noções jurídicas inalteráveis, não contingentes — ainda que apenas do ponto de vista formal.  De outro lado, uma leitura mais caridosa pode interpretar essa necessidade em sentido fraco, entendendo-se que essas noções são tão úteis para o funcionamento da ordem jurídica, que acabam por ser, em sua maioria, adotadas pela maioria dos sistemas jurídicos desenvolvidos.  Corrobora essa segunda versão a afirmação do autor de que tais noções estão geralmente, ainda que nem sempre, presentes nos direitos dos países mais avançados.

É possível dividir as noções analisadas por J. Austin em dois grandes grupos.  No primeiro, enquadram-se as noções relacionadas ao conceito de dever.  Nesse grupo compreende-se, principalmente, a noção de direito (subjetivo).  Já no outro grupo estão as noções relacionadas à sanção e à violação do dever.  Aqui se discutem as ideias de intenção, negligência, ilícito (injury ou wrong), culpa e imputabilidade.  Dever e sanção, não é demais frisar, são correlatos do conceito de comando, que se implicam mutuamente.  Assim, pode-se vincular a análise conceitual em exposição a sua exposição anterior sobre o campo da ciência do direito.

J. Austin inicia sua estática jurídica com uma discussão do conceito de direito subjetivo (right).  Direito, nesse sentido, é sempre um correlato de dever (duty).  No entanto, nem todo dever é correlato a um direito.  O autor distingue, nesse passo, os deveres em relativos e absolutos.  Enquanto os deveres relativos dirigem-se a alguma pessoa determinada, os deveres absolutos não se sujeitam a essa dependência.  Os direitos (subjetivos) são, portanto, correlatos de uma espécie de deveres — os deveres relativos, em oposição aos direitos absolutos, que não são correlatos a direitos (subjetivos).

Dentro do conjunto dos direitos, o autor introduz uma nova distinção relevante.  É a distinção entre jus in rem e jus in personam, proveniente do direito romano.  J. Austin logo esclarece que a terminologia adotada pelos romanos é enganosa, uma vez que tais classificações não se referem ao objeto do direito, isto é, a um direito sobre coisas ou sobre pessoas.  Jus in rem, na interpretação do autor, é direito que vale contra todas as pessoas, de forma indeterminada (against the world at large).  Já jus in personam, por oposição, é direito que vale apenas contra pessoas específicas.  Nesse sentido, podem ser encontrados direitos in rem sobre pessoas (e.g., o direito do pai de retomar seu filho de quem o detenha injustamente).

Tendo distinguido as duas espécies de direito (subjetivo), J. Austin anota que os direitos in personam podem ser tanto negativos, quanto positivos, isto é, podem tanto exigir uma abstenção (forbearance), quanto uma ação (act).  O direitos in rem, por outro lado, somente admitiriam a forma negativa (abstenção), visto que seria impraticável, segundo o autor, exigir ações de um conjunto indeterminado de pessoas.

Nesse quadro teórico, portanto, direito (subjetivo) é definido como a capacidade de exigir de alguém (determinado ou indeterminado) o cumprimento de um dever (de ação ou de abstenção).

No outro grupo de noções analisadas por J. Austin, estão os conceitos relacionados às sanções e ao descumprimento do dever.  Nesse campo, o autor interpõe, como esclarecimento preliminar, uma breve exposição de conceitos da filosofia da mente, com o fim de distinguir as noções de vontade (restrita aos movimentos do próprio corpo do agente) e intenção (que abarca as consequências de um determinado ato, abstenção ou omissão), bem como de esclarecer o conceito de negligência e suas modalidades, conforme a lei inglesa da época.  

Em seguida, anota que a sanção é necessariamente uma ação que importa um mal imposto àquele que descumpriu um dever, distinguindo a ação em que a sanção consiste (a qual é devida em razão do descumprimento) do mal que dela decorre (o qual é apenas presumido em vista da natureza da ação imposta ao infrator).  Nesse sentido, a imposição de um mal ao infrator é restrita à ação prevista no comando do soberano, ainda que o infrator não a perceba como prejudicial.

J. Austin prossegue indicando que o ilícito (injury ou wrong) corresponde apenas à violação de um dever, e implica culpa e imputação da sanção ao infrator.  Esses três conceitos (ilícito, culpa e imputação) são, a seu ver, correlatos e se implicam mutuamente.  Em linha com o pensamento liberal de seu tempo, o autor entende que a ilicitude tem como uma de suas condições necessárias (mas não suficientes) a disposição subjetiva do agente, seja ela intencional (dolo) ou negligente (culpa).  Nessa linha, procura reconduzir as exceções típicas à imputabilidade (menoridade, incapacidade mental, embriaguez, erro, ignorância dos fatos ou da lei) a esse elemento mental subjetivo.

Na conclusão dessa seção, J. Austin ainda apresenta uma classificação das sanções.  Sua distinção principal consiste naquela entre sanções civis e criminais (ou públicas).  O critério para distingui-las, contudo, não está no interesse das partes, já que, segundo o autor, todas as sanções interessam, imediatamente, a pessoas específicas e, remotamente, ao público em geral.  O critério está na discricionariedade da parte ofendida.  Civis são aquelas sanções cuja imposição depende da escolha da parte ofendida.  Já penais ou públicas são as sanções cuja imposição depende apenas na decisão do poder público.  Subsidiariamente, o autor ainda menciona, sem se aprofundar, a nulidade como forma de sanção por violação das regras para a prática de atos jurídicos, e a responsabilização por fatos de terceiro.

Com essa análise das modalidades de sanção, J. Austin conclui a Parte I de seu curso sobre a ciência do direito.  Nessa parte, o autor analisa as definições fundamentais dessa ciência, esclarecendo os conceitos com base nos quais o direito deve ser abordado por quem quiser compreendê-lo de forma clara e precisa, poupando-se das confusões e obscuridades decorrentes do mal uso conceitual e terminológico pelos juristas do passado (especialmente os defensores da common law tradicional, como W. Blackstone).


2.4.2. Um mapa do sistema jurídico


Após analisar conceitos jurídicos fundamentais na Parte I do curso, e depois de discorrer sobre as fontes do direito na Parte II (que será considerada na seção 4 deste artigo), J. Austin dedica o restante de seu curso sobre a ciência do direito a expor sua proposta de classificação do ordenamento jurídico.  Infelizmente, essa parte de sua teoria permaneceu incompleta, uma vez que o curso foi interrompido antes de seu fim e o autor jamais reuniu forças suficientes para completá-lo em forma escrita.  Ainda assim, as aulas dadas, combinadas com as anotações de preparo das aulas vindouras, fornecem uma visão razoavelmente clara do projeto austiniano.

A distinção fundamental proposta pelo autor consiste na divisão do ordenamento entre direito das pessoas (jus personarum) e direitos das coisas (jus rerum).  Essa distinção, contudo, a exemplo da distinção entre direitos in rem e direitos in personam acima descrita, não se refere propriamente ao objeto das normas, mas aos sujeitos a quem se aplicam.  Nessa linha, direito das pessoas são direitos especiais, aplicáveis a grupos específicos, diferenciados do público em geral por uma condição ou status juridicamente regulado.  Exemplos de direitos pessoais são as regras relativas aos menores e incapazes, aos comerciantes (ou empresários), aos estrangeiros, aos agentes públicos.  Já o direito das coisas, por sua vez, caracteriza-se por valer de forma indistinta para todos.  Nesses termos, o direito das coisas abarca parte substancial do ordenamento jurídico, com o qual se identifica, exceto pelas regras especiais dos direitos das pessoas.

Observando a distinção austiniana após quase 200 anos, é recomendável readequar sua nomenclatura a fim de facilitar o entendimento do leitor moderno.  Com efeito, é possível afirmar que o jus rerum do autor corresponde, grosso modo, ao que atualmente se chama direito geral ou comum, enquanto seu jus personarum corresponde aos direitos especiais, que estabelecem regras específicas para grupos sociais delimitados.  É verdade que, no mundo contemporâneo, a distinção vem perdendo poder explicativo, como procura explicar N. Irti (1999), com seus conceitos de microssistemas e descodificação.  Na primeira metade do século XIX, porém, a ideia ainda estava em ascensão, e era particularmente atraente para aqueles que, como J. Austin, defendiam a simplificação do ordenamento jurídico por meio da codificação.   

J. Austin prossegue decompondo cada um dos lados dessa distinção fundamental em subclasses específicas.  Embora direito geral e direitos especiais pressuponham-se mutuamente, de sorte que a compreensão de um exija o conhecimento do outro, é no campo do direito geral (direito das coisas) que se encontra a maior quantidade de noções fundamentais.  É por ele, portanto, que, segundo o autor, deve-se iniciar o estudo do direito.

O direito geral pode ser decomposto em direitos primários e direitos sancionatórios ou secundários.  Enquanto os últimos decorrem da violação de um direito anterior, os primeiros (direitos primários) existem de forma independente de qualquer violação.  Nesse sentido, direitos primários incluem direitos reais, como a propriedade, e direitos decorrentes de contratos.  Já os direitos sancionatórios incluem o direito criminal, a responsabilidade civil e os direitos processuais (civil e criminal).

A terminologia austiniana não é clara nesse passo.  Uma forma talvez mais clara de captar a intuição por trás da distinção proposta seria equiparar os direitos primários a direitos decorrentes de atos lícitos e os direitos sancionatórios a direitos decorrentes de atos ilícitos (incluídos, para esse propósito, tanto os ilícitos civis, quanto os criminais, assim como os atos inválidos). 

Sob essa perspectiva, a subclassificação proposta para os direitos primários parece fazer mais sentido.  J. Austin separa os direitos decorrentes de atos lícitos em quatro espécies: (i) direitos in rem (ou seja, válidos erga omnes, como visto acima) existentes isoladamente; (ii) direitos in personam (ou seja, válidos inter partes, como visto acima) existentes isoladamente; (iii) combinações de direitos in rem e in personam de modo individualizado; e (iv) universalidades de direitos decorrentes de sucessão universal.

O autor passa, então, a considerar a primeira dessas quatro espécies, qual seja, os direitos in rem, analisando a propriedade e os direitos reais sobre coisa alheia, bem como o modo e título de sua aquisição, quando o curso é, enfim, interrompido.  Apesar de J. Austin não ter desenvolvido suas ideias quanto ao restante das categorias, é possível reconstruir as linhas gerais de sua classificação com base nos esboços por ele deixados para o restante do curso.

Nesse sentido, os direitos sancionatórios, ou seja, aqueles decorrentes de atos ilícitos, seriam subdivididos em (i) direitos sancionatórios (todos in personam, isto é, relativos); e (ii) deveres sancionatórios (relativos e absolutos).  Enquanto os primeiros (direitos sancionatórios) compreenderiam os ilícitos civis, os últimos (deveres sancionatórios) abarcariam os ilícitos criminais.

Nesse ponto, vale ressaltar a prevalência, no esquema austiniano, das classificações romanísticas tradicionais sobre a conceitualização imperativista adotada na Parte I do curso.  De fato, apesar de ter afirmado, no início do curso, que a noção de dever, assentada sobre a ideia de comando, é mais fundamental que a noção de direito (a qual corresponde a apenas uma parte dos deveres), J. Austin constrói sua classificação geral do direito com base na noção mais específica, seguindo, nesse passo, os modelos conceituais tradicionais.

Além da classificações do direito das coisas (direito geral), J. Austin também pretendia propor uma classificação para o direito das pessoas (direito especial).  Nesse sentido, pretendia separar os status em privados, públicos ou anômalos.  Nos primeiros, incluiria os status decorrentes de situações doméstico-familiar, como as condições de marido e mulher, pai e filho, servo e senhor.  Já nos segundos (status públicos), incluiria as condições atinentes aos agentes públicos.  Nesse passo, o próprio autor ressalva que, de acordo com sua metodologia, o direito público em sentido próprio, compreendendo o direito constitucional, não deveria ser considerado direito, mas sim mera moralidade positiva, uma vez que não seria possível limitar legalmente o poder do soberano.  No entanto, por questões de mera comodidade, entende adequado incluir as regras sobre os status dos agentes públicos no campo dos direitos especiais, já que as julga imprescindíveis para a compreensão do funcionamento do direito como um todo.  Por fim, entre os status anômalos, incluiria as regras relativas aos estrangeiros, bem como aquelas atinentes aos indivíduos incapacitados por razões religiosas ou criminais.

Dessa forma, J. Austin concluiria sua análise conceitual do direito positivo com uma classificação abrangente do ordenamento jurídico que visava a promover a clareza e segurança jurídica por meio de sua organização racional.  Como trabalho conceitual, essa classificação pretendia ser um primeiro passo em direção à posterior codificação do direito inglês, objetivo ardorosamente defendido pelo autor e por outros discípulos de J. Bentham.


3. As críticas de H. Kelsen e de H.L.A. Hart à teoria austiniana


A teoria austiniana, resumida na seção anterior, representa um modelo bastante simplificado do funcionamento do direito positivo.  Da mesma forma como muitos autores, especialmente no mundo anglo-saxão, adotaram esse modelo e procuraram desenvolvê-lo, outros autores buscaram superar suas limitações por meio da crítica ao pensamento de J. Austin.  

Nesta seção, pretendo analisar as críticas dirigidas à teoria austiniana por dois dos principais autores do positivismo jurídico no século XX: H. Kelsen e H.L.A. Hart.  A cada uma delas será dedicada uma parte desta seção.


3.1. A crítica kelseniana


H. Kelsen resumiu os principais aspectos de sua crítica à teoria austiniana em um artigo intitulado A teoria pura do direito e a juriprudência analítica, publicado na Harvard Law Review em 1941.  Tendo se mudado para os Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial, H. Kelsen encontrou um ambiente acadêmico jurídico um tanto diferente daquele por ele enfrentado na Europa Continental do pré-guerra.  Uma dessas diferenças consistia na prevalência, no campo positivista, da jurisprudência analítica de J. Austin, em muitos aspectos próxima do pandectismo alemão, visto como ultrapassado pelo austríaco.  Natural, então, que procurasse esclarecer ao público as divergências entre a posição positivista tradicional anglo-saxã e sua versão mais moderna do positivismo (L. Vinx 2013) — versão essa, segundo H. Kelsen, mais coerente com os próprios fundamentos da jurisprudência analítica.

A crítica mais central de H. Kelsen a J. Austin refere-se a adoção do comando como conceito fundamental da ideia de direito.  H. Kelsen objeta que a norma jurídica vale para muito além da expressão de vontade que dá ensejo a sua criação.  Cita como exemplo o monarca absoluto cuja vontade deixa de existir por sua morte ou mudança de opinião.  Nota também as dificuldades na utilização do conceito de vontade em decisões assembleares, tão frequentes no processo legislativo moderno, em que muitos integrantes do órgão colegiado sequer têm pleno conhecimento da matéria em votação.  Nessa linha, a noção de comando, expressando fatos pontuais no tempo, não se prestaria, segundo H. Kelsen, a explicar a permanência das normas.  Essa estabilidade temporal somente seria explicável a partir da distinção entre ser e dever ser, ponto de partida da teoria pura do direito.  A norma seria, assim, no máximo, um comando despsicologizado, forma metafórica de exprimir o dever ser normativo.

H. Kelsen nota ainda que a teoria austiniana corretamente vê a sanção como essencial ao direito.  Contudo, J. Austin representa a sanção como uma forma de coerção psíquica que motiva a conduta humana.  Motivação da conduta, porém, é um problema sociológico, não normativo.  A jurisprudência normativa, de acordo com H. Kelsen, deve limitar-se a afirmar se a sanção é ou não devida em razão da ocorrência do fato ilícito (a conduta prevista na hipótese de fato da norma).  O direito consistiria apenas na vinculação entre o ilícito e a sanção, e a interpolação austiniana de questões sociológicas e psicológicas nessa relação dificultaria o entendimento de como funciona a norma jurídica.

Outro aspecto destacado pela crítica kelseniana refere-se ao conceito de dever jurídico.  J. Austin reconhece que o conceito de dever é mais primordial para o direito que o conceito de direito (subjetivo).  Mas não separa claramente dever e responsabilidade.  Enquanto o primeiro consiste na conduta cuja ocorrência torna a sanção devida, a última (isto é, a responsabilidade) representa a sujeição à sanção em caso de violação do dever.  Do ponto de vista de H. Kelsen, a noção de comando confunde essas noções, uma vez que indica como dever a conduta que não sujeita seu autor à sanção do soberano.  Dessa forma, a teoria austiniana admitiria apenas a responsabilidade individual, deixando de lado as formas coletivas de responsabilidade.  Ainda que a responsabilidade individual seja a mais comum no direito contemporâneo, a ordem jurídica moderna ainda mantém resquícios da responsabilidade coletiva comum às ordens mais primitivas.  A fim de corrigir essa limitação, a teoria pura do direito define o dever como a conduta contrária àquela que torna a sanção devida, indepedente de a quem a sanção possa ser imposta.  

Nesse passo, é interessante notar que a objeção acima resumida não é inteiramente procedente.  Se é bem verdade que a estrutura conceitual do comando induz o leitor à interpretação que dela toma H. Kelsen, não se pode deixar de observar que J. Austin admite formas não-individuais de responsabilização, mencionado expressamente a responsabilidade por fato de terceiros (vicarious liability) (J. Austin 1913, p. 252-3). Ainda que o autor não se aprofunde no tema, não se pode negar que foi por ele reconhecido.

Passando dos deveres aos direitos (subjetivos), H. Kelsen alega que a teoria austiniana não especificaria corretamente a peculiaridade do direito subjetivo, qual seja, a de que a ordem jurídica confere ao titular o poder de exigir (ou não) a conduta objeto do dever.  Tanto para a jurisprudência analítica quanto para a teoria pura do direito, o conceito de direito (subjetivo) é correlato a um subconjunto dos deveres, aqueles que J. Austin chama de deveres relativos.  Esses deveres são aqueles que consistem em uma ação ou omissão em favor de terceiro — o titular do direito.  No entanto, segundo H. Kelsen, o autor não restringiria o conceito de direito (subjetivo) àqueles deveres relativos cuja imposição forçada depende da atuação do particular (o titular do direito).  

Novamente, a crítica kelseniana não parece completamente justa.  J. Austin esclarece em seu conceito de dever relativo, que tais deveres definem-se em função de um indivíduo particular (J. Austin 1913, p. 161-2, 197-8).  Nesse ponto, a posição austiniana parece apenas ser um tanto menos refinada que a teoria pura.

H. Kelsen prossegue alegando que J. Austin apresenta o direito como um conjunto pronto para sua aplicação.  A jurisprudência analítica austiniana seria uma teoria estática, que não considera o processo de criação do direito. Já a teoria pura do direito dá maior ênfase ao aspecto dinâmico na descrição do direito positivo, destacando como o sistema jurídico regula o processo de criação de suas próprias normas.  Daí sua descrição do sistema jurídico como uma ordem escalonada, aspecto pouco enfatizado por J. Austin, que trata do tema apenas por sua teoria da admissão tácita pelo soberano.

Também essa crítica não parece inteiramente procedente.  Para J. Austin, a descrição do direito deve partir do comando, expressão de vontade do soberano que cria direito na sociedade política independente.  Nesses termos, o autor não só se ocupa do processo de criação do direito, como o torna o centro de sua teoria.  Não obstante, é forçoso acompanhar H. Kelsen na observação de que a explicação austiniana do processo criador de normas é muito pobre para refletir o grau de elaboração atingido pelo processo legislativo moderno.

Em seguida, H. Kelsen objeta que J. Austin não apresenta um conceito jurídico de estado, valendo-se do conceito político-sociológico de sociedade política independente, composta pelos súditos e pelo soberano (seja esse um indivíduo ou um grupo de indivíduos).  Nessa linha, o autor não reconhece limitação jurídica ao poder do soberano.  Assim, deixa de reconhecer que a sociedade só é possível se houver uma ordem que regulamente a conduta recíproca dos indivíduos por meio da decretação de medidas de coerção.  Essa ordem, de acordo com o autor da teoria pura, é o conceito jurídico de estado, que constitui a sociedade política — não a pressupõe.  A soberania, nesses termos, seria uma característica do estado, não de um grupo específico da sociedade política, e o conceito de soberano de J. Austin seria insuficiente.

Na mesma linha, H. Kelsen critica a posição de J. Austin contra o status de direito para o direito internacional, relegando-o à condição de moralidade positiva.  A teoria pura do direito mostra, ao contrário, que o direito internacional é direito positivo no mesmo sentido que os direitos nacionais.  Apesar de gozar de um caráter mais primitivo, porque menos centralizado, deixando o julgamento e aplicação da sanção para as próprias partes (estados) ofendidas, o direito internacional também possui caráter coercitivo, decorrente das sanções aplicadas entre estados (retaliações e guerra).  A posição austiniana, assim, padeceria de uma dificuldade inerente de explicar o funcionamento do direito como um todo, uma vez que deixa de fora um importante aspecto do sistema jurídico moderno: o direito internacional. 

Com base nas críticas acima resumidas, é possível concordar com H. Kelsen que a jurisprudência analítica de J. Austin realmente apresenta um modelo demasiado simples para explicar o direito positivo da sociedade moderna.  Ainda que em vários pontos a crítica kelseniana não seja inteiramente justa, nem leve em conta todos os matizes do pensamento de J. Austin, a adoção do comando como noção fundamental do modelo teórico austiniano parece limitar a força explicativa desse modelo, especialmente em temas importantes ao positivismo jurídico como o conceito de norma e o processo autorregulado de criação de normas no sistema jurídico.


3.2. A crítica hartiana


A crítica mais famosa à teoria austiniana é aquela desenvolvida por H.L.A. Hart nos capítulos II, III e IV de seu O conceito de direito, publicado em 1961.  Apesar de H.L.A. Hart anunciar expressamente seu compromisso mais com o tipo de abordagem adotado por J. Austin que com a literalidade da exposição do autor, sua descrição crítica do autor acabou por ser tomada como um resumo fiel da posição austiniana, a ponto de tornar-se um dos principais fatores pelos quais a teoria de J. Austin é atualmente conhecida (W. Morrison 1997, p. 219-20; F. Schauer 2001, p. 1-2).

É possível classificar a crítica hartiana em três grandes grupos, cada qual tratado em um capítulo de O conceito de direito.  O primeiro grupo, abordado no capítulo II do livro, refere-se à tentativa atribuída a J. Austin de compreender o direito como uma ordem coercitiva (orders backed by threats).  Sob a perspectiva hartiana, a noção de comando usada por J. Austin restringe-se à imposição de condutas por meio da força, e não incorpora a ideia de autoridade e convencimento implícitos no uso comum da noção de comando.  Essa ideia é expressa na famosa distinção por ele proposta entre "ter uma obrigação" e "ser obrigado".  Nesse sentido, segundo H.L.A. Hart, o modelo de J. Austin não permitiria distinguir o direito da ordem de um assaltante. Para fazê-lo, é necessário incorporar ao modelo as características de generalidade e permanência (em oposição ao caráter individual e pontual da ordem do assaltante), bem como de eficácia geral, isto é, de reconhecimento pelo grupo social.  Essas características apontam para a transformação das ordens coercitivas em regras sociais — as quais, para H.L.A. Hart, consistem no verdadeiro conceito central da teoria do direito.

A bem da verdade, esta crítica é menos persuasiva do que parece à primeira vista.  Como nota R. Moles (1985, p. 41-56), o próprio J. Austin já havia incorporado as noções de generalidade e permanência (lembre-se que a primeira classificação austiniana é aquela entre comandos gerais e particulares), e a noção de eficácia geral pode ser reconduzida, com algum esforço, à noção de hábito de obediência ao soberano (que será objeto de crítica com base em outros argumentos).  De modo geral, contudo, resta a percepção de H.L.A. Hart de que as normas jurídicas não podem ser corretamente entendidas sem que se leve em consideração uma postura ativa não só por parte do emissor (o soberano), mas também por parte do destinatário (os súditos).

O segundo grupo de críticas, abordado no capítulo III de O conceito de direito, alega que o direito compõe-se não de um único tipo de regras, mas de vários tipos diferentes.  O modelo austiniano do comando, assim, não seria capaz de representar adequadamente a diversidade das normas jurídicas, ainda que fosse um modelo adequado para um tipo de norma (geralmente identificada com as regras do direito penal). 

Nessa linha, uma objeção apresentada refere-se à condição jurídica do costume.  As regras consuetudinárias, como anota H.L.A. Hart, não são expressamente prescritas, mas surgem do reconhecimento geral no grupo social quanto a seu caráter vinculativo.  As tentativas de reconduzir esse tipo de norma ao modelo comando — por meio do reconhecimento tácito do soberano à admissão do costume pelos tribunais — parecem pouco convincentes, na medida em que não incorporam os motivos que levaram os tribunais a adotá-las como base de decisão. 

Outra objeção pertinente sustenta que nem todas as normas jurídicas impõem deveres.  Além daquelas que o fazem, existem também normas que conferem poderes (power-conferring rules).  Essas normas não exigem uma conduta, mas apenas estabelecem procedimentos para que um ato jurídico seja praticado.  Bom exemplo são as normas que regulam o testamento.  Ninguém é obrigado a fazer um testamento — e, nesse sentido, tais normas não impõem deveres.  Mas quem desejar fazê-lo deve seguir o rito previsto em lei.  

A exemplo do costume, também as normas que conferem poderes foram alvo de tentativas de absorção pelas normas que impõem deveres.  Uma dessas tentativas é a caracterização da nulidade como um tipo de sanção, um mal aplicado ao agente que pratica o ato inválido.  Outra tentativa é a interpretação das normas que conferem poderes como fragmentos de normas, que somente estariam completas se lidas com as normas impositivas de deveres a elas relativas.  Essas tentativas, porém, resultam no aumento da complexidade do modelo do comando, e no seu afastamento em relação à forma como os praticantes do direito veem sua própria atividade.

Ainda outra objeção pertencente a este grupo afirma que determinadas normas aplicam-se não só aos agentes privados, mas também aos agentes públicos.  Em outros termos, são comandos não apenas aos súditos, mas também ao soberano.  Na mesma linha da crítica formulada por H. Kelsen quanto à ausência de um conceito jurídico de estado e da aplicação da noção de estado de direito na jurisprudência analítica, H.L.A. Hart pontua que algumas normas jurídicas estabelecem deveres não para os súditos, mas para os órgãos públicos.  Nessa linha, assemelham-se menos a comandos que a promessas.

É claro que, em alguns casos, é possível refutar essa objeção distinguindo entre o agente público na condição de emissor e o agente público na condição de destinatário do comando.  Essa distinção, contudo, nem sempre é clara, como nos casos em que a norma se aplica ao próprio processo de criação de normas e atos jurídicos (e.g., tome-se o art. 60, § 4o, da Constituição Federal: "Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.").  Mais que isso, essa distinção requer sejam incorporadas ao modelo regras sobre a distinção de papéis públicos e privados, o que novamente nos afasta do modelo simples do comando.

Por fim, um terceiro grupo de objeções, expostas no capítulo IV de O conceito de direito, ataca a noção austiniana de soberania.  H.L.A. Hart reconhece que o próprio J. Austin destacava que o soberano não se confunde necessariamente com o poder legislativo.  Enquanto este pode ser legalmente limitado, aquele é juridicamente ilimitado, porque pode impor e retirar restrições aos poderes constituídos.  É nesse sentido que J. Austin indicava como soberano da Inglaterra não a conjunção do rei e do Parlamento (King-in-Parlament, no jargão constitucional inglês), mas a combinação do rei, da Câmara dos Lordes e dos eleitores dos membros da Câmara dos Comuns.  H.L.A. Hart objeta, nesse passo, que esse modelo mais sofisticado de soberano dificilmente pode ser reconciliado com a noção de hábito de obediência, que parece ser muito mais intuitiva quando aplicada aos poderes legislativo e executivo constituídos.  Para reconciliar essas noções, é preciso, segundo H.L.A. Hart, valer-se da noção de regra social, que traz mais complexidade para a explicação do direito. 

H.L.A. Hart também objeta que a noção de hábito, em que J. Austin baseia seu conceito de soberania, não serve para explicar a mudança de soberano, já que o novo soberano ainda não goza de obediência habitual, nem a persistência das leis após a troca do soberano, já que o novo soberano raramente emite novo comando ratificando todas as leis passadas.  Nesse ponto, as críticas hartianas assemelham-se à argumentação de H. Kelsen a respeito das normas como comando despsicologizado.  Para solucionar esses problemas, é preciso, segundo H.L.A. Hart, introduzir a noção de regras de revogação, apelando, novamente, para a ideia de regra social.

Em resumo, a crítica de H.L.A. Hart pode ser apresentada como a objeção de que a teoria de J. Austin não inclui a ideia de regra social.  Essa ideia, de acordo com H.L.A. Hart, compõe-se de três elementos principais: (i) pressão social em caso de descumprimento da regra,  (ii) reconhecimento social da regra como padrão de conduta, e (iii) comportamento regular e uniforme do grupo conforme um padrão geral visto como aplicável a todos, ou seja, uma atitude crítica reflexiva em relação ao comportamento regulado. Esse último elemento, designado como aspecto interno das normas, concentra a ideia central das regras sociais como constitutivas do direito.  O modelo austiniano da norma como comando é demasiado estreito para abarcar o campo das regras sociais.  Por isso, diz H.L.A. Hart, esse modelo deve ser abandonado.

Conquanto a crítica hartiana tenha alcançado imenso sucesso no meio acadêmico jurídico, especialmente no mundo anglo-saxão, não se pode deixar de notar que também foi ela própria alvo de críticas relevantes.  Uma primeira crítica vem do próprio campo positivista.  F. Schauer (2001; 2015) procura recuperar a noção de ordens coercitivas como elemento do direito.  Segundo F. Schauer, a ideia de obediência por medo da sanção é mais comum e está mais próxima da forma como as pessoas vivenciam as normas jurídicas que a atitude crítica proposta por H.L.A. Hart.  Por consequência, o modelo de J. Austin seria mais plausível e mais persuasivo do que a teoria hartiana.

Sob outra perspectiva teórica, S. Fish (1989) também se contrapõe à tentativa de H.L.A. Hart de expurgar a coerção do conceito de direito.   Para S. Fish, as regras não podem eliminar a indeterminação do direito, uma vez que as próprias regras sujeitam-se à intepretação e, dessa forma, à força persuasiva dos participantes do direito.  Em virtude dessa indeterminação inarredável, o direito está permanentemente aberto a certo grau de arbitrariedade e, portanto, pode ser utilizado como instrumento de força.  Por consequência, o modelo do comando não estaria tão distante do funcionamento do direito quanto H.L.A. Hart quer fazer crer.

Uma análise destinada especificamente a reabilitar J. Austin em face da crítica hartiana foi desenvolvida por R. Moles (1985).  Essa análise sustenta que H.L.A. Hart não compreendeu nem o objetivo, nem a metodologia de J. Austin.  Enquanto  H.L.A. Hart interpreta a teoria austiniana como uma descrição geral do direito, J. Austin, em verdade, teria apenas buscado formular um instrumento conceitual que permitisse identificar os elementos que diferenciam o direito de outras atividades humanas.  Nesse sentido, as várias deficiências apontadas por H.L.A. Hart deveriam ser entendidas não como falhas da teoria, mas como limitações de escopo a serem posteriormente complementadas por investigações adicionais.  Essa abordagem permitiria ainda explicar as inconsistências aparentes entre o método conceitual adotado em The Province of Jurisprudence Determined e as classificações jurídicas de cunho mais tradicional expostas nas lições subsequentes das Lectures on Jurisprudence.

Ao contrário do que sustentou H.L.A. Hart, o balanço da revisão crítica da teoria austiniana não revela uma derrota total.  Mas as críticas modernas à jurisprudência analítica de J. Austin apontam para fatores cada vez mais relevantes no desenvolvimento do sistema jurídico que são pouco enfatizados na teoria de John Austin.  Isso torna o modelo do comando de John Austin nem tanto errado, mas antes pouco esclarecedor como instrumento explicativo do funcionamento do direito positivo na sociedade moderna.


4. A teoria austiniana e o problema da aplicação e interpretação do direito


Na seção anterior, foram analisadas as principais críticas realizadas à teoria austiniana por dois dos mais relevantes juspositivistas do século XX.  Essas críticas buscavam indicar as limitações do modelo de J. Austin na explicação do funcionamento da validade e alteração do direito na sociedade moderna, foco principal das teorias do positivismo jurídico (P.L. Carvalho Neto 2016b).  A fim de complementar esse ponto de vista, nesta seção, pretendo analisar a resposta austiniana ao problema central da teoria jurídica contemporânea, a saber, o problema da aplicação e interpretação do direito. 

É interessante notar, de princípio, que J. Austin concentra suas considerações sobre o assunto na Parte II de suas Lectures on Jurisprudence, cujo título refere-se às fontes do direito e aos modos como ele começa e termina (Law in relation to its sources, and to the modes in which it begins and ends).  Destaca-se, assim, a preocupação central do autor nem tanto com relação à aplicação do direito, mas antes com o problema de sua criação.

Nessa parte, o autor discorre sobre algumas noções tradicionais do pensamento, tais como a noção de "fontes do direito" e a de equidade (comparando a equity inglesa ao jus praetorium da Roma Antiga).  Também aborda algumas distinções usuais no campo do ordenamento jurídico, como aquela entre direito escrito e não escrito, e direito natural e positivo.

A distinção que lhe parece central, contudo, é aquela entre direito judicial (judiciary law) e direito legislativo (statutory law).  J. Austin logo esclarece que essa distinção não deve ser compreendida na perspectiva do emissor da lei (juízes ou poderes legislativos), já que também os juízes podem criar normas legislativas (por exemplo, quando um tribunal fixa seu regulamento interno).  A seu ver, a distinção assenta-se sobre o contexto da criação da norma.  Enquanto o direito judicial é criado no processo de decisão de um caso específico, o direito legislativo é criado em abstrato, de modo desvinculado de qualquer situação concreta.

Partindo dessa divisão, J. Austin apresenta seus argumentos pela superioridade da legislação em relação ao direito judicial.  Este é sempre e necessariamente confuso, visto que não aponta claramente, segundo o autor, os fatores que compõem a norma.  Já aquele (o direito legislativo) pode ser claro, se bem redigido.  A preferência de J. Austin pela legislação decorre, assim, de sua alegada capacidade de ser claro, e, portanto, imediatamente compreendido pelos súditos e imediatamente aplicado pelos juízes, sem questionamentos interpretativos.

Na visão de J. Austin, desse modo, a interpretação é uma forma de suprir uma deficiência do direito, a qual poderia — e deveria — ser corrigida por outros meios.  A proposta austiniana para esse problema é a codificação.  Com um direito legislado criado de forma sistemática e racional, a aplicação do direito deixaria de ser problemática, ao menos na maioria dos casos. 

Note-se, porém, que o próprio autor reconhece que sua codificação racional não eliminaria por completo o problema da ambiguidade e obscuridade no direito.  Se um código racional, por um lado, sistematizaria o direito existente, eliminando ambiguidades e lacunas, esse diploma legal não seria, segundo o autor, capaz de antecipar problemas futuros.  É nesse sentido que J. Austin distingue a forma (sistemática) do código de seu conteúdo, destacando que, mesmo sob um código bem feito, problemas não regulados continuarão a surgir.  Nessa linha, o autor sugere um processo de permanente atualização do texto legal, à medida em que soluções sejam dadas a esses novos problemas.

Essas soluções, por sua vez, deveriam ser esperadas não só no âmbito legislativo, mas também no campo do direito judicial.  J. Austin é enfático, em várias passagens de suas lições, em valorizar o trabalho do jurista (lawyer) na elaboração do direito, bem como em criticar a falta de técnica e conhecimento especializado daqueles que criam direito.  Não deveria causar espécie, portanto, que o autor valorize a contribuição dos juízes na formulação de soluções para novos problemas jurídicos — ainda que, a seu ver, a participação do judiciário deva ser constantemente reduzida em razão da consolidação do direito vigente por meio da legislação.  O direito judicial revela-se, sob o ponto de vista austiniano, um importante elemento na evolução do direito rumo à crescente clareza e inteligibilidade (W.E. Rumble 1977; W.L. Morison 1958-9).

A caracterização austiniana do direito judicial mostra, contudo, uma concepção pouco desenvolvida desse processo.  Ainda que o autor aponte contextos diferentes para a criação da norma legislada e da norma adjudicada, para J. Austin — assim como para vários positivistas depois dele — a decisão judicial em casos de disputa interpretativa não se distingue substancialmente do processo legislativo de criação de normas.  Em ambas as situações, o criador da norma é visto como exercendo discricionariedade na formulação da nova norma.  J. Austin é mesmo crítico da alegação de que os juízes não criam direito, alegando tratar-se de mera desculpa para disfarçar o uso do arbítrio.  Essa crítica simplista impede o autor de abordar o problema dos parâmetros e argumentos com base nos quais as normas são criadas no âmbito judicial — isto é, o problema próprio da interpretação do direito.

No pensamento de J. Austin, o problema da criação de normas é abordado apenas na perspectiva do direito como deve ser, isto é, em sua terminologia, no âmbito da ciência da legislação.  O método adequado para tanto, como visto nas seções anteriores, é a aplicação do princípio da utilidade, que permite à razão identificar qual regra traz maior benefício para o maior número de pessoas.  Sob essa perspectiva, J. Austin não se dá conta de que o próprio corpo do direito vigente atua como fonte para a reformulação de regras e princípios de modo a justificar decisões para casos imprevistos.  Sendo um reformista (ao menos no que tange ao âmbito jurídico), o autor parece estar mais ocupado com a aplicação racional do princípio utilitarista que com as amarras argumentativas que condicionam as decisões judiciais.  Com isso, deixa de fora uma parte importante da prática jurídica, e fornece uma descrição bastante simplista de como as decisões judiciais são tomadas.


5. Conclusão


A jurisprudência analítica austiniana merece ser incluída entre as mais importantes teorias do direito positivo.  Apesar de suas várias limitações, a teoria de J. Austin forneceu contribuições relevantes não só para a compreensão do direito, mas também para a definição do método e do escopo da teoria geral do direito que se seguiu.

Uma dessas vantagens consistiu em seu enfoque no caráter generalista da teoria do direito, apresentada como descrição do funcionamento do sistema do direito positivo em geral, sem se limitar às características de qualquer direito nacional em especial.  Com isso, J. Austin pode desvincular os conceitos jurídicos de seu conteúdo, contribuindo para a adoção de um enfoque formal e independente das modificações materiais decorrentes das opções políticas das diferentes ordens jurídicas nacionais.

Na mesma linha, a busca por uma descrição formal dos conceitos jurídicos reforçou o escopo de uma teoria voltada para a exposição e explicação do direito positivo como etapa separada do julgamento valorativo do direito.  A divisão de J. Bentham entre ciência do direito (jurisprudence) e ciência da legislação foi não só adotada como desenvolvida por J. Austin, tendo se revelado uma das marcas características do positivismo jurídico que seria desenvolvido nos séculos XIX e XX tanto no continente europeu quanto no mundo anglo-saxão.

Ademais, a descrição austiniana do direito como comando do soberano pôs ênfase na vinculação entre o direito, de um lado, e a política, de outro.  Esse modelo fornece uma explicação simples — talvez simplista — da mudança do direito ao reportá-la diretamente à decisão política.  Ainda que a forma de descrever a ligação entre direito e política tenha, posteriormente, sido desenvolvida de maneira muito mais complexa, a intuição original dessa ligação é outro mérito que não se pode negar a J. Austin.

Em que pesem essas contribuições, parece difícil negar que o modelo austiniano revela-se por demais simplificado para esclarecer aspectos de crescente importância no direito moderno.  Nessa linha, são limitações importantes seu pouco caso com as regras de estruturação e divisão de funções do exercício do poder, que pode ser notado, por exemplo, na redução do direito constitucional à moralidade positiva, ou ainda na implausível teoria da admissão tácita, pelo soberano, das normas criadas por seus subordinados, bem como sua visão da tomada de decisões judiciais como um processo arbitrário, similar ao processo legislativo.  Pode-se discutir se essas posições teóricas são aceitáveis na descrição do funcionamento do direito em um estado centralizado e absolutista, como aquele encontrado na Europa dos séculos imediatamente anteriores à época em que J. Austin escreveu.  Mas o agigantamento da burocracia estatal no século XX certamente requer uma explicação mais atenta e detalhada da forma como o poder é atualmente regulado pelo sistema jurídico.

Notas

As referências biográficas desta seção podem ser encontradas em W.L. Morison 1982; H.L.A. Hart 1998; R. Campbell 1913; W.E. Rumble 2005, pp. 13-24. 

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Outra causa comentada para esse afastamento foram as fofocas nos meios ingleses a respeito de críticas de Sarah Austin a Harriet Taylor, amiga de J.S. Mill que, mais tarde, viria a tornar-se sua esposa.

Essas indicações de mudança de posicionamento no fim da vida levaram à polêmica sobre se J. Austin teria renegado suas ideias anteriores, especificamente aquelas expostas no curso publicado postumamente como Lectures on Jurisprudence, de que The Province of Jurisprudence Determined compõe a parte inicial.  Para uma análise crítica a essa tese, v. W.E. Rumble 2013.  Independente de qual tenha sido a avaliação do autor sobre sua obra ao final da vida, são as ideias por ele elaboradas e expostas nas décadas de 1820 e 1830 que lhe deram destaque no meio jurídico e, portanto, são elas que exigem exposição e análise no âmbito da história do pensamento jurídico.

É ainda curioso notar que J. Austin considera a ideia de sanção premial, mas apenas para rejeitá-la. Em sua visão, prêmios podem até induzir o destinatário à conduta desejada, mas não servem para constrangê-lo a adotar tal conduta. A esse respeito, vide AUSTIN, John. 1998, p. 16-7.

A divisão tríplice dos comandos com emissores (ou, conforme a nomenclatura do autor, leis em sentido próprio) procura seguir de forma mais clara a estrutura conceitual proposta por J. Austin.  É também possível interpor a divisão entre comandos divinos e humanos, fazendo dos comandos dos soberanos e dos não soberanos uma subcategoria desta última. Essa forma de apresentação, contudo, parece-me indicar uma maior proximidade entre a moralidade positiva (comandos dos não soberanos) e o direito positivo (comandos do soberano) em oposição às leis de deus, o que não me parece refletir corretamente o foco do autor na especificidade do direito positivo. 

10 Nota da Edição: para visualizar o Anexo, acessar o texto do verbete em formato .pdf.

11 Os seis capítulos de The Province of Jurisprudence Determined corresponderam a dez aulas do curso, perfazendo, pois, 57 aulas no total.


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Citação

CARVALHO NETO, Pythagoras Lopes de. John Austin. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/43/edicao-1/john-austin

Edições

Tomo Teoria Geral e Filosofia do Direito, Edição 1, Abril de 2017

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