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Teletrabalho à luz dos objetivos de desenvolvimento sustentável
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Célio Pereira Oliveira Neto
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Tomo Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Edição 1, Agosto de 2020
O presente estudo tem por escopo demonstrar como o teletrabalho está em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), ao possibilitar o exercício de trabalho decente e ampliar a concretização de direitos fundamentais, além de servir ao desenvolvimento econômico e contribuir na preservação do meio ambiente para as gerações presentes e futuras.
Antes da Primeira Revolução Industrial, vivia-se em pequenos grupos, formados por famílias aglutinadas, que subsistiam da pesca, caça e pastoreio, tendo a terra como base da economia. Valia-se de energias renováveis, e o nascimento determinava a camada social a ser ocupada.
As diferentes revoluções industriais provocaram rupturas paradigmáticas não só no trabalho, mas no modo de viver do ser humano.
Primeiro, o homem sai de casa e vai para fábrica, depois as atividades migram em sua maior parte para o setor de serviços, e na incipiente Quarta Revolução Industrial, a perspectiva passa a ser de trabalho prestado por meio da telemática (comunicação e informática), inexistindo em grande parte das vezes necessidade da presença física do trabalhador.
A tecnologia permite, pois, a realização de atividades laborais longe das fábricas, em locais descentralizados, possibilitando o retorno do homem ao lar, gerando maior aproximação com o núcleo familiar.
Diversas são as vantagens para trabalhador, empresas e sociedade, e a principal delas é que ganha o ecossistema, tão castigado e esquecido ao longo das diferentes revoluções industriais.
A tentativa de resgate da deteriorada relação do homem com o meio ambiente é recente, e tem importante marco na Conferência de Estocolmo em 1972, mesmo ano do relatório “Os Limites do Crescimento Econômico”.
No ano de 2000 foi firmado o Pacto Global, e em 2015 a Agenda 2030 que consigna 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável pretendendo oferecer um lugar melhor para as gerações presentes e futuras.
Embora haja muito a descrever, o espaço aqui concedido a tanto não autoriza, de sorte que sucintamente, passa-se a demonstrar as transformações nas relações do trabalho, para em seguida tratar de aspectos do teletrabalho, e ao final apresentar o quanto o regime de trabalho à distância pode contribuir para o cumprimento de parte importante dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, elencados pela Organização das Nações Unidas, em sua Agenda 2030.
1. Transformações nas relações de trabalho
1.1. As primeiras Revoluções Industriais
Na Inglaterra, aproximadamente em 1760, tem início a Primeira Revolução Industrial, que se caracteriza pela máquina a vapor e incremento da produção têxtil, extinguindo a economia do tipo feudal e inserindo a fábrica na vida das pessoas.
Ocorre aqui uma primeira ruptura, caracterizada pela separação das famílias, haja vista que o gênero masculino deixa de realizar as suas atividades laborativas no lar e passa a exercê-las na fábrica.
Nasce, pois, o homem-ferramenta, pois na medida em que a ferramenta passa a representar a extensão da mão do homem, para não dizer a sua própria personalidade, afinal a identificação se dava a partir da atividade laborativa. O carpinteiro não só fazia mesas, se fazia carpinteiro.1
A ruptura não para por aí. Há a inserção do empresário como detentor do comando. O poder de mando, outrora concentrado no patriarca, passa a ser exercido fora dos lares por meio do detentor do capital, surgindo o poder diretivo,
dando início à dependente relação entre trabalho e capital.
Esse cenário propicia o surgimento de grandes empreendimentos fabris, que passam a dominar o cenário, do que é exemplo a fábrica de Owen na Escócia, que em 1804 possuía 3000 empregados.
A Segunda Revolução Industrial insere a figura do homem-máquina, que se torna dependente e substituível, em cenário de produção massificada, em meio a uma sociedade que cada vez mais se valia de energias não renováveis, tais como carvão de pedra, gás e petróleo.
A administração da produção se dava com base nas técnicas de Frederick Winslow Taylor, que entendia pela padronização do trabalho, havendo uma ferramenta e uma maneira ideal para cada tarefa – método utilizado por Henry Ford, que inseriu a administração conjunta de tempos e movimentos.
A hierarquia era piramidal, atuando o trabalhador no chão da fábrica, de modo totalmente subordinado, na realização de tarefas repetitivas, enfadonhas e cronometradas.
Para se ter uma ideia, em Itália, os trabalhadores da fábrica Alfasud demoravam 75 segundos para realizar um movimento que se repetia 384 vezes ao longo de 8 horas de trabalho.2
A ótica era, pois, da repetição, de sorte que o período ficou marcado pela produção em série e homogênea, perpetuando a frase de Ford: “Os americanos podem ter carros de qualquer cor. Desde que seja preta.” Para se ter uma ideia, a partir de 1908, o Ford modelo T chegou a ser produzido mais de 16 milhões de vezes com mínimas variações.3
O capital necessitava cada vez mais do trabalho, em um panorama de “contratos para sempre”, onde se ouvia: “meu pai trabalhou nesta fábrica, eu trabalho, e se Deus quiser, você também trabalhará, meu filho!”
O curioso é que o grande prêmio após décadas de trabalho para a mesma empresa, era um relógio que continha o símbolo da empresa. Não se percebia que o relógio representava a prisão da sociedade, que funcionava em torno dos horários e diretrizes da fábrica.4
O tempo certo de acordar, dormir e levar os filhos para a escola era ditado pelo relógio da fábrica. Por sinal, as escolas não preparavam cidadãos autônomos e criativos, mas obedientes e disciplinados, prontos a apresentar-se no horário acordado e executar tarefas repetitivas.5
A ótica era da concentração, o que fez surgir grandes cidades. Londres passou de 800 mil habitantes em 1800, para 7 milhões em 1910; Nova Iorque saiu de 60 mil para mais de 4 milhões de habitantes no mesmo período.6 Nessa linha de agrupamento, a General Motors chegou a contar com 595 mil trabalhadores e a AT&T com 736 mil empregados.7
Produzia-se, no entanto, mais do que o necessário para o consumo. Tanto assim o é que Alvin Toffler ensina que a sociedade consumista não é fruto do capitalismo, mas do industrialismo.8
O modelo de produção da Segunda Revolução se tornou insustentável, causando sérios danos ao planeta, havendo movimento migratório de indústrias para países em desenvolvimento, tal como o Brasil, onde se observou a instalação do Parque Industrial do ABC na década de 1950.9
A Terceira Revolução Industrial é marcada pelo ciclo do computador a partir de 1960 mediante o uso dos mainframes, e no início da década de 1970 com a computação pessoal, em uma integração entre ciência e produção.
Ocorre um salto tecnológico, provocado pela automação e robótica, e ainda, democratiza-se o uso do computador, mediante barateamento dos produtos.
O modelo de produção de Ford, onde um homem era responsável por uma máquina, em que a fábrica produzia a grande maioria dos insumos e componentes, passa a ser substituído pelo novo paradigma trazido pelo engenheiro Ohno da Toyota, e outras montadoras japonesas.10
Insere-se, pois, o operador multifuncional, investindo-se em treinamento e qualificação para que um homem passe a ser responsável por diversas máquinas, operando-as ao mesmo tempo, aumentando com isso a produtividade e a qualidade.
A nova forma de produção começa a suavizar as hierarquias, diante da ampliação da responsabilidade de um operador mais especializado para além de uma máquina, combinada com a inserção dos Círculos de Controle de Qualidade (CCQ) por meio dos quais o trabalhador oferecia sugestões e contribuições.
Implanta-se também o engajamento coletivo, decorrente de um sistema de vigia coletiva, fruto de premiação também coletiva, afinal se um operador não cumprisse seu mister, comprometeria o resultado a ser distribuído a todos os integrantes daquele grupo.
A fábrica passa a segmentar e fracionar a produção, terceirizando boa parte dos componentes. Para efeito comparativo, a Ford chegou a ter navio para transportar os seus carros, assim como floresta de seringueira para produzir pneus, de sorte que 75% das peças utilizadas nos veículos eram geradas internamente; ao passo que o modelo japonês inverte a operação, passando a conviver com empresas satélites e outras fornecedoras que respondiam pelos mesmos 75% das peças, cabendo à produção interna das montadoras somente 25% dos componentes.11
Também diferentemente do modelo adotado por Ford, a produção toma por base o interesse do consumidor, e o estoque fica atrelado às vendas, produzindo-se somente o necessário.
Ao menos quatro consequências importantes são geradas pela nova forma de produção: a) maior produtividade; b) desemprego estrutural gerado pela maior produtividade c) terceirização; e d) migração de empregos para empresas menores.
Acresça-se ainda que a fábrica perde parte da importância, se comparada à relevância que teve durante a Primeira e Segunda Revoluções Industriais.
1.2. Cenário atual
Diante das transformações até então vividas, o cenário atual apresenta um mundo globalizado, composto em sua essência – ao menos no que se refere à geração de empregos – por pequenas e médias empresas, em sistema de produção fragmentado em meio a uma sociedade que funciona em rede.
As empresas se tornaram voláteis, e não mais um porto seguro onde o trabalhador ancora as suas esperanças com a intenção e na expectativa de contratos “para sempre”.
O próprio trabalhador parece não desejar depositar os seus propósitos em uma só empresa, preferindo mover-se, conhecer novas corporações, atender diferentes empregadores,12 para não dizer prestar as suas atividades laborativas sem a vinculação a um contrato de emprego.
Se no recente passado, junto com a prestação do serviço poderia ser cobrada a entrega da dignidade, o novo trabalhador tem muito mais consciência e não se despe de seus direitos personalíssimos no curso de uma relação de emprego.
Isso porque a reverberação dos valores constitucionais da dignidade da pessoa humana (princípio maior das constituições contemporâneas democráticas) tornou comportamentos de assédio inaceitáveis, seja sob a ótica da moral, seja do direito.
O novo trabalhador, especialmente das gerações Y e Z (estes últimos incipientes no mercado de trabalho) possui consciência mais aprimorada, e não atrela a busca da felicidade às conquistas profissionais e financeiras da maneira como o faziam os baby boomers ou a geração X.
Nas empresas, a seu turno, há relativização da subordinação, inexistindo a mesma preocupação de outrora com o número de horas trabalhadas, mas com a qualidade e produtividade.
Perde sentido, pois, o mesmo controle do tempo, empoderando a administração por resultados. Tal transformação bem se coaduna com as novas gerações que têm o empreendedorismo na sua forma de ser, e a informação a um clique.
Informação que, por sinal, apresenta-se como o ativo do momento. Antes da Primeira Revolução Industrial, o acesso a conteúdo informativo era privilégio dos nobres, entretanto, com a massificação da produção, houve necessidade de exponencial crescimento do alcance da informação, que não era dirigida, mas também necessariamente massificada.
O momento atual, contudo, é de informação dirigida, em um processo de individualização da informação. Segundo explica Nicholas Negroponte,
“parte-se de um grupo grande para um grupo pequeno; depois, para um grupo menor ainda; por fim, chega-se ao indivíduo. Quando você tiver meu endereço, meu estado civil, minha idade, minha renda, a marca do meu carro, a lista de compras que faço, o que costumo beber e quanto pago de imposto, você terá a mim: uma unidade demográfica composta de uma só pessoa.”13
Se no início da Terceira Revolução Industrial, a comunicação à distância, quando escrita, ocorria por carta e telex; a atual é eletrônica, instantânea, em uma sociedade conectada em rede, em que tudo fica na nuvem, inclusive nossas memórias.
“A era até então vivida era do hardware, em que tudo era sólido e pesado, e a nova é representada pelo software, em que a internet de todas as coisas torna a viagem imediata, o espaço pode ser atravessado, literalmente, em tempo nenhum, cancela-se a diferença entre longe e aqui.”14
Se no passado recente, o universo era coisificado, os dias atuais representam a consagração da descoisificação diante da forma virtual de produção da informação.
Algoritmos fazem aparecer diferentes mundos e hologramas. Dados e imagens não podem ser agarrados com as mãos, mas não só são compreendidos, como provocam sentimentos dos mais reais.
O homem se torna um dependente eletrônico, e a existência passa a ser um espetáculo, a ser compartilhado nas redes sociais, onde não ao acaso, o céu do facebook é azul,15 afinal neste lugar todos são heróis e contabilizam suas conquistas.
O ambiente virtual provoca importantes câmbios, da escrita para o dígito; do conceito para a imagem; e a clássica noção de liberdade passa a ser virtual, sem limitação física e desmaterializada, onde o acesso de um não exclui o do outro.16
O ambiente é de compartilhamento, inserindo-se o direito ao livre convívio eletrônico. A privação da comunicação aparece como negação do ser, especialmente quando se trata das novas gerações, mormente a geração Z que já nasceu conectada.
As transformações nas relações do trabalho autorizam as seguintes conclusões: (a) o câmbio do capitalismo pesado, caracterizado por sedes portentosas e bens materiais, pelo capitalismo leve, onde a propriedade imaterial passa a representar o ativo de maior valor; (b) parte das organizações passam do modelo piramidal para o paradigma das corporações horizontalizadas, onde o trabalhador goza de muito mais autonomia;
No que se refere à forma de prestação do trabalho, destacam-se as seguintes transformações: (a) no lugar da monotonia própria das tarefas repetitivas, insere-se ambiente que requer criatividade e constante adaptabilidade do trabalhador aos novos modelos; (b) mitiga-se a subordinação, ampliando-se a autonomia; (c) a jornada qualitativa passa a ser muito mais importante do que a quantitativa; (d) a libertação do relógio da fábrica, quando em regime de teletrabalho, o que permite maior autogerenciamento, consoante será abordado no tópico próprio.
1.3. A incipiente quarta Revolução Industrial
A Feira de Hannover, em 2012 na Alemanha, pode ser apresentada como marco da Indústria 4.0 ou Quarta Revolução Industrial, como queiram.
Para se ter uma noção da dimensão das mudanças próprias desta nova revolução, vale mencionar os assuntos que tomaram a pauta do Fórum Econômico de Davos em 2017: nanotecnologias, neurotecnologias, biotecnologia, robôs, inteligência artificial, drones, sistemas de armazenamento de energia e impressão 3D.
Mantendo-se em Davos, em 2018, a pauta voltou-se à criação de um futuro compartilhado em um mundo fragmentado, tendo como centrais os debates nas áreas de economia, ciber segurança e meio ambiente.
Em 2019, o Fórum Econômico de Davos incluiu a Quarta Revolução Industrial desde o seu título principal: “Globalização 4.0: moldando uma arquitetura global na era da quarta revolução industrial”, focando debates em criptoativos, potencial tecnológico, segurança e ambientes regulatórios.
Todas as transformações ocorridas desde a Primeira Revolução Industrial, se colocadas em uma escala de tempo, levaram mais de dois séculos e meio.
No entanto, a incipiente Quarta Revolução Industrial, mediante a combinação dos mundos digital, físico e biológico, tem potencial de modificar o modo de viver, trabalhar e até de ser em velocidade jamais presenciada.17
Para efeito comparativo, veja-se que o tear mecanizado demorou 120 anos para conquistar a Europa, enquanto a internet dominou o mundo em 10 anos.18
Um tablet atual possui a capacidade de 5000 computadores de 30 anos atrás, ao passo que o custo do armazenamento caiu de 10 dólares para 3 cents nos últimos 20 anos.19
O blockchain tende a ser responsável por 10% do produto interno bruto (PIB) mundial no curto espaço de 10 anos,20 provocando transformações e adaptações nos serviços bancários. Por sinal, a moeda virtual ganha força, tendo alcançado exponencial valorização em especial no ano de 2017,21 do que é exemplo o bitcoin.
A impressão 3D deve ser responsável por 5% dos produtos consumidos no mundo nos próximos anos. Na China, já há um edifício impresso com 6 andares. A previsão é de que seja produzido o primeiro carro em 3D até o ano de 2025,22 havendo notícia de que a impressão em 3D dobrará de tamanho a cada ano.23
As cobiçadas marcas alemãs de automóveis estão ameaçadas por empresas de tecnologia, tais como Google, Apple, Amazon e Tesla, afinal tudo passa a ser tecnologia embarcada.24
Por falar em carros, não só estes, como também outros meios de transporte devem ser autônomos, dispensando a presença do motorista, em um cenário de mercado uberizado, que faz uso de tecnologias disruptivas em economias de plataforma.
O crescimento do uso da inteligência artificial tende a eliminar postos de trabalho repetitivos. É certo que muitas profissões serão extintas, constando no topo da lista as atividades de bancário, check in em companhias aéreas, entregadores, motoristas, árbitros, agentes de viagem, telemarketing, operadores de produção, dentre outros.25
De uma forma ou outra, todas as profissões existentes serão impactadas, tanto que as faculdades estão revendo programas e conceitos, na busca da formação de um profissional multidisciplinar e de fácil adaptabilidade.
Se o modelo adotado pela Toyota e outras montadoras japonesas, ao inserir o operador multifuncional, colaborou fortemente para o desemprego estrutural, o que pensar de uma capacidade de ampliação de produtividade em velocidade exponencial?
Valendo-se do método comparativo, percebe-se que em 1990 as 3 maiores montadoras da Capital do automóvel (Detroit) geravam receita de 250 bilhões de dólares ao ano, produzindo 1,2 milhão de empregos; ao passo que as 3 gigantes de tecnologia do Vale do Silício atualmente têm receita anual de 1,09 trilhões de dólares, gerando, no entanto, somente 137 mil empregos.26
O cenário tem sido denominado de VUCA: volatility (volátil ante o ritmo acelerado das mudanças), uncertainty (incerto, já que todo conhecimento está incompleto, o que se relaciona diretamente com a complexidade), complexity (complexo diante do acesso a muitas informações ao mesmo tempo) e ambiguity (ambíguo diante da dificuldade de estabelecer os diferentes pontos de vista resultantes dessas relações tão complexas), o que requer vision (visão), understanding (compreensão), clarity (clareza) e agility (agilidade).
O cenário VUCA, diante do acesso ilimitado a informações, faz com que se estabeleça a diferença entre saber e inteligência, afinal o que fazer com a informação disponível, e ainda antes qual informação deve ser considerada.
Zygmunt Baumann leciona: “num mundo em que coisas deliberadamente instáveis são a matéria prima das identidades, que são necessariamente instáveis, é preciso estar constantemente alerta; mas acima de tudo é manter a própria flexibilidade e a velocidade de reajuste em relação aos padrões cambiantes lá fora”.27
Inexorável que as transformações ocorridas e as que estão por vir conduzem à alteração da forma de gestão, impondo ao empresário uma administração mais voltada aos resultados, onde há o câmbio da repetição e rotina pela variação e adaptabilidade.
Todas essas mudanças provocaram a atuação do legislador brasileiro, que por meio da Lei 13.467/2017, conhecida como Reforma Trabalhista – ainda que com imprecisões e sem o devido diálogo - procurou trazer um pouco de oxigenação para as relações do trabalho.
Exemplos dessa tentativa – ainda em fase embrionária de aplicação - podem ser encontrados na autonomia negocial dada às partes, na prevalência do princípio da especificidade, na instituição da modalidade de banco de horas individual, na ampliação do labor em regime de tempo parcial, no caráter da premiação vinculada a desempenho superior ao ordinário, na segurança jurídica dada à terceirização, e no que interessa ao presente estudo, em especial, nos regramentos dados para o teletrabalho.
O ambiente de criatividade, autogerenciamento e remuneração por resultados, muito bem se adequa ao regime de teletrabalho, que por sinal colabora significativamente para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável traçados pela Organização das Nações Unidas como meta para o ano de 2030, consoante se passa a abordar na sequência.
2. Teletrabalho e o cumprimento dos ODS
2.1. Desenvolvimento sustentável
Como foi possível perceber, ao longo das diferentes revoluções industriais o homem fez uso de fontes de energia não renovável, assim como castigou o planeta mediante ampliação do volume de poluentes.
Com essa visão, em 1972, já no curso da Terceira Revolução Industrial, realizou-se a Conferência de Estocolmo, cuja temática estava voltada ao reaprendizado do homem no convívio com o planeta - (UN Conference on the Human Environment).
No mesmo ano, o Clube de Roma – sob a coordenação de professores do Massachusetts Institute of Technology – publicou o relatório denominado “Os Limites do Crescimento Econômico”.
Contudo, o desenvolvimento sustentável só ganhou status de principal ator quando, em 1987 a Organização das Nações Unidas (ONU) – por meio da presidente da Comissão Mundial para o Meio Ambiente, a médica Gro Harlen Brundtland – apresentou o relatório “Nosso Futuro Comum”.
Na definição do relatório, “Desenvolvimento sustentável é aquele que busca as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender suas próprias necessidades.”
Em 1992, o Brasil sediou a primeira conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida por Rio 92.
As empresas preocupadas com o meio ambiente adotaram o conceito Triple Botton Line (3P, People, Profit, Planet), criado por John Elkington, em 1994, que prevê 3 dimensões para a sustentabilidade: Social, Econômica e Ambiental.
No ano de 2000, em Nova Iorque, foi lançado o Pacto Global,28 que advoga 10 princípios universais, derivados da Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), da Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção.29
Embora sejam transversais e interajam, por questão didática os 10 princípios foram divididos nas áreas de: Direitos Humanos; Trabalho; Meio Ambiente; e Anticorrupção, visando assegurar o crescimento econômico, observados interesses dos demais atores sociais, em especial empregados, investidores, consumidores e a comunidade em geral.
O ano de 2000 também foi marcado pelo estabelecimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM): 1) acabar com a fome e a miséria; b) educação básica de qualidade para todos; 3) igualdade entre sexo e valorização da mulher; 4) reduzir a mortalidade infantil; 5) melhorar a saúde das gestantes; 6) combater a aids, a malária e outras doenças; 7) qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; 8) todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento.30
Em 2002, na África do Sul foi realizada a Conferência Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, também conhecida como Rio+10. Na ocasião, foi reafirmado o compromisso com o desenvolvimento sustentável e seus três pilares: desenvolvimento econômico, ambiental e social.31
Em 2012, o Brasil voltou a ser protagonista ao sediar a Conferência Rio +20, tendo dois temas como centrais: a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza; e a estrutura institucional para o desenvolvimento sustentável.32
Em 2015, líderes mundiais se reuniram na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), com o objetivo de constituir uma agenda global voltada à edificação de um mundo sustentável.
A partir de consulta popular, e com o olhar voltado aos ODM, foi constituída a Agenda 2030, mediante a adoção de 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que visam pela ordem: 1) erradicação da pobreza; 2) fome zero; 3) boa saúde e bem-estar; 4) educação de qualidade; 5) igualdade de gênero; 6) água limpa e saneamento; 7) energia acessível e limpa; 8) emprego digno e crescimento econômico; 9) indústria, inovação e infraestrutura; 10) redução das desigualdades; 11) cidades e comunidades saudáveis; 12) consumo e produção responsáveis; 13) combate às alterações climáticas; 14) vida de baixo d’água; 15) vida sobre a terra; 16) paz, justiça e instituições fortes; 17) parceria em prol das metas.33
Os objetivos traçados têm caráter uno e indivisível, integrando as dimensões econômica, social e ambiental em prol do desenvolvimento sustentável.
Em que pese as diversas ações, permanece o cenário de maus tratos com o globo terrestre, fazendo-se mister revisitar a relação do homem com o meio ambiente, alterando posturas empresarias no passado voltadas unicamente ao lucro, conformando-as para uma relação mais solidária e humanista, demonstrando preocupação com as gerações presentes e futuras.
Imperiosa, pois, a adoção de práticas empresariais de respeito ao meio ambiente, neste inserido o meio ambiente do trabalho, assim como cogente que a atuação governamental esteja voltada à preservação ecossistema.
O teletrabalho, dada a sua principal característica, de ser prestado de modo descentralizado da empresa, portanto não presencial, cujo resultado é entregue por meio da telemática (comunicação e informática) empodera o trabalhador na gestão do tempo e rotinas de trabalho, além de servir ao propósito de um mundo mais sustentável, seja sob o aspecto da prestação de um trabalho mais humano, seja pelo prisma ambiental, consoante se passa a abordar.
2.2. Teletrabalho
O teletrabalho teve o seu primeiro momento de desenvolvimento nos anos de 1970, quando diante da crise do petróleo, Jack Niles24 propôs deslocar o trabalho até as pessoas, invertendo a logística da prestação das atividades laborativas.
Teletrabalho é trabalho à distância, prestado de modo descentralizado, fora da sede da empresa, mediante uso prevalente de equipamentos de telemática (comunicação e informática), e com jornadas flexíveis.
No conceito da Organização Internacional do Trabalho (OIT), trata-se de “forma de trabalho efetuada num lugar diferenciado do escritório central ou do centro de produção e que implica nova tecnologia que permite a separação e facilita a comunicação”.35
Portanto, qualquer trabalho prestado à distância, cujo resultado seja entregue por meio da comunicação e informática, seja ele desenvolvido em casa, em coworking, em sala alugada, em cyber café ou em telecentros – para citar apenas alguns exemplos – é teletrabalho.
O teletrabalho gera a desterritorialização do trabalho, desmaterialização da produção, além da diminuição da fronteira entre o privado e o profissional, mormente quando as atividades são realizadas no domicílio do trabalhador, por meio da telemática.
Pode ser realizado em regime full time quando a integralidade das atividades é prestada à distância; part-time quando somente uma parte das atividades de trabalho é prestada neste regime, tais como algumas vezes por semana, ou em meio expediente; ou ocasional, quando eventualmente a prestação se dá na forma de teletrabalho.
Alerta-se, no entanto, para os termos da Lei 13.467, conhecida como Reforma Trabalhista, que reconhece o regime de teletrabalho no art. 62, inciso III da CLT, para efeito de isenção de controle de jornada somente quando prevalecer o trabalho à distância. Logo, teletrabalho part time ou ocasional não está inserido na exceção legal de controle de jornada.
Embora conceitualmente o trabalhador externo esteja em regime de teletrabalho quando atua por meio da telemática, este já tem a sua previsão de isenção de controle no art. 62, inciso II da CLT, não se aplicando a regra do inciso III da CLT.
Assim, o fato de a Reforma Trabalhista excluir o trabalho externo do enquadramento de teletrabalhador para os efeitos legais, não altera o conceito, apenas a aplicação legal.
Por sinal, teletrabalho não é exclusividade de uma relação de emprego, podendo ser desenvolvido por empresário, autônomo, prestador de serviços e, claro, por empregado.
Teletrabalhador é, pois, aquele que exerce o trabalho à distância mediante o uso prevalente das ferramentas da telemática, seja em que condição for. Por lógica, quando se trata de empregado, utiliza-se o termo teletrabalho subordinado.
Os números do setor crescem globalmente, já representando 10% dos trabalhadores de todo o mundo diariamente. A título exemplificativo, mais da metade dos indianos laboram em regime de teletrabalho, e 34% da população da Indonésia.
Nos Estados Unidos da América eram 3 milhões em 1990, passando para 10 milhões em 1997, e atualmente estão abrangidos mais de 70 milhões de trabalhadores37, diante do forte impulso que o trabalho à distância por meio da telemática recebeu após os atentados de 11 de setembro de 2001.
Segundo a Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (SOBRATT), em terras nacionais eram mais de 10 milhões em 2008, e atualmente estima-se contingente de mais de 15 milhões de teletrabalhadores.
O teletrabalho tem o condão de propiciar diversas vantagens para os teletrabalhadores, contratantes e a sociedade de um modo geral, servindo ao propósito de cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, da Organização das Nações Unidas, consoante se passa a abordar.
2.3. Contribuição do teletrabalho para os ODS – relação de trabalho
A inclusão digital é um meio de exercício da cidadania, diretamente atrelada à dignidade da pessoa humana, tal como prevê a Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) e a Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados).
O ODS 9, que em seu item 9.c., almeja: “Aumentar significativamente o acesso às tecnologias de informação e comunicação e se empenhar para oferecer acesso universal e a preços acessíveis à internet nos países menos desenvolvidos, até 2020.”
A falta de acesso à informação produz analfabetos sociais, que ficam alijados de combustível representado pela informação.
Veja-se que o teletrabalho é entregue por meio das tecnologias da comunicação e informática, normalmente fazendo uso da internet. Logo, de início já se percebe que a própria tecnologia envolvida na prestação do trabalho descentralizado já se encontra em conformidade com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, propiciando o acesso à informação.
Em linha semelhante, e de maneira ainda mais atrelada à telemática, ao tratar da igualdade de gênero no item 5, o ODS 5.b. pretende “Aumentar o uso de tecnologias de base, em particular as tecnologias de informação e comunicação, para promover o empoderamento das mulheres.”
Nada mais justo do que corrigir um desvio de curso na história, na medida em que as primeiras revoluções industriais, no início tiraram os homens de suas casas, em direção às fábricas, e somente depois recrutaram as mulheres – dando origem a essa diferenciação remuneratória e de cargos mais elevados ocupados pelo gênero masculino, que até hoje persiste no mercado de trabalho, inobstante as mulheres deterem igual competência e foco em suas atividades.
Aproveitando que se está a tratar do gênero feminino, vale observar a costumeira rescisão de contratos de emprego ao final da estabilidade gestante, como se a profissional de um momento para outro não detivesse a mesma aptidão e importância.
Esta cultura perniciosa pode ser combatida com o teletrabalho, que permite às mulheres conceder a atenção ao bebê nos seus primeiros meses de vida, para além da licença maternidade, sem ficar de fora do mercado de trabalho.
Certamente, pois, que o teletrabalho permite a ampliação do convívio da mãe com o recém-nascido (inclusive adotado) e até mesmo possibilita que a criança seja amamentada por mais tempo.
Soma-se que na sociedade contemporânea as tarefas domésticas e de cuidados com os filhos têm a efetiva participação do gênero masculino, que também tem a condição de prestar o trabalho à distância sem a necessidade de deslocamento à sede da empresa, contribuindo com a unidade familiar.
No que tange à inclusão do portador de deficiência, é fato que ainda inexiste infraestrutura adequada nas edificações, o que se soma às dificuldades no deslocamento. Assim e considerada desnecessidade de deslocamento do regime de teletrabalho, percebe-se a relação com o ODS 10, que trata da Redução das Desigualdades, em especial item 10.2: “Até 2030, empoderar e promover a inclusão social, econômica e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência, raça, etnia, origem, religião, condição econômica ou outra.”
Essa mesma leitura vale para a manutenção e/ou obtenção de emprego para o responsável por cuidar de pessoa enferma, debilitada ou de idade avançada, haja vista que o trabalho poderá ser realizado à distância, mantendo-se os cuidados com a pessoa que necessita de cuidados específicos.
De igual sorte, o portador de doença infectocontagiosa poderá prestar o trabalho à distância, por meio da comunicação e informática. Nota-se, pois, que há maior inclusão em todas as situações supra mencionadas, atrelando-se diretamente ao cumprimento do ODS 10.
Quanto ao trabalho decente de que trata o ODS 8, permite-se conjugá-lo com o ODS 3, Saúde e Bem-Estar, que intenta: “Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades.”
O teletrabalho permite a maior concreção de direitos fundamentais ao possibilitar a prestação das atividades alforriado do relógio da fábrica, de acordo com o biorritmo do trabalhador, que tem liberdade de horários, sendo senhor do seu tempo e organização.
Para Domenico de Masi, a jornada cumprida em 8 a 10 horas na empresa, pode ser realizada em 4 ou 5 horas em casa, haja vista que inexistem as mesmas interrupções do ambiente físico da corporação.38
Acresça-se o tempo que é poupado na ausência de locomoção à empresa, podendo usar este período em prol da ampliação do convívio familiar, ou mesmo em prol de atividades que ofereça prazer ou aperfeiçoamento, até porque o teletrabalhador não sofrerá com o desgaste de horas em trânsito, mormente nas grandes metrópoles.
Todas essas vantagens, sem dúvida, contribuem para o alcance do propósito da felicidade, de que trata a Declaração de Independência dos Estados Unidos, (pursuit of hapiness39).
O rol de vantagens para as empresas também é estimulante, a começar pela retenção de talentos, aumento da produtividade e criatividade, e isso com trabalhadores menos desgastados.
Por sinal, o aumento da produtividade está previsto no ODS 8, que trata do Trabalho Decente e Crescimento Econômico, particularmente em seu item 8.2: “[a]tingir níveis mais elevados de produtividade nas economias por meio da diversificação, modernização tecnológica e inovação, inclusive por meio de um foco em setores de alto valor agregado e dos setores intensivos em mão de obra”.
O teletrabalho também permite redução do absenteísmo e do trabalho ocioso, assim como mitiga os riscos de acidente de trajeto, que além de danos ao Erário (só em 2013, foram gastos 2,3 bilhões somente com auxílios decorrentes de acidentes de trajeto)40 e especialmente à saúde do trabalhador, sob o viés econômico implica na perda, ainda que temporária da força de trabalho, além de gastos com os 15 primeiros dias de afastamento.
A economia direta pelas empresas pode ser significativa, já que inexiste a necessidade da mesma estrutura física, o que compreende redução de salas, mobiliário, transporte, serviços de apoio e até mesmo do cafezinho.
Isso sem falar na possibilidade de as empresas contratarem trabalhadores em qualquer parte do mundo, recebendo o resultado das atividades de modo instantâneo.
No que se refere ao trabalho decente e crescimento econômico, o ODS 8 almeja: “Promover o crescimento sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas e todos.”
Quando se reflete acerca do crescimento sustentado e sustentável, percebe-se que o Poder Público pode e deve voltar-se, assim como as empresas, à implementação de telecentros em cidades dormitórios, a fim de evitar o deslocamento de milhares de trabalhadores diariamente para grandes centros.
O incentivo ao regime de teletrabalho se atrela ao ODS 12, que trata de Consumo e Desenvolvimento Sustentável, em especial, item 12.8, “até 2030, garantir que as pessoas, em todos os lugares, tenham informação relevante e conscientização para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida em harmonia com a natureza.”
2.4. Contribuição do teletrabalho para a sociedade
Diante da desnecessidade de deslocamento ao trabalho, por evidente há redução do número de pessoas transitando nas vias públicas, o que por consequência, amplia a possibilidade de melhora da segurança pública.
Logo, de modo inequívoco se cogita da redução aos riscos da violência urbana, o que bem se relaciona com o ODS 16, que trata da Paz, Justiça e Instituições Eficazes, almejando em seu item 16.1, “[r]eduzir significativamente todas as formas de violência e as taxas de mortalidade relacionada em todos os lugares”.
No que tange às parcerias e meios de implementação, tratada no item 17, o ODS 17.7 persegue: “[p]romover o desenvolvimento, a transferência, a disseminação e a difusão de tecnologias ambientalmente corretas para os países em desenvolvimento, em condições favoráveis, inclusive em condições concessionais e preferenciais, conforme mutuamente acordado”.
Veja-se que o ODS em questão possui correspondência com o teletrabalho, na medida em que o desenvolvimento das atividades à distância, sem o deslocamento à sede, permite a redução de poluentes, além da diminuição de consumo de fontes de energia não renovável, não só relativa aos veículos que deixam de transitar, mas também os que não ficarão parados em longos congestionamentos.
A gestão sustentável de recursos, por sinal, guarda total correspondência com o ODS 12, que trata de Consumo e Produção Responsáveis, almejando, em seu item 12.2: “até 2030, alcançar a gestão sustentável e o uso eficiente dos recursos naturais”.
As vantagens da sociedade vão além, na medida em que, com o teletrabalho pode-se promover o desenvolvimento de regiões menos favorecidas e inclusive melhor organizar o território, o que se relaciona diretamente com o ODS 11 que trata de Cidades e Comunidades Sustentáveis, em seu item 11.7.a.: “[a]poiar as relações econômicas, sociais e ambientais positivas entre áreas urbanas, periurbanas e rurais, reforçando o planejamento nacional e regional de desenvolvimento.”
O ODS 4 trata da Educação de Qualidade, almejando a construção e ampliação de instalações físicas que proporcionem ambiente de aprendizagem seguro e não violento. Há de se verificar o target, e não o meio, de modo que o ambiente virtual pode contribuir para o alcance da meta, já que diante das dificuldades financeiras e operacionais, o ensino e capacitação podem ser ampliados mediante o uso de canais virtuais, cumprindo ao objetivo de maior inclusão.
Acresça-se o item 8.6 do ODS 8, que trata de Trabalho Decente e Desenvolvimento Econômico, pretendendo, “[a]té 2020, reduzir substancialmente a proporção de jovens sem emprego, educação ou formação”.
Sem embargo de que boa parte da população não dispõe de recursos tecnológicos, em que pese a inclusão digital figure como meta, vale a reflexão sobre a possibilidade de redução de deslocamentos, ao menos de professores.
Isso sem falar na possível ampliação do contingente de professores qualificados por cursos à distância, inclusive por meio de cooperação internacional, atingindo assim o escopo do item 4.c.: “[a]té 2030, substancialmente aumentar o contingente de professores qualificados, inclusive por meio de cooperação internacional para a formação de professores, nos países em desenvolvimento e pequenos Estados insulares em desenvolvimento.”
3. Considerações finais
Os grandes desafios na embrionária, mas já acelerada Quarta Revolução Industrial, serão cumprir o ODS 8, que trata de trabalho decente e crescimento econômico.
O teletrabalho, dadas as suas características de prestação fora da sede central, sem o mesmo controle do gestor, representa o empoderamento do trabalhador, diante da autogestão do tempo e métodos de trabalho, que possibilita inclusive maior aproximação com o núcleo familiar.
Tal como visto, as vantagens do teletrabalho são inúmeras destacando-se a maior inclusão do portador de deficiente ou de doença infectocontagiosa, que bem demonstra o quanto o teletrabalho está apto para contribuir com o trabalho decente e inclusivo.
Por sinal, o mesmo se diga quanto às condições de colaborar na igualdade de gênero, na medida em que possibilita ao gênero feminino não deixar o mercado de trabalho após a maternidade, conciliando com maior segurança os papéis familiares e de trabalho.
A empresa também obtém diversas vantagens, tais como o aumento da produtividade, cumprindo o ODS 8, assim como redução de custos, maior possibilidade de retenção de talentos e condições de contratar serviços em qualquer parte do mundo.
Inobstante as vantagens ao trabalhador e empresas mencionadas no curso desta exposição, ganha a sociedade especialmente com a redução de poluentes e melhora da mobilidade urbana.
Destarte, tanto as empresas quanto o Poder Público devem criar políticas de incentivo ao teletrabalho, capacitando e conscientizando o cidadão, cumprindo assim o ODS 13, que trata da Ação contra a Mudança Global do Clima, afinal o planeta merece cuidado maior do que vem recebendo.
Notas
1FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. O direito, entre o futuro e o passado, p. 62.
2DE MASI, Domenico. O ócio criativo, p. 20.
3Idem, p. 63.
4OLIVEIRA NETO, Célio Pereira. Trabalho em ambiente virtual: causas, efeitos e conformação, p. 13.
5TOFFLER, Alvin. A terceira onda, pp. 37 e 42.
6DE MASI, Domenico. Op. cit., p. 167.
7TOFFLER, Alvin. A terceira onda, pp. 44 e 68.
8TOFFLER, Alvin. A terceira onda, p.54.
9BRASIL. Transformações socioeconômicas. Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/
sociologia/transformacoes-socioeconomicas-no-brasil-decada-50.htm>.
10ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho, pp. 35-42.
11ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho, p. 231.
12Segundo Zygmunt Bauman, “um jovem americano com nível médio de educação espera mudar de emprego 11 vezes durante a vida de trabalho – e o ritmo e frequência da mudança deverão continuar crescendo antes que a vida dessa geração acabe – BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida, p. 185
13NEGROPONTE, Nicholas. A vida digital, p. 158
14BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida, p. 149.
15Como bem observa Massimo Marchiori, “lassù nel nuovo cielo di Facebook. Che non a caso, è di colore blu.” MARCHIORI, Massimo. Meno internet più cabernet, p. 88.
16Essa visão foi adaptada a partir dos preciosos ensinamentos do Professor Tércio Sampaio Ferraz Junior, em suas aulas durante o Curso de Doutorado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e colhidas em grande parte da obra O direito, entre o futuro e o passado - FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. O direito, entre o futuro e o passado.
17OLIVEIRA NETO, Célio Pereira. Trabalho em ambiente virtual: causas, efeitos e conformação, p. 26.
18SCHWAB, Klaus. A Quarta Revolução Industrial, pp. 13 e 17.
19Idem, p. 20.
20Idem, p. 145.
21Informação extraída de <https://www.empiricus.com.br/publicacoes/valorizacao-criptomoedas/>. Acesso em 20.01.2019.
22SCHWAB, Klaus. Op. cit., pp. 148 e 153.
23Fonte <http://www.usinagem-brasil.com.br/8428-mercado-de-impressao-3d-dobrara-de-tamanho-a-cada-ano/>. Acesso em 22.01.2019.
24BRASIL. Entrevista com o CEO da Mercedes Benz. Disponível em: <https://www.pragaseeventos.com.br/administracao-e-associativismo/como-nossa-vida-ira-mudar-pelo-ceo-da-mercedes-benz/>. Acesso em: 13.07.2017.
25<https://www.educamaisbrasil.com.br/educacao/carreira/conheca-as-profissoes-que-correm-o-risco-de-extincao-ate-2025>. Acesso em 22.01.2019.
26SCHWAB, Klaus. A Quarta Revolução Industrial, p. 18.
27BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida, p. 110.
28<http://pactoglobal.org.br/10-principios/>. Acesso em 30.01.2019.
29<http://pactoglobal.org.br/10-principios/> Acesso em 30.01.2019.
30<http://www.odmbrasil.gov.br/os-objetivos-de-desenvolvimento-do-milenio>. Acesso em 30.01.2019.
31<https://www.infoescola.com/desenvolvimento-sustentavel/declaracao-de-joanesburgo/>. Acesso em 30.01.2019.
32<http://www.rio20.gov.br/sobre_a_rio_mais_20.html>. Acesso em 30.01.2019.
33Disponivel em <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/politica-externa/desenvolvimento-sustentavel-e-meio-ambiente/134-objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel-ods>. Acesso em 05.01.2019.
34Reconhecido como pai do teletrabalho.
35BRASIL. Organização Internacional do Trabalho. Disponível em: <www.ilo.org>. Acesso em: 05.01.2019.
36Esclarece-se que o fato de o trabalho ser prestado em domicílio, por si só, não representa teletrabalho, caso não se faça presente a comunicação e informática.
37ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. 5 Reasons remote work is most definitelt on the rise. Disponível em: <https://www.flexjobs.com/blog/post/reasons-remote-work-is-not-in-decline/>. Acesso em: 05.01.2019.
38DE MASI, Domenico. O ócio criativo, p. 180.
39Busca da felicidade – “pursuit of hapiness” – inspirada na Declaração de Independência dos Estados Unidos da América de 1776, que enuncia:“... certain unaliebable Rights, that among these are life, Liberty and the pursuit of Happiness”. Em tradução lvire: Certos direitos são inalienáveis, como aqueles que dizem respeito à vida, à liberdade e à busca da felicidade.
40Disponível em: <http://www1.previdencia.gov.br/aeps2006/15_01_03_01.asp>. Acesso em: 05.01.2019.
Referências
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Citação
OLIVEIRA NETO, Célio Pereira . Teletrabalho à luz dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito do Trabalho e Processo do Trabalho. Pedro Paulo Teixeira Manus e Suely Gitelman (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/398/edicao-1/teletrabalho-a-luz-dos-objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel
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Tomo Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Edição 1,
Agosto de 2020
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