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Histórico-drogas
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Vicente Greco Filho
,João Daniel Rassi
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Tomo Direito Penal, Edição 1, Agosto de 2020
O presente artigo,1 a partir da exposição do histórico da legislação brasileira de tóxicos, terá a função de abarcar os antecedentes legislativos; a Constituição de 1988; a legislação penal e processual penal extravagante com consequências ao combate das drogas; as leis, medidas provisórias, decretos, resoluções e portarias sobre drogas promulgados anteriormente à vigência da Lei 11.343/2006; bem como as espécies normativas promulgadas a partir da vigência da mesma Lei.
Mediante breve análise, verifica-se, historicamente, uma inegável tendência de toxicomania que adentrou no Brasil em meados de 1914, impulsionando importantes e detalhadas legislações, com o intuito de combater esse movimento.
Nota-se, no decorrer desse estudo, uma evolução racional e consciente do ponto de vista legal, visto que há uma mudança expressiva naquilo que concerne à abordagem dos temas de tóxicos no brasil. Portanto, um amadurecimento da legislação foi quase que nos outorgado, frente à realidade que nos era posta. Dessa forma, sujeitamo-nos a reconhecer – tecendo críticas e elogios – que essa postura é inovadora em se tratando do nosso país.
1. Antecedentes legislativos
1.1. Ordenações Filipinas
Podemos encontrar a origem da preocupação da legislação brasileira pelo problema de tóxicos nas Ordenações Filipinas, que em seu Título LXXXIX dispunham: “Que ninguém tenha em casa rosalgar, nem o venda, nem outro material venenoso”.2
1.2. Código Criminal do Império
O Código Criminal do Império não tratou da matéria, mas o Regulamento, de 29 de setembro de 1851, disciplinou-a ao tratar da polícia sanitária e da venda de substâncias medicinais e de medicamentos.
1.3. Código de 1890
O Código de 1890 considerou crime “expor à venda, ou ministrar substâncias venenosas sem legitima autorização e sem as formalidades prescriptas nos regulamentos sanitarios”.3 Tal dispositivo, porém, isolado, foi insuficiente para combater a onda de toxicomania que invadiu nosso país após 1914; em São Paulo chegou a formar-se, à semelhança de Paris, um século antes, um clube de toxicômanos. Tentando coibir tal estado de coisas, foi baixado o Decreto 4.294, de 6 de julho de 1921, inspirado na Convenção de Haia de 1921 e modificado pelo Decreto 15.683, seguindo-se regulamento aprovado pelo Decreto 14.969, de 3 de setembro de 1921.4
Por falta de condições de efetivação da legislação, também ainda incipiente, os resultados da repressão foram precários, tendo sido, em janeiro de 1932, editado o Decreto 20.930, modificado pelo Decreto 24.505, de junho de 1934. Grande impulso na luta contra a toxicomania foi dado pelo Decreto 780, de 28 de abril de 1936, modificado pelo Decreto 2.953, de agosto de 1938. Em seguida, foi criada a Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes, pelo Decreto-lei 3.114, de 13 de março de 1941, alterado pelo Decreto-lei 8.647, de 1946, com atribuições de estudar e fixar normas gerais sobre fiscalização e repressão em matéria de entorpecentes, bem como consolidar as normas dispersas a respeito.
Dos trabalhos desse órgão, surgiu o projeto para a edição do Decreto-lei 891, de 25 de novembro de 1938, ainda fonte básica de nossa legislação sobre a matéria. Na parte penal, esse decreto-lei modificou o Decreto 20.930, que havia integrado a Consolidação das Leis Penais, a qual, em seu art. 159, punia ações semelhantes às do art. 281 do Código Penal em vigor. O texto do Decreto-lei 891/38 inspirou-se na Convenção de Genebra de 1936 e traz a relação das substâncias consideradas entorpecentes, normas restritivas de sua produção, tráfico e consumo, bem como trata da internação e interdição civil dos toxicômanos.
1.4. Código Penal de 1940
A parte penal do Decreto-lei 891/38 foi alterada pelo art. 281 do Código Penal de 1940,5 e também, na parte da fiscalização, completada pelo Decreto-lei 3.114/41.6
O Decreto-lei 4.720, de 21 de setembro de 1942, fixou as normas gerais para cultivo de plantas entorpecentes e para extração, transformação e purificação de seus princípios ativo-terapêuticos.
Em 4 de novembro de 1964, a Lei 4.451 introduziu modificação no art. 281 do Código Penal, acrescentando ao tipo a ação de plantar.7
Por ter entrado em vigor a Convenção Única sobre Entorpecentes, de 1961, promulgada no Brasil em 1964, transformando-se em lei interna, a qual trouxe lista bem mais completa que a do Decreto-lei 891/38, por Portaria de 8 de maio de 1967, o Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e Farmácia (SNFMF) adotou as listas de entorpecentes da referida convenção.
Diploma legal de importância na repressão ao uso de substâncias que causam dependência física ou psíquica foi editado a 10 de fevereiro de 1967 – o Decreto-lei 159 – que equiparou as substâncias capazes de determinar dependência física ou psíquica aos entorpecentes para os fins penais e de fiscalização e controle. Nessa matéria, o Brasil foi o segundo país do mundo a enfrentar o problema, considerando tão nocivo quanto o uso de entorpecentes o uso, por exemplo, dos anfetamínicos ou dos alucinógenos. A 30 de janeiro de 1968, o SNFMF regulamentou a extração, produção, fabricação, transformação, preparação, manipulação, purificação, fracionamento, embalagem, importação, exportação, armazenamento, expedição, compra, venda, troca, oferta, cessão, prescrição e uso das substâncias capazes de determinar dependência física ou psíquica, trazendo em anexo a tabela com o rol das substâncias. Periodicamente, tem o SNFMF divulgado as listas de especialidades farmacêuticas que contenham as referidas substâncias e que, automaticamente, estão sob controle.
Em 1968, o Decreto-lei 385, de 26 de dezembro desse mesmo ano, alterou a redação do art. 281 do Código Penal8, nos termos que adiante analisaremos, e, em 11 de agosto de 1969, o Decreto-lei 753 complementou as disposições relativas à fiscalização de laboratórios que produzam ou manipulem substâncias ou produtos entorpecentes e seus equiparados, de firmas distribuidoras ou depositárias das referidas substâncias, e distribuição de amostras.
1.5. Código Penal Militar
O Código Penal Militar (Dec.-Lei 1.001, de 21-10-1969), no seu Capítulo III, intitulado “Dos crimes contra a saúde”, previu disposição, ainda vigente, bem semelhante ao que era previsto no art. 281 do Código Penal em sua redação original. A pena prevista para o caput e § 1º é de um a cinco anos de reclusão (art. 58 do CPM).
Apesar das críticas sobre a discrepância de tratamento, já existente sob a vigência da Lei 6.368, a jurisprudência predominante do Supremo Tribunal Federal é no sentido de se aplicar a legislação penal militar aos crimes de drogas sujeitos à justiça castrense pelo princípio da especialidade, afastando a incidência da legislação penal comum.
1.6. Lei 5.726/71
A Lei 5.726, de 29 de outubro de 1971, que dispôs sobre medidas preventivas e repressivas ao tráfico e uso de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica, deu nova redação ao art. 281 do Código Penal e alterou o rito processual para o julgamento dos delitos previstos nesse artigo, representando a iniciativa mais completa e válida na repressão aos tóxicos no âmbito mundial na sua época11. Essa Lei foi regulamentada pelo Decreto 69.845, de 27 de dezembro de 1971.
Como já tivemos oportunidade de escrever, a Lei 5.726/71 continha 27 arts. e estava dividida em três capítulos: I – Da Prevenção; II – Da Recuperação dos Infratores Viciados; III – Do Procedimento Judicial. O projeto original, enviado ao Congresso Nacional, previa um quarto capítulo, “Das Disposições Gerais”, de modo que não se englobassem no Capítulo III, que tem por título “Do Procedimento Judicial”, normas não processuais como foi feito no texto final. Assim, em linhas gerais, procurava a Lei 5.726/71 ressaltar a importância da educação e da conscientização geral na luta contra os tóxicos, único instrumento realmente válido para se obter resultados no combate ao vício, representando, como já dissemos, a iniciativa mais completa e válida na repressão aos tóxicos no âmbito mundial na sua época12.
A Portaria 131, de 6 de abril de 1972, do Sr. Ministro da Saúde, aprovou, por sua vez, o Regimento Interno da Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes do Ministério da Saúde (CONFEN), órgão orientador e disciplinador da fiscalização e controle de substâncias entorpecentes e equiparados, com o objetivo de reprimir seu tráfico e utilização ilícita. Esse órgão fora criado pelo Decreto 780, de 28 de abril de 1936, e mantido pelo Decreto-lei 891/38. Constitui, ainda, órgão consultivo do Ministério da Saúde para orientação do Governo em suas relações com a ONU e outras autoridades internacionais ou estrangeiras, visando o cumprimento de acordos e convenções sobre a matéria. Releva destacar a importância dessa portaria como instrumento para fixação da política sanitária nacional relativa aos fármacos. De natureza similar é a Portaria 307, de 26 de setembro de 1972, do Sr. Ministro da Saúde, que aprova o Regimento das Comissões de Fiscalização de Entorpecentes dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, com alteração da Portaria 112-Br, de 2 de abril de 1973, do Sr. Ministro da Saúde, na parte relativa à composição dessas Comissões.
Posteriormente, a Portaria 26, de 26 de julho de 1974, do SNFMF, aprovou duas listas – uma referente a substâncias e outra a especialidades farmacêuticas –, a exigirem controle rigoroso pelo farmacêutico ou responsável pelo estabelecimento. Seus dispositivos retroagem, também, às especialidades farmacêuticas incluídas na Resolução 2, da Portaria 5, de 20 de janeiro de 1969. As medidas de controle que determina referem-se a receitas, escrituração, padronização de embalagem e distribuição de amostras. Estabelece a obrigatoriedade de retenção das receitas pelas farmácias ou drogarias e designa o procedimento para casos de emergência e prescrição em hospitais e para o uso em pesquisa ou atividade de ensino. Ademais, determina a obrigatoriedade de existência dos dizeres “Venda sob receita médica – sujeito à retenção” nos rótulos e envoltórios e, relativamente às amostras, a observação “Produto sujeito à restrição de venda e uso”. Entretanto, as autoridades sanitárias devem ser comunicadas sobre o início e cessação do fabrico e venda desses produtos.
A Portaria 18, de 28 de setembro de 1973, do SNFMF, baixou instruções relativas à fiscalização e ao controle das substâncias que determinam dependência física ou psíquica e das especialidades que as contenham, apresentando cinco listas e respectivas normas relativas a receituário, compra, venda, devolução, embalagem e escrituração. Em especial, prescrevia o uso em medicina das drogas arroladas na Lista n. 1 e determinava sua exclusão das especialidades farmacêuticas, permitindo, apenas, seu uso para pesquisa científica com autorização do SNFMF. Exigia licença especial, outorgada pelas autoridades sanitárias, para que as farmácias pudessem operar com esses fármacos. Regulava, ademais, a forma de importação, exportação e reexportação das drogas dessas Listas.
A Portaria 18/73 foi revogada pela Portaria 20, de 6 de setembro de 1977, que, mantendo a ideia geral, atualizou o assunto, havendo sempre revisões periódicas, como as das Portarias 2, de 30 de março de 1984, e 3, 4 e 5, de 31 de maio de 1984, da Divisão Nacional de Vigilância Sanitária de Medicamentos (DIMED), substituídas pelas Portarias 2/1985, 27/1986 e 28/1986.
Merece ser citada, ainda, por tratar de matéria paralela, a Lei 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispôs sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, os cosméticos, os saneantes e outros produtos.
1.7. Lei 6.368/76
A Lei 6.368, de 21 de outubro de 1976, substituiu a Lei 5.726/1971, salvo o seu art. 22, que trata do procedimento sumário de expulsão do estrangeiro que comete crime de tráfico de entorpecente, sendo regulamentada pelo Decreto 78.992, de 21 de dezembro de 1976.13
A lei, que continha 47 artigos, estava dividida em cinco capítulos: I – Da Prevenção; II – Do Tratamento e da Recuperação; III – Dos Crimes e das Penas; IV – Do Procedimento Criminal; V – Das Disposições Gerais.
O projeto original, como havia sido enviado ao Congresso, tinha mais um artigo, o 12, que foi excluído por desnecessário.
Em suas linhas gerais, seguindo a orientação aberta pela anterior Lei 5.726/71, o diploma procurava ressaltar a importância da educação e da conscientização geral na luta contra os tóxicos, único instrumento realmente válido para se obter resultado no combate ao vício.
O projeto teve base nos trabalhos realizados por comissão nomeada no Ministério da Justiça, integrada pelos Doutores Oswald Moraes Andrade, médico psiquiatra, João de Deus Lacerda Menna Barreto, juiz criminal no Rio de Janeiro, Paulo Ladeira de Carvalho, professor de Direito Penal, e Décio dos Santos Vives, diretor da Divisão de Repressão a Entorpecentes do Departamento da Polícia Federal.
A Lei 6.368/1976, na parte penal, como exposto na “Apresentação” a esta edição, permaneceu até a Lei 11.343, publicada no Diário Oficial da União, de 24 de agosto de 2006, entrando em vigência 45 dias após a publicação.
1.8. Lei 10.409/2002
A Lei 10.409, de 11 de janeiro de 2002, pretendeu, como projeto, substituir a Lei 6.368/76, integralmente.14
Dada a péssima qualidade no seu aspecto mais importante, qual seja, a definição dos crimes, o Poder Executivo foi obrigado a vetar todo o Capítulo III – “Dos Crimes e das Penas”. Bastava ler o texto vetado para aferir a sua impropriedade e absurdo. Aliás, impropriedades é que não faltam: o art. 38 usava o termo “mandato” quando o juridicamente correto seria “mandado” (costumamos reprovar nossos alunos que não os usam corretamente).
De forma coerente, o Poder Executivo também vetou o art. 59 do projeto que disporia sobre a revogação da Lei 6.368/76. Isso nos permitiu concluir que esse diploma continuou em vigor no que não fosse compatível com a então nova lei.15 A definição de crimes e penas não tinha qualquer incompatibilidade. Desse modo, considerando que a Lei 10.409/2002 referia-se toda às medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito de entorpecentes, ficaria afastada, como sustentamos naquela oportunidade com a devida venia, qualquer interpretação leviana e irresponsável no sentido de que teria havido a descriminalização geral.16
Em acréscimo, lembramos que o Brasil continuava signatário das Convenções Internacionais de Nova York e Viena, com o compromisso de tipificar penalmente o tráfico ilícito de entorpecentes, especialmente a partir daquela época em que a humanidade passou a se empenhar no combate ao crime organizado, do qual o tráfico é um dos principais ramos.
Não houve, naquela oportunidade, a revogação expressa da Lei 6.368/1976 na parte penal, e não houve, também, revogação tácita, porque a Lei 10.409/2002 não tratou de toda a matéria, uma vez que os crimes eram referidos, entre outras, na Lei de Crimes Hediondos, na Lei de Lavagem de Dinheiro, além das aludidas Convenções Internacionais.
Qualquer critério interpretativo, inclusive o sociológico, teleológico, lógico, sistemático e até o simples gramatical, recusava a tese de que teria sido revogada a Lei 6.368/1976 na descrição dos tipos penais.17
Outra questão que havia surgido, esta pertinente e relevante, foi relativa à aplicabilidade da parte processual da Lei 10.409/2002.
Referida lei previa normas processuais e procedimentais em três capítulos: no IV – Do Procedimento Penal; no V – Da Instrução Criminal; e no VI – Dos Efeitos da Sentença.
Prosseguindo em sua senda de impropriedade e defeitos, o art. 27 dispunha: “O procedimento relativo aos processos por crimes definidos nesta Lei rege-se pelo disposto neste Capítulo...”.
Isso permitiu concluir que, em virtude do veto às disposições penais, “nesta Lei” não havia previsão de crimes, visto que se encontravam na Lei 6.368/1976.
Pior: “nesse Capítulo”, que tratava do “Procedimento Comum” em desnecessária subdivisão em estranha “Seção única”, havia, apenas, disposições sobre o inquérito policial e providências investigatórias. O procedimento processual encontrava-se no capítulo seguinte, o V – Da Instrução Criminal, que não era “neste”. Muito menos no posterior.
Como seria possível entender, então, a aplicação imediata do novo procedimento?
É certo que, por intermédio de interpretação criativa (menos admissível no Direito Penal), poder-se-ia entender que, por extensão, o procedimento seria o novo.
Acontece, todavia, que o procedimento é mal amanhado. Previa o incompreensível duplo interrogatório! Após a citação (art. 38) e na audiência (art. 41).
Diante desse contexto, posicionamos no sentido de que deveria continuar sendo aplicado, também, o procedimento da Lei 6.368/1976, talvez por razões exclusivamente práticas, o que suscitou polêmicas.18
Diante da péssima situação legislativa que se instaurou, sustentamos que o melhor seria a elaboração de uma nova lei, revogando-se a Lei 6.368/1976 e a Lei 10.409/2002, o que acabou acontecendo com a promulgação da Lei 11.343/2006.
2. A Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal referiu-se ao tráfico de entorpecentes como crime inafiançável (art. 5º, XLIII), insuscetível de graça e anistia.19
Também referiu ao tráfico, ao dispor que o brasileiro naturalizado poderá ser extraditado, desde que comprovada a sua participação em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas, independentemente se o crime cometido foi antes ou depois da naturalização (art. 5º, LI). O estrangeiro poderá ser, em regra, extraditado, salvo se se tratar de crimes políticos ou de opinião.20
Por fim, dispôs no seu art. 243 e parágrafo único que as glebas cultivadas com plantações ilícitas serão expropriadas, assim como os bens decorrentes do tráfico ilícito serão apreendidos, confiscados e utilizados em benefício de instituições e pessoal especializados no tratamento e recuperação de viciados e no aparelhamento e custeio de atividades de fiscalização, controle, prevenção e repressão do crime de tráfico dessas substâncias.
3. Legislação penal e processual extravagante com consequências ao combate das drogas
3.1. Lei dos Crimes Hediondos
A Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, referiu o tráfico de entorpecentes ao lado dos crimes hediondos, prevendo, nos arts. 8º e 10, alterações na revogada Lei 6.368/1976. Além disso, trouxe consequências de ordem penal e processual, muitas das quais passaram a ser tratadas, de forma específica, na Lei 11.343/2006.
3.2. Lei das Desapropriações
A Lei 8.257, de 26 de novembro de 1991, regulamentou a desapropriação de glebas nas quais se localizem culturas ilegais de substâncias psicotrópicas, conforme art. 243 da Constituição.
3.3. Lei de Interceptação Telefônica
Medida processual importante ao combate da criminalidade envolvendo drogas são as interceptações telefônicas.
A Lei 9.296, de 24 de julho de 1996, regulamentando o inciso XII do art. 5º da Constituição, disciplinou a interceptação das comunicações telefônicas para prova em investigação criminal e instrução processual penal.21
Os requisitos autorizadores da interceptação estão previstos no art. 2º e incisos da referida lei em uma redação lamentavelmente negativa. Em vez de enumerar os casos de sua admissibilidade, de forma taxativa, previu os casos em que ela não é admissível. Dentre eles, não será admitida a interceptação telefônica quando o fato apurado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção (inciso III).22
Dessa forma, o procedimento da interceptação, que tem natureza cautelar preparatória com a finalidade de produção de prova penal, será cabível, em tese, nos crimes de drogas punidos com reclusão, excetuando-se os crimes dos arts. 38 e 39 da Lei de Drogas, que são punidos com detenção, desde que presentes os demais requisitos legais e que seja obedecido no caso concreto o princípio da proporcionalidade dos bens jurídicos envolvidos. Na hipótese concreta, violada a proporcionalidade, a aplicação da norma do inciso III será inconstitucional.
3.4. Lei de “Lavagem” de Valores
Outro instrumento fundamental previsto na legislação brasileira utilizado na luta contra a narcomania é a Lei 9.613, de março de 1998, que dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos ou valores, a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos nela previstos e a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
O crime de lavagem de dinheiro está previsto na Convenção de Viena, embora limitado somente aos crimes de drogas (arts. 3º, § 1º, a, ii, e 5º, § 4º, a e g).
A antiga redação da lei, vigente até a promulgação na Lei 12.683, de 9 de julho 2012, previa de forma mais abrangente a punição da ocultação, dissimulação da natureza, origem etc. de bens provenientes além do tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins, de outros crimes (art. 1º)23. A nova redação da lei proposta pela Lei 12.683, por sua vez, excluiu o rol de crimes antecedentes, possibilitando a consumação do delito de lavagem em face de qualquer infração penal24. Outras disposições foram previstas, de natureza processual, como apreensão e sequestro de bens com a inversão do ônus da prova; de natureza administrativa, como mecanismos de controle dos registros de operações consideradas suspeitas etc.
3.5. “Lei do Abate”
O Decreto 5.144, de 16 de julho de 2004, mais conhecido como “Lei do Abate”, regulamenta os §§ 1º, 2º e 3º do art. 303 da Lei 7.565, de 19 de dezembro de 1986 (Código Brasileiro de Aeronáutica), estabelecendo procedimentos a serem seguidos no que concerne às aeronaves hostis ou suspeitas de tráfico de drogas, levando em conta que estas podem apresentar ameaça à segurança pública (art. 1º).
Para uma aeronave se submeter à medida de destruição, deverá ser considerada hostil nos termos da lei (art. 3º). No entanto, antes de ser considerada hostil, deverá ela ser classificada como suspeita (art. 2º), caso em que sofrerá medidas coercitivas definidas no art. 3º, consistentes em averiguação (§ 1º), intervenção (§ 2º) e persuasão (§ 3º). Se nenhum desses procedimentos de coerção forem atendidos pela aeronave, será ela destruída na forma definida pelo art. 5º, desde que cumpridas as condições do art. 6º.25
4. Leis, medidas provisórias, decretos, resoulões e portarias sobre drogas promulgados anteriormente à vigência da Lei 11.343/2006, ainda em vigor
Estão em vigor e, portanto, integram a legislação atual (Lei 11.343/2006) as seguintes espécies normativas, além das normas antes citadas e constantes do item anterior.
4.1. Portarias
Integra, principalmente, a legislação em vigor a Portaria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) SVS/MS 344, de 12 de maio de 1998, várias vezes modificada,26 que relacionou os entorpecentes e regulamentou a fiscalização das demais substâncias que determinem dependência física ou psíquica, cuja terminologia deve ser atualizada para a terminologia da lei em vigor. Outras podem ser citadas:
(a) Portaria 6, de 29 de janeiro de 1999, da ANVISA, que estabelece, aprimora e atualiza as ações de vigilância sanitária com vistas ao aperfeiçoamento do controle e fiscalização das substâncias constantes das listas do Regulamento Técnico aprovado pela Portaria SVS/MS n. 344/98, bem como os mecanismos para evitar o comércio e uso indevido das referidas substâncias ou medicamentos.
(b) Portarias do Ministro Chefe do Gabinete de Segurança Institucional e Secretário Nacional Antidrogas n. 2, de 17 de fevereiro de 2000, sobre aprovação e execução de projetos de prevenção, tratamento, pesquisa e eventos científicos na área de drogas; e n. 4, de 13 de novembro de 2000, que dispõe sobre recenseamento e cadastro de instituições públicas e privadas com atuação nas áreas de prevenção, pesquisa, tratamento e reinserção social de dependentes químicos.
(c) Portaria Interministerial 10, de 31 de março de 2004, do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e Presidente do Conselho Nacional Antidrogas (CONAD) e do Ministro da Saúde, dispondo sobre a instalação de Câmara Técnica Temática de Tratamento e Câmara Técnica Temática de Redução de Danos, coordenadas pelo Ministério da Saúde.
4.2. Resoluções
A Resolução 3, de 19 de junho de 1995, do então Conselho Federal de Entorpecentes, estabelece critérios de prioridade na apreciação de processos sobre a liberação dos recursos de que trata o art. 5º e seus incisos da Lei 7.560/1986.
A Resolução 201, de 18 de julho de 2002, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, determina os pontos de entrada e saída, no País, de mercadorias à base de substâncias entorpecentes.
A Resolução 5, de 4 de novembro de 2004, do Conselho Nacional Antidrogas (CONAD), instituindo um Grupo Multidisciplinar de Trabalho para o levantamento e acompanhamento do uso religioso da ayahuasca. O objetivo final do grupo era a elaboração de documento que traduzisse a deontologia do uso de ayahuasca, como forma de prevenir seu uso inadequado.
A Resolução 3, de 27 de outubro de 2005, do Conselho Nacional Antidrogas (CONAD), que, em decorrência do processo que realinhou a Política Nacional Antidrogas até então vigente, aprovou a nova Política Nacional Antidrogas.
4.3. Medidas provisórias
As medidas provisórias anteriores a 12 de setembro de 2001 continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional, por força do art. 2º da Emenda Constitucional 32, de 11 de setembro de 2001.
A Medida Provisória 2.216-37, de 31 de agosto de 2001, ainda em tramitação, alterou a denominação do órgão criado pela Lei 7.560/1986 para Fundo Nacional Antidrogas (FUNAD), bem como transferiu a sua gestão do âmbito do Ministério da Justiça para a Secretaria Nacional Antidrogas do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
4.4. Decretos
Decreto-lei 891/1938, que aprova a Lei de Fiscalização de Entorpecentes e se encontra quase que totalmente revogado tacitamente pela legislação posterior.
Decreto-lei 753/1969, que dispõe sobre a fiscalização de laboratórios que produzam ou manipulem substâncias ou produtos entorpecentes e seus equiparados, de firmas distribuidoras ou depositárias das referidas substâncias e de distribuição de amostras desses produtos.
O Decreto 85.110, de 2 de setembro de 1980, instituiu o Sistema Nacional de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes, integrando-o o Conselho Federal de Entorpecentes como órgão central, o qual já tem baixado diversas orientações e recomendações.
Decreto 95.650, de 19 de janeiro de 1988, que regulamenta a Lei 7.560/1986, que criou o FUNCAB.
O Decreto 2.018, de 1º de outubro de 1996, regulamentou a Lei 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígenos, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias, defensivos agrícolas, nos termos do art. 220, § 4º, da CF.
O Decreto 85.110/80 foi substituído pelo Decreto 3.696, de 22 de dezembro de 2000, que regulamentou o art. 3º da Lei 6.368/1976, que tratava do Sistema Nacional Antidrogas (SISNAD).
O Decreto 3.845, de 13 de junho de 2001, aprovou a criação da estrutura do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, no que tange à organização da Secretaria Nacional Antidrogas.
O Decreto 4.262, de 10 de junho de 2002, regulamentou a Lei 10.357, de 27 de dezembro de 2001, que estabeleceu normas sobre o controle e fiscalização de produtos químicos que direta ou indiretamente possam ser destinados à elaboração ilícita de drogas.
O Decreto 6.117, de 22 de maio de 2007, por sua vez, aprova a política nacional sobre o álcool, dispondo sobre medidas para redução do uso indevido de álcool e sua associação com a criminalidade.
4.5. Leis
A Lei 7.560/1986, alterada pela Lei 8.764, de 20 de dezembro de 1993, criou o Fundo de Prevenção, Recuperação e de Combate às Drogas de Abuso (FUNCAB), e dispôs sobre os bens apreendidos ou adquiridos com produtos de tráfico de drogas ou atividades correlatas. O FUNCAB foi ratificado pela Lei 9.240, de 22 de dezembro de 1995. Referida denominação, como já dissemos, foi alterada para Fundo Nacional Antidrogas (FUNAD) e sua gestão foi transferida do Ministério da Justiça para a Secretaria Nacional Antidrogas do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República pela Medida Provisória n. 2.216-37/2001 (em tramitação).
A Lei 9.294, de 15 de julho de 1996, dispôs sobre restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígenos, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4º do art. 22 da Constituição. Referida lei foi regulamentada pelo Decreto presidencial 2.018, de 1º de outubro de 1996.
A Lei 10.357, de 27 de dezembro de 2001, estabeleceu normas de controle e fiscalização sobre produtos químicos que direta ou indiretamente possam ser destinados à elaboração ilícita de drogas e foi regulamentada pelo Decreto 4.262, de 10 de junho de 2002.
5. Espécies normativas promulgadas a partir da vigência da Lei 11.343/11
Decreto 5.912, de 27 de setembro de 2006, que regulamentou o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), criado pela Lei 11.343/2006, atualmente em vigor. Revogou, portanto, o Decreto 3.696, de 21 de dezembro de 2000, que dispôs sobre o Sistema Nacional Antidrogas, revogando os Decretos 2.632, de 19 de junho de 1998, e 2.729, de 1º de outubro de 1998.
Resolução da Diretoria Colegiada, RDC 58, de 5 de setembro de 2007, que regulamenta a fiscalização e controle de substâncias anorexígenas. Tais substâncias deverão ser prescritas em Notificação de Receita “B2”, cujo modelo e orientações se encontram na referida RDC.
6. O debate do STF acerca da constitucionalidade de dispositivos da lei de drogas
6.1. O julgamento do Recurso Extraordinário 635.659/SP
Por meio de Recurso Extraordinário interposto pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, questionou-se a constitucionalidade do dispositivo trazido no art. 28 da Lei 11.343, no que se refere às sanções trazidas em seus incisos I a III.27
O argumento basilar utilizado pelo recorrente diz respeito ao fato de que a criminalização do porte de substâncias feriria a dignidade humana, conforme enunciado no art. 5º, X, da Constituição Federal, implicaria (implicando?) em ingerência estatal indevida na vida privada.
No mais, dado o fato de que a norma constante do art. 28 pressuporia a não irradiação de efeitos nocivos a terceiros, não subsistiria lesividade apta a justificar sua criminalização.
O Min. Gilmar Mendes, na qualidade de relator, deu provimento ao recurso. Por sua vez, o Min. Edson Fachin votou pelo provimento parcial do recurso
Atualmente, verifica-se que o Recurso se encontra no gabinete do Ministro Alexandre de Moraes, tendo sido remetido e recebido em 19 de setembro de 2017.
6.2. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5708
Ajuizada pelo Partido Popular Socialista, a presente demanda visa a declaração de inconstitucionalidade das normas constantes dos arts. 2º, caput e parágrafo único; 28; 31; 33, § 1º, I, II e III; 34; bem como, por decorrência lógica, os art. 35 e 36, todos estes da Lei 11.343/2006, no que se refere especificamente à cannabis.
Para tanto, além de argumentos de ordem legal, baseado na dignidade da pessoa humana do cidadão enquanto sujeito autodeterminável, é ressaltado o caráter medicinal que esta substância possui, demonstrando, inclusive, que o valor necessário para a utilização de um tratamento médico (legal) mediante uso de canábicos, em verdade, impulsiona a prática da traficância, uma vez que o consumo desta substância por este meio se mostra muito mais vantajoso economicamente.
Referida ação se encontra conclusa à Min. Rosa Weber, relatora, desde o dia 10 de janeiro de 2018, após apresentação de manifestações de diversos amici curiae, aguardando o envio dos autos à mesa para julgamento.
Notas
1A versão original deste artigo foi publicada em nossa obra Tóxicos: prevenção e repressão: comentários à Lei 11.343, Capítulo VI, pp. 83-102.
2Assim estava disposto o Título LXXXIX:
"Nenhuma pessoa tenha em sua caza para vender, rosalgar branco, nem vermelho, nem amarello, nem solimão, nem agua delle, nem escamonéa, nem opio, salvo se for Boticario examinado, e que tenha licença para ter Botica, e usar do Officio.
E qualquer outra pessoa que tiver em sua caza alguma das ditas cousas para vender, perca toda sua fazenda, a metade para nossa Camera, e a outra para quem o accusar e seja degredado para Africa até nossa mercé.
E a mesma pena terá quem as ditas cousas trouxer de fóra, e as vender as pessoas, que não forem Boticarios.
E os Boticarios as não vendão, nem despendão, se não com os Officiaes, que por razão de seus Officios as hão mister, sendo porem Officiais conhecidos per elles, e taes, de que se presuma que as não darão á outras pessoas.
E os ditos Officiais as não darão e nem venderão a outrem, porque dando-as, e seguindo-se disso algum dano, haverão a pena que de Direito seja, segundo o dano fôr.
E os Boticarios poderão metter em suas mesinhas os ditos materiaes, segundo pelos Medicos, Cirurgiões, e Escriptores fôr mandado.
E fazendo contrario, vendendo-os a outras pessoas, que não forem Officiais conhecidos, pola primeira vez paguem cincoenta cruzados, metade para quem accusar, e descobrir”.
3Era o que dispunha o seu art. 159, contido no Capítulo III (Dos crimes contra a saúde publica), do Título III (Dos crimes contra a tranquilidade publica). (PIERANGELI, José Henrique. Códigos penais do Brasil: evolução histórica, p. 286).
4V. a respeito, SIQUEIRA, Galdino. Direito penal brazileiro, pp. 177-181.
5Com o nomen iuris “Comércio clandestino ou facilitação de uso de entorpecentes”, previa o art. 281, em sua redação original:
“Art. 281. Importar ou exportar, vender ou expor à venda, fornecer, ainda que a título gratuito, transportar, trazer consigo, ter em depósito, guardar, ministrar ou, de qualquer maneira, entregar a consumo substância entorpecente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, de dois a dez contos de réis.
§ 1º Se o agente é farmacêutico, médico ou dentista:
Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, de três a doze contos de réis.
§ 2º Incorre em detenção, de seis meses a dois anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, o médico ou dentista que prescreve substância entorpecente fora dos casos indicados pela terapêutica, ou em dose evidentemente maior do que a necessária, ou com infração de preceito legal ou regulamentar.
§ 3º As penas do parágrafo anterior são aplicadas àquele que:
I – Instiga ou induz alguém a usar entorpecente;
II – utilizar local, de que tem a propriedade, posse, administração ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que a título gratuito, para uso ou guarda ilegal de entorpecente;
III – contribue de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso de substância entorpecente.
§ 4º As penas aumentam-se de um terço, se a substância entorpecente é vendida, aplicada, fornecida ou prescrita a menor de dezoito anos”.
6Cf. GONZAGA, João Bernardino. Entorpecentes: aspectos criminológicos e jurídico-penais, pp. 24 e s.; HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal, pp. 124-143; FARIA, Bento de. Código Penal brasileiro, p. 264-270; e NORONHA, E. Magalhães. Direito penal, pp. 69 e ss.
7Com as alterações, a redação do art. 281 passou a ser a seguinte:
“Art. 281. Plantar, importar ou exportar, vender ou expor à venda, fornecer, ainda que a título gratuito, transportar, trazer consigo, ter em depósito, guardar, ministrar ou, de qualquer maneira, entregar a consumo, substância entorpecente, sem autorização ou em desacôrdo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa de dois a dez mil cruzeiros. (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
§ 1º Se o agente é farmacêutico, médico ou dentista: Pena – reclusão de dois a oito anos e multa de três a doze mil cruzeiros. (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
§ 2º Incorre em detenção, de seis meses a dois anos, e multa de quinhentos a cinco mil cruzeiros, o médico ou dentista que prescreve substâncias entorpecentes fora dos casos indicados pela terapêutica ou em dose evidentemente maior do que a necessária, ou com infração de preceito legal regulamentar. (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
§ 3º As penas do parágrafo anterior são aplicados àquele que: (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
I – instiga ou induz alguém a usar entorpecente; (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
II – utilizar local, de que tem a propriedade, posse, administração ou vigilância, ou consente que outrem dêle se utilize, ainda que a título gratuito, para uso ou guarda ilegal de entorpecente; (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
III – contribui de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso de substância entorpecente. (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)
§ 4º As penas aumentam de um têrço, se a substância entorpecente é vendida, aplicada, fornecida ou prescrita a menor de dezoito anos. (Redação dada pela Lei 4.451, de 1964)”
8Com a nova redação, dispôs o art. 281:
“Art. 281. Importar ou exportar, preparar, produzir, vender, expor a venda, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou de desacôrdo com determinação legal ou regulamentar: (Comércio, posse ou facilitação destinadas a entorpecentes ou substância que determine dependência física ou psíquica.) (Redação dada pelo Decreto-lei 385, de 1968)
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa de 10 a 50 vêzes o maior salário mínimo vigente no país. (Redação dada pelo Decreto-lei 385, de 1968)
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem ilegalmente: (Redação dada pelo Decreto-lei 385, de 1968)
I – importa ou exporta, vende ou expõe à venda, fornece, ainda que a título gratuito, transporta, traz consigo ou tem em depósito ou sob sua guarda matérias-primas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica; (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
II – faz ou mantém o cultivo de plantas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica. (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
III – traz consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica. (Matérias-primas ou plantas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica.) (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
§ 2º Se o agente é farmacêutico, médico dentista ou veterinário: (Redação dada pelo Decreto-lei 385, de 1968)
Pena – reclusão, de 2 a 8 anos, e multa de 20 a 50 vêzes o maior salário mínimo vigente no país. (Forma qualificada) (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
§ 3º Prescrever o médico ou dentista substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, fora dos casos indicados pela terapêutica, ou em dose evidentemente maior que a necessária ou com infração de preceito legal ou regulamentar: (Redação dada pelo Decreto-lei 385, de 1968)
Pena – detenção, de seis meses a 2 anos, e multa de 10 a 30 vêzes o maior salário mínimo vigente no país. (Receita legal) (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
§ 4º As penas do parágrafo anterior são aplicadas àquele que: (Redação dada pelo Decreto-
-Lei 385, de 1968)
I – instiga ou induz alguém a usar entorpecente ou substância que determine dependência física ou psíquica; (Induzimento ao uso de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica.) (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
II – utiliza local, de que tem a propriedade, posse, administração ou vigilância, ou consente que outrem dêle se utilize, ainda que a título gratuito, para uso ilegal de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica; (Local destinado ao uso de entorpecentes ou de substância que determine dependência física ou psíquica.) (Incluído pelo Decreto-
-Lei 385, de 1968)
III – contribui de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica. (Incentivo ou difusão do uso de entorpecentes ou de substância que determine dependência física ou psíquica.) (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968)
§ 5º As penas aumentam-se de um têrço, se a substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica é vendida, ministrada, fornecida ou prescrita a menor de 16 anos. (Aumento da pena) (Incluído pelo Decreto-lei 385, de 1968).”
9“Tráfico, posse ou uso de entorpecente ou substância de efeito similar”
Art. 290. Receber, preparar, produzir, vender, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, ainda que para uso próprio, guardar, ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, em lugar sujeito à administração militar, sem autorização ou em desacôrdo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, até cinco anos.
1º Na mesma pena incorre, ainda que o fato incriminado ocorra em lugar não sujeito à administração militar:
I – o militar que fornece, de qualquer forma, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica a outro militar;
II – o militar que, em serviço ou em missão de natureza militar, no país ou no estrangeiro, pratica qualquer dos fatos especificados no artigo;
III – quem fornece, ministra ou entrega, de qualquer forma, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica a militar em serviço, ou em manobras ou exercício.
2º Se o agente é farmacêutico, médico, dentista ou veterinário:
Pena – reclusão, de dois a oito anos.”
Digno de nota, também, é a disposição do natimorto Código Penal de 1969, Decreto-lei 1.004, de 21 de outubro de 1969, que inserido nos “crimes contra a saúde pública”, chegou a prever no art. 311:
“Comércio, posse ou uso de entorpecentes ou substâncias que determinem dependência física ou psíquica
Art. 311 – Importar ou exportar, preparar, produzir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo, substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, até seis anos, e pagamento de até trezentos e sessenta dias-multa.
§ 1º – Nas mesmas penas incorre quem, indevidamente:
I – importa ou exporta, vende ou expõe a venda ou oferece, fornece, ainda que a título gratuito, transporta, traz consigo ou tem em depósito, ou sob sua guarda, matérias-primas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica;
II – faz ou mantém o cultivo de plantas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica;
III – traz consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica;
IV – adquire substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica.
§ 2º Prescrever o médico ou o dentista, indevidamente, substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, ou em dose evidentemente maior que a necessária ou com infração de preceito legal ou regulamentar:
Pena – detenção, de um a cinco anos, e pagamento de dez a cem dias-multa.
§ 3º Incorre nas penas de um a seis anos de reclusão, e pagamento de dez a duzentos dias-
-multa, quem:
I – instiga alguém a usar entorpecente ou substância que determine dependência física ou psíquica;
II – utiliza o local, de que tem a propriedade, posse, administração ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que a título gratuito, para uso ilegal de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica;
III – contribui de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica.
§ 4º As penas aumentam-se de um terço se a substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica é vendida, ministrada, fornecida ou prescrita a menor de vinte e um anos, ou a quem tenha, por qualquer causa, diminuída ou suprimida a capacidade de discernimento ou de autodeterminação. A mesma exasperação da pena se dará quando essas pessoas forem visadas pela instigação ou induzimento de que trata o n. I do § 3º.
§ 5º Associarem-se duas ou mais pessoas, para o fim de cometer qualquer dos crimes previstos neste artigo e seus parágrafos:
Pena – reclusão, de dois a seis anos, e pagamento de até trezentos e sessenta dias-multa.
§ 6º Nos crimes previstos neste artigo e seus parágrafos, salvo os referidos nos § § 1º, n. III, e 2º, a pena se o agente é médico, dentista, farmacêutico, veterinário ou enfermeiro, é aumentada de um terço.
§ 7º Nos crimes previstos neste artigo e seus parágrafos as penas aumentam-se de um terço se qualquer de suas fases de execução ocorrer nas imediações ou no interior de estabelecimento de ensino, sanatório, unidade hospitalar, sede de sociedade ou associação esportiva, cultural, estudantil, beneficente ou de recinto onde se realizem espetáculos ou diversões públicas, sem prejuízo da interdição do estabelecimento ou local.”
10Nesse sentido, conferir decisão recente sobre a inaplicabilidade do art. 28 ao crime militar (STF, HC n. 91767, 1ª Turma, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 04.09.2007). Ver também GORRILHAS, Luciano Moreira. O artigo 290 do Código Penal Militar (tráfico, posse ou uso de entorpecente) e a nova lei antidrogas, pp. 11-18; e ROCHA, Eduardo Biserra. O novo sistema de políticas sobre drogas e o art. 290 do COM. Aspectos relevantes, p. 29-34.
11Finalmente, a nova redação do art. 281 passou a ser a seguinte:
“I – importa ou exporta, vende ou expõe à venda ou oferece, fornece, ainda que a título gratuito, transporta, traz consigo ou tem em depósito, ou sob sua guarda, matérias-primas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica; (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
II – faz ou mantém o cultivo de plantas destinadas à preparação de entorpecentes ou de substâncias que determinem dependência física ou psíquica; (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
III – traz consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica; (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
IV – adquire substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
§ 2º Prescrever o médico ou dentista substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, ou em dose evidentemente maior que a necessária ou com infração do preceito legal ou regulamentar: (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
Pena – detenção, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa de 10 (dez) a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo vigente no País. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
§ 3º Incorre nas penas de 1 (um) a 6 (seis) anos de reclusão e multa de 30 (trinta) a 60 (sessenta) vezes o valor do maior salário mínimo vigente no País, quem: (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
I – instiga ou induz alguém a usar entorpecente ou substância que determine dependência física ou psíquica; (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
II – utiliza o local, de que tem a propriedade, posse, administração ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que a título gratuito para uso ilegal de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica; (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
III – contribui de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
§ 4º As penas aumentam-se de 1/3 (um terço) se a substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica é vendida, ministrada, fornecida ou prescrita a menor de 21 (vinte e um) anos ou a quem tenha, por qualquer causa, diminuída ou suprimida a capacidade de discernimento ou de autodeterminação. A mesma exasperação da pena se dará quando essas pessoas forem visadas pela instigação ou induzimento de que trata o inciso I do § 3º. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
§ 5º Associarem-se duas ou mais pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer qualquer dos crimes previstos neste artigo e seus parágrafos. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa de 20 (vinte) a 50 (cinquenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
§ 6º Nos crimes previstos neste artigo e seus parágrafos, salvo os referidos nos § 1º, inciso III, e 2º, a pena, se o agente é médico, dentista, farmacêutico, veterinário ou enfermeiro, será aumentada de 1/3 (um terço). (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971)
§ 7º Nos crimes previstos neste artigo e seus parágrafos as penas aumentam-se de 1/3 (um terço) se qualquer de suas fases de execução ocorrer nas imediações ou no interior de estabelecimento de ensino, sanatório, unidade hospitalar, sede de sociedade ou associação esportiva, cultural, estudantil, beneficente ou de recinto onde se realizem espetáculos ou diversões públicas, sem prejuízo da interdição do estabelecimento ou local, na forma da lei penal. (Redação dada pela Lei 5.726, de 1971) (Revogado pela Lei 6.368, de 1976)”
12V. GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos: prevenção e repressão: comentários à Lei 5.726, p. 34. Sobre as críticas da revogada Lei, consultar FRANCESCHINI, Jose Luiz Vicente de Azevedo. Tóxicos: aplicações da Lei 5.726, de 29 de outubro de 1971, pelo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, e sobre a análise jurisprudencial da época, ver GOMES, Geraldo. Os alucinógenos e a jurisprudência.
13V. sobre os comentários à revogada Lei 6.368/1976: GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos: prevenção e repressão: comentários à Lei 6.368, de 21-10-1976, acompanhados da Legislação vigente e de referência jurisprudencial, acrescida de novas emendas. Cf., entre outros: SILVA, Jorge Medeiros da. A nova lei de tóxicos explicada; CARVALHO, Hilário Veiga de; SEGRE, Marco. Tóxicos: comentários à recente Lei 6.368/76; SILVA, Edevaldo Alves de. Tóxicos FRANCESCHINI, Jose Luiz Vicente de Azevedo. Tóxicos: aplicações da Lei 5.726, de 29 de outubro de 1971, pelo Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo; BASAN, Pedro Mudrey. Tóxicos: a nova lei comentada; DELMANTO, Celso. Tóxicos; GOMES, Geraldo. Os alucinógenos e a jurisprudência; VIEIRA, João. O magistrado e a lei de tóxicos.
14A base da Lei 10.409 foi o denominado Projeto Murad (Projeto de Lei 1.873/1991), fruto das conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Narcotráfico de 1991, instaurada para investigação da Conexão Rondônia – rede de tráfico internacional existente na Amazônia. O projeto, portanto, adotou uma postura de recrudescimento, estabelecendo novos tipos penais, principalmente relacionados ao crime organizado e ao seu financiamento. Note-se que o projeto teve seu texto original readequado, influenciado que foi por outras propostas paralelas centradas na lógica da redução de danos. O resultado disso foi a distinção substancial do juízo de reprovação legal entre as condutas do porte para consumo pessoal e aquelas relacionados ao tráfico (tudo cf. CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo criminológico e dogmático, p. 61).
15Cf. GRECO FILHO, Vicente; RASSI, João Daniel. Tóxicos: prevenção-repressão, pp. XIII-XVI. Ver também: MARCÃO, Renato Flavio. Tóxicos: Leis n. 6.368/1976 e 10.409/2002 anotadas e interpretadas.
16GRECO FILHO, Vicente; RASSI, João Daniel. Tóxicos: prevenção-repressão, pp. XIII-XVI.
17Não recusamos a discutir a descriminalização de certas condutas e de certas drogas. Aliás, tivemos a honra de enviar algumas sugestões a respeito ao Senador Romeu Tuma, quando relator de um dos projetos que levou à lei comentada. Interpretar, contudo, que teria havido descriminalização geral chega às raias do ridículo. Seria importante, apenas, que as leis fossem elaboradas com mais cuidado, jurídico e redacional.
18Cf., a respeito, entre outros: MARCÃO, Renato Flavio. Nova Lei de Tóxicos: tribunais anulam processos em razão da não observância do procedimento novo, pp. 303-307; e FERRARI, Eduardo Reale. Nova lei de tóxicos: Ausência política preventiva e suas aberrações jurídicas, pp. 289-294.
19O dispositivo citado não encontra similar nas Constituições anteriores (v. BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários à Constituição do Brasil, p. 225). A Constituição de 1967 referia-se ao tráfico de entorpecentes ao dispor como competência da União, entre outras, organizar e manter a polícia federal com a finalidade de prevenir e reprimir o tráfico de entorpecentes e drogas afins (art. 8º, VIII, “b”) (v. MELLO FILHO, José Celso. Constituição Federal anotada, pp. 59 e s.).
20Cf. CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição de 1988, pp. 520 e s.
21Sobre o tema, conferir nossa obra GRECO FILHO, Vicente. Interceptação telefônica: considerações sobre a Lei 9.296, de 24 de julho de 1996.
22Registre-se nosso entendimento de que a possibilidade de interceptação a todos os crimes de reclusão precisa ser restringida, porque muito ampla. Conforme tivemos oportunidade de defender em comentários à Lei 9.296, “há muitos crimes punidos com reclusão que, de alguma forma, justificariam a quebra do sigilo das comunicações telefônicas, considerando-se especialmente o “furor incriminatório” de que foi tomado o legislador nos últimos anos e, em muitos casos, a desproporcionalidade da pena cominada. Há necessidade de se ponderar a respeito dos bens jurídicos envolvidos: não se pode sacrificar o bem jurídico da magnitude do sigilo das comunicações telefônicas para a investigação ou instrução de crime em que não estejam envolvidos bens jurídicos de maior valor” (Interceptação telefônica..., p. 22-23).
23Sobre a natureza a questão do bem jurídico preponderante no crime de lavagem de valores, e a conclusão que daí se tira quanto à prática da ocultação de bens ou valores pelo próprio agente que praticou o crime antecedente, consultar nosso artigo GRECO FILHO, Vicente. Tipicidade, bem jurídico e lavagem de valores in Direito penal especial, processo penal e direitos fundamentais: visão luso-brasileira, pp. 147-169.
24Cf. BADARÓ, Gustvao Henrique Righi Ivahy; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais, pp. 84-85.
25Várias são as críticas apontadas pela doutrina à chamada “Lei do Abate” que, inclusive, chega a considerá-la inconstitucional. Entre elas, pode ser mencionada a formulação pelo Decreto de conceitos abertos de aeronave suspeita e hostil, a imposição de medidas coercitivas drásticas, previstas em nosso ordenamento somente em caso de guerra declarada (art. 84, XIX, da CF), o que reforça a afirmação do modelo belicista de repressão às drogas adotado pelo Brasil etc. A inconstitucionalidade residiria, principalmente, no fato de o Decreto ter legitimado a pena de morte e previsto procedimento que afronta o princípio constitucional do devido processo legal (v., por todos, BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais, pp. 68-70). Em acréscimo, segundo afirma Ana Lúcia Ceolotto Guimarães, devido sua característica de mutação e fluidez, o tráfico de drogas não tem sido coibido pelo implemento da “Lei do Abate”. Noticia a autora que, se de um lado o número de voos não autorizados nas áreas fronteiriças com a Colômbia, o Peru e a Bolívia havia sido reduzido em mais de 60%, por outro, soube-se que a cocaína passou a ser levada diretamente da Colômbia para o Paraguai, onde os traficantes de drogas brasileiros passaram a controlar o tráfico de cocaína, lugar que, até então, limitava-se ao plantio de maconha. Do Paraguai passou a ingressar no território brasileiro por carros, caminhões e até por meio das “mulas”, cujo aumento de prisões aumentou consideravelmente no estado do Mato Grosso do Sul (GUIMARÃES, Ana Lúcia Ceolotto. A quem interessa a “lei do abate”, pp. 16-17).
26Sua última atualização foi pela RDC 103, de 31 de agosto de 2016 (cf. <www.anvisa.gov.br>, em legislações).
27“Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. (...)”
Referências
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Citação
GRECO FILHO, Vicente, RASSI, João Daniel. Histórico-drogas. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Penal. Christiano Jorge Santos (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/428/edicao-1/historico-drogas
Edições
Tomo Direito Penal, Edição 1,
Agosto de 2020