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Nota fria
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Eduardo Marcial Ferreira Jardim
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Tomo Direito Tributário, Edição 1, Maio de 2019
Segundo Houaiss, um dos significados da palavra jargão consiste num código linguístico próprio de um grupo sociocultural ou profissional, também qualificado como gíria.1 É o caso da locução nota fria no campo fiscal e objeto de reflexões no presente verbete.
Destarte, exprime o sentido pelo qual alguns utentes empregam a palavra e no caso da tributação, diga-se de passo, o aludido jargão integra o vocabulário de agentes do Fisco, advogados tributáristas, contadores e também pelos tribunais, inclusive o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.
Com efeito, a nota fria representa a contraparte da nota fiscal, na dimensão em que esta, diferentemente daquela, estampa os dados relativos à uma operação de venda e compra ou de serviço, dentre outras, ao passo que a apontada nota fria, de revés, consubstancia uma falsa nota fiscal que no idioma inglês se denominada false invoice.2
1. Noções gerais
Ao lume de postulados de qualquer ramo do direito, as operações de qualquer natureza devem ser formalizadas, quer por avenças, no âmbito do direito civil ou comercial, por exemplo, quer por documentos comprobatórios do ato negocial.
No plano empresarial e em particular na seara tributária, todas as operações mercantis ou prestacionais de serviços devem ser lastreadas por notas fiscais, as quais são adquiridas pelo contribuinte – industrial, importador, comerciante ou prestador de serviço – devendo, em seguida, ser autenticadas no órgão fazendário competente, observado o modelo específico caso a caso.
De um modo geral, a nota fiscal deve compreender um número de série, além da numeração cronológica uma a uma, bem como a identificação do emitente, do adquirente e do transportador. Dentre outras formalidades, é de mister que a nota fiscal descreva o negócio em pormenores, identificando o local, a data, o valor da operação, bem assim a tributação incidente, afora outras exigências.
Como se vê, a nota fiscal integra um plexo de mecanismos que possibilitam ao Fisco o controle da tributação em todo o ciclo de incidência, no qual a nota in casu reveste importância fundamental, ao passo que, ao mesmo tempo, faz prova também a favor do contribuinte em casos controversos acerca da legalidade de suas operações.
2. Legislação paulista do ICMS
A talho de foice, vejamos as disposições genéricas acerca do assunto, conforme disposto no Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo em vigor no ano de 2017, a saber:
“Artigo 124 Serão emitidos, conforme as operações ou prestações realizadas, os seguintes documentos fiscais (Lei 6.374/89, art. 67, §§ 1º e 2º, com alteração da Lei 13.918/09; Convênio de 15-12-70 - SINIEF, art. 6º, na redação do Ajuste SINIEF-5/94, cláusula primeira, I, com alterações dos Ajustes SINIEF-4/95 e SINIEF-9/97 e art. 19, na redação do Ajuste SINIEF-3/94, cláusula primeira, IX; Ajuste SINIEF-3/78 e Convênio SINIEF-6/89, art. 1º, com as alterações dos Ajustes SINIEF-1/89, cláusula primeira, SINIEF-4/89, cláusula primeira, SINIEF-14/89, cláusula primeira, I, e SINIEF-15/89, cláusula primeira, I): (Redação dada ao "caput" do artigo, mantidos seus incisos, pelo Decreto 61.744, de 23-12-2015, DOE 24-12-2015; produzindo efeitos a partir de 01-01-2016)
Artigo 124 - A pessoa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS emitirá, conforme as operações ou prestações que realizar, os seguintes documentos fiscais (Lei 6.374/89, art. 67, §§ 1º e 2º, com alteração da Lei 13.918/09; Convênio de 15-12-70 - SINIEF, art. 6º, na redação do Ajuste SINIEF-5/94, cláusula primeira, I, com alterações dos Ajustes SINIEF-4/95 e SINIEF-9/97 e art. 19, na redação do Ajuste SINIEF-3/94, cláusula primeira, IX; Ajuste SINIEF-3/78 e Convênio SINIEF-6/89, art. 1º, com as alterações dos Ajustes SINIEF-1/89, cláusula primeira, SINIEF-4/89, cláusula primeira, SINIEF-14/89, cláusula primeira, I, e SINIEF-15/89, cláusula primeira, I): (Redação dada ao "caput" do artigo, mantidos os seus incisos, pelo Decreto 56.276, de 13-10-2010; DOE 14-10-2010)
Artigo 124 - A pessoa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS emitirá, conforme as operações ou prestações que realizar, os seguintes documentos fiscais (Lei 6.374/89, art. 67, §§ 1º e 2º; Convênio de 15-12-70 - SINIEF, art. 6º, na redação do Ajuste SINIEF-5/94, cláusula primeira, I, com alterações dos Ajustes SINIEF-4/95 e SINIEF-9/97 e art. 19, na redação do Ajuste SINIEF-3/94, cláusula primeira, IX; Ajuste SINIEF-3/78 e Convênio SINIEF-6/89, art. 1º, com as alterações dos Ajustes SINIEF-1/89, cláusula primeira, SINIEF-4/89, cláusula primeira, SINIEF-14/89, cláusula primeira, I, e SINIEF-15/89, cláusula primeira, I):
I - Nota Fiscal, modelo 1 ou 1-A;
II - Nota Fiscal de Venda a Consumidor, modelo 2;
III - Cupom Fiscal emitido por Equipamento Emissor de Cupom Fiscal - ECF;
IV - Nota Fiscal de Produtor, modelo 4;
V - Nota Fiscal/Conta de Energia Elétrica, modelo 6;
VI - Nota Fiscal de Serviço de Transporte, modelo 7;
VII - Conhecimento de Transporte Rodoviário de Cargas, modelo 8;
VIII - Conhecimento de Transporte Aquaviário de Cargas, modelo 9;
IX - Conhecimento Aéreo, modelo 10;
X - Conhecimento de Transporte Ferroviário de Cargas, modelo 11;
XI - Bilhete de Passagem Rodoviário, modelo 13;
XII - Bilhete de Passagem Aquaviário, modelo 14;
XIII - Bilhete de Passagem e Nota de Bagagem, modelo 15;
XIV - Bilhete de Passagem Ferroviário, modelo 16;
XV - Despacho de Transporte, modelo 17;
XVI - Resumo de Movimento Diário, modelo 18;
XVII - Ordem de Coleta de Carga, modelo 20;
XVIII - Nota Fiscal de Serviço de Comunicação, modelo 21;
XIX - Nota Fiscal de Serviço de Telecomunicações, modelo 22;
XX - Manifesto de Carga, modelo 25.
XXI - Conhecimento de Transporte Multimodal de Cargas, modelo 26 (Ajuste SINIEF-6/03). (Inciso acrescentado pelo Decreto 48.294 de 02-12-2003; DOE 03-12-2003; Efeitos a partir de 03-11-2003)
XXII - Documento Fiscal Eletrônico - DFE; (Redação dada ao inciso pelo Decreto 52.097, de 28-08-2007; DOE 29-08-2007)
NOTA - V. DECISÃO NORMATIVA CAT-17/09, de 24-11-2009 (DOE 25-11-2009). ICMS - Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) - Obrigatoriedade de emissão - Compete ao contribuinte verificar se as atividades que desenvolve estão ou não relacionadas nos Anexos I e II da Portaria CAT-162/2008.
NOTA - V. PORTARIA CAT-199/09, de 29-09-2009 (DOE 30-09-2009). Dispõe sobre o Formulário de Segurança para Impressão de Documento Auxiliar de Documento Fiscal Eletrônico (FS-DA).
NOTA - V. PORTARIA CAT-162/08, de 29-12-2008 (DOE 30-12-2008). Dispõe sobre a emissão da Nota Fiscal Eletrônica - NF-e e do Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica - DANFE, o credenciamento de contribuintes e dá outras providências.
XXII - Nota Fiscal Eletrônica - NF-e (Ajuste SINIEF 7/05). (Acrescentados os incisos XXII e XXIII pelo inciso I do art. 2º do Decreto 50.437 de 28-12-2005; DOE 29-12-2005; efeitos a partir de 29-12-2005)
XXIII - Documento Auxiliar da Nota Fiscal Eletrônica - DANFE (Ajuste SINIEF 7/05)
XXIV - Nota Fiscal de Serviço de Transporte Ferroviário, modelo 27 (Lei 6.374/89, art. 67, § 1°, Convênio SINIEF-6/89, na redação do Ajuste SINIEF-07/06, cláusula primeira). (Inciso acrescentado pelo Decreto 51.300 de 23-11-2006; DOE 24-11-2006; efeitos a partir de 1º-01-2007)
XXV - Documento Auxiliar do Conhecimento de Transporte Eletrônico - DACTE (Ajuste SINIEF- 9/07). (Acrescentado o inciso pelo Decreto 54.869, de 02-10-2009; DOE 03-10-2009)
XXVI - Documento Auxiliar do Manifesto Eletrônico de Documentos Fiscais - DAMDFE (Ajuste SINIEF 21/10). (Inciso acrescentado pelo Decreto 59.565, de 01-10-2013, DOE 02-10-2013)
XXVII - Documento Auxiliar da Nota Fiscal de Consumidor Eletrônica - DANFE-NFC-e; (Inciso acrescentado pelo Decreto 61.084, de 29-01-2015, DOE 30-01-2015)
XXVIII – Extrato de Emissão do Cupom Fiscal Eletrônico – CF-e-SAT. (Inciso acrescentado pelo Decreto 61.084, de 29-01-2015, DOE 30-01-2015)
§ 1º - A Secretaria da Fazenda pode determinar: (Redação dada ao parágrafo pelo Decreto 56.276, de 13-10-2010; DOE 14-10-2010)
1 - o uso de impresso de documento fiscal ou de outro impresso fiscal por ela fornecido, ficando-lhe facultado cobrar retribuição pelo custo;
2 - a adoção e utilização, por parte dos contribuintes, de dispositivos de controle, inclusive eletrônicos, que visem monitorar ou registrar as suas atividades de produção, armazenamento, transporte e suas operações ou prestações, no interesse da fiscalização do imposto.
§ 1º - A Secretaria da Fazenda poderá determinar o uso de impresso de documento fiscal por ela fornecido, ficando-lhe facultado exigir retribuição pelo custo.
§ 2º - É obrigatória a manutenção de impresso de Nota Fiscal em cada estabelecimento, ainda que exclusivamente varejista, excetuado o estabelecimento rural de produtor.
§ 3° - Os documentos referidos neste artigo, exceto os previstos nos incisos III, XXII, XXIII, XXV, XXVI, XXVII e XXVIII, obedecerão aos modelos contidos no Anexo/Modelos. (Redação dada ao parágrafo pelo Decreto 61.084, de 29-01-2015, DOE 30-01-2015)
§ 3° - Os documentos referidos neste artigo, exceto os previstos nos incisos III, XXII, XXIII e XXV, obedecerão aos modelos contidos no Anexo/Modelos. (Redação dada ao parágrafo pelo Decreto 54.869, de 02-10-2009; DOE 03-10-2009)
§ 3° - Os documentos referidos neste artigo, exceto os previstos nos incisos III, XXII e XXIII, obedecerão aos modelos contidos no Anexo/Modelos. (Redação dada ao§ 3° pelo art. 1º do Decreto 50.437 de 28-12-2006; DOE 29-12-2006; efeitos a partir de 29-12-2006)
§ 3º - Os documentos referidos neste artigo, exceto o previsto no inciso III, obedecerão aos modelos contidos no Anexo/Modelos.
§ 4º - É vedada a utilização simultânea dos modelos 1 e 1-A do documento fiscal de que trata o inciso I, salvo quando adotadas séries distintas, nos termos do artigo 196.
NOTA - V. PORTARIA CAT-17/06, de 21-03-2006 (DOE 22-03-2006). Dispõe sobre procedimentos relativos a livros e documentos fiscais, e dá outras providências.
NOTA - V. INSTRUÇAO NORMATIVA SRF - 85, de 11/10/2001. Disciplina a concessão de regimes especiais de emissão de documentos e escrituração de livros fiscais.”
Afora essas disposições gerais, o RICMS desdobra a matéria de forma esmiuçada nos tópicos subsequentes, versando especificamente sobre outras das hipóteses de operações, revelando, destarte, a importância da nota fiscal no universo tributário genericamente considerado e, particularmente, no campo da praticabilidade da tributação.
Assim, se por um lado a nota fiscal é de especial relevância ante o binômio Fiscal e Contribuinte, a sua falsificação, por sua vez, representa um problema para a fiscalização, além de significar uma conduta contrária ao interesse público.
Outrossim, a denominada Nota Fria ou nota fiscal fria é uma expressão informal concebida como jargão empregado por agentes da fiscalização e por contribuintes, na medida em que alude à nota-fiscal que não tenha efetivo lastro de operação mercantil ou de prestação de serviço.
3. Doutrina
Hugo de Brito Machado assim versou o assunto:
“Expressão geralmente utilizada para designar uma nota fiscal que não corresponde a uma operação de compra e venda realmente ocorrida. Com a implantação da técnica da não-cumulatividade no ICMS, a emissão de notas fiscais frias ganhou considerável importância como forma de fraude contra o fisco. É que as entradas de mercadorias geram crédito do imposto, que é utilizado para dedução do débito decorrente das saídas, e assim, contribuintes inescrupulosos compram notas fiscais frias, porque não correspondem a entradas efetivamente ocorridas, apenas para aproveitas o crédito do ICMS correspondente. Algumas sociedades chegaram a ser constituídas com o objetivo de vender notas fiscais frias, o que revela o grave inconveniente da técnica da não cumulatividade e exige um rigoroso controle das operações de circulação de mercadorias para evitar essas práticas fraudulentas”.4
O Dicionário de Direito Tributário de Igor Tenório e José Motta Maia estampa a seguinte definição:
“Nota fria. Designação dada à nota fiscal emitida para dar cobertura à mercadorias de procedência desconhecida ou não caracterizada, com sonegação de tributos. Também se utiliza a nota fria para reduzir maliciosamente o movimento do estabelecimento, sempre com o objetivo de sonegação. A vigente legislação, ao dispor sobre sonegação, caracteriza como crime, as modalidades relativas aos documentos ou atos do contribuinte, a emissão ou fornecimento de documentos graciosos ou de favor, bem assim a omissão de operações”.4
Kiyoshi Harada, por sua vez, emprega a expressão Nota Fiscal Fria, definindo-a como aquela que não corresponde a uma operação real com mercadorias ou serviços. Afirma tratar-se de documento ideologicamente falso, de empresas inexistentes ou que não existem mais, não raro utilizado por contribuintes inescrupulosos com a finalidade de legitimar uma situação irregular, a exemplo de recompor o estoque de mercadorias então em descompasso com os registros em decorrência de vendas efetuadas sem nota fiscal.5
Na mesma trilha é o entendimento contido no Dicionário jurídico-tributário Castardo, que, ao bordar o referido verbete, assim averbou: “Nota-Fria A Nota fiscal emitida para cobrir mercadoria de procedência desconhecida ou para dedução e redução da importância a pagar nos tributos aplicáveis no caso, por exemplo, o imposto de renda”.6
O autor deste e doutros verbetes, assim anotou o verbete sub examen em seu Dicionário de Direito Tributário:
“Jargão utilizado para indicar a nota emitida com a finalidade de legitimar uma situação irregular, a exemplo de estouro de caixa, mercadoria de procedência desconhecida ou adquirida sem nota na sua origem ou qualquer outra operação destinada a dar cobertura formal a ilícito tributário. Por vezes, o suposto emitente da chamada nota fria nem sequer existe, fato que, por óbvio, agrava a natureza da infração cometida. Observe-se que delitos envolvendo as denominadas notas frias, em qualquer de suas modalidades, implicam não só infração tributária, como configuram também crime fiscal, nos termos da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990”.7
A Nota Fria encontra terreno fértil no plano dos tributos pautados pelo postulado da não cumulatividade, pois este princípio constitucional determina que o débito de cada operação é dimensionado mediante a compensação do imposto incidente na operação anterior, conforme determinação constitucional contida no art. 153, § 3º, inciso II, com relação ao IPI e no art. 155, § 2º, inciso I, relativo ao ICMS.
Em exemplário armado ao propósito, suponha-se que, num certo mês, um dado contribuinte faltoso apure um debitum de ICMS no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). Caso ele recorra ao mecanismo fraudulento da Nota Fria, ele poderia, por exemplo, adquirir notas frias com o único desígnio de gerar crédito para reduzir ou neutralizar o imposto a pagar.
Como se vê, a sistemática da não cumulatividade é aplicável ao IPI, ICMS, alcançando, também, uma série de operações compreendendo as contribuições PIS/Cofins. Realmente, esse modelo afigura-se anacrônico e de difícil controle por parte do Fisco, e poderia ser modificado pela simples tributação na operação final ao consumidor.
A emissão de Nota Fria pode comprometer a pessoa que produz a referida nota, bem como o contribuinte que a utiliza para escriturar créditos artificiosos e, com isso, reduzir o imposto a pagar.
Entrementes, há hipóteses de contribuintes que adquirem mercadorias lastreadas por notas frias e, por isso, ao revés de cometerem a aludida infração com desdobramento criminal, antes, são vítimas. Em situações desse jaez, os contribuintes que conseguem provar a licitude da operação tendem a obter sucesso na própria via administrativa ou mesmo no Judiciário.
4. Sanções administrativas e criminais
Com efeito, a infração consubstanciada no emprego de Nota Fria rende margem a penalidades gravosas em múltiplas legislações, a exemplo do ICMS paulista em que o Regulamento estipula a multa de 100% sobre o valor da operação, sem olvidar que essa infração tipifica crime previsto no Código Penal e na Lei do Crime contra a Ordem Tributária.
Vejamos, pois, as sanções concernentes ao descumprimento de obrigações de fazer de um modo geral, bem como aquela específica em relação a utilização de Nota Fria (grifos nossos), a saber:
“Artigo 527 - O descumprimento da obrigação principal ou das obrigações acessórias, instituídas pela legislação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços, fica sujeito às seguintes penalidades (Lei 6.374/89, art. 85, com alteração das Leis 9.399/96, art. 1°, IX, e 10.619/00, arts. 1º, XXVII a XXIX, 2°, VIII a XIII, e 3º, III):
(...)
IV - infrações relativas a documentos fiscais e impressos fiscais:
a) falta de emissão de documento fiscal - multa equivalente a 50% (cinqüenta por cento) do valor da operação ou prestação;
b) emissão de documento fiscal que consignar declaração falsa quanto ao estabelecimento de origem ou de destino da mercadoria ou do serviço; emissão de documento fiscal que não corresponder a saída de mercadoria, a transmissão de propriedade da mercadoria, a entrada de mercadoria no estabelecimento ou, ainda, a prestação ou a recebimento de serviço - multa equivalente a 30% (trinta por cento) do valor da operação ou prestação indicado no documento fiscal;
c) adulteração, vício ou falsificação de documento fiscal; utilização de documento falso ou de documento fiscal cujo impresso tiver sido confeccionado sem autorização fiscal ou por estabelecimento gráfico diverso do indicado, para propiciar, ainda que a terceiro, qualquer vantagem indevida - multa equivalente a 100% (cem por cento) do valor indicado no documento;
d) utilização de documento fiscal com numeração e seriação em duplicidade ou emissão ou recebimento de documento fiscal que consignar valores diferentes nas respectivas vias - multa equivalente a 100% (cem por cento) do valor total da operação ou prestação;
e) emissão ou recebimento de documento fiscal que consignar importância inferior à da operação ou da prestação - multa equivalente a 100% (cem por cento) do valor da diferença entre o valor real da operação ou prestação e o declarado ao fisco;
f) reutilização de documento fiscal em outra operação ou prestação - multa equivalente a 100% (cem por cento) do valor da operação ou da prestação ou, à falta deste, do valor indicado no documento exibido;
g) destaque de valor do imposto em documento referente a operação ou prestação não sujeita ao pagamento do tributo - multa equivalente a 30% (trinta por cento) do valor da operação ou prestação indicado no documento fiscal; quando o valor do imposto destacado irregularmente tiver sido lançado para pagamento no livro fiscal próprio - multa equivalente a 1% (um por cento) do valor da operação ou prestação constante no documento;
h) emissão de documento fiscal com inobservância de requisito regulamentar ou falta de obtenção de visto em documento fiscal - multa equivalente a 1% (um por cento) do valor da operação ou prestação relacionada com o documento”.
De outra parte, por considerar que a emissão e o emprego de Nota Fria configura fraude, tal infração se submete à multa agravada de cento e cinquenta por cento, nos termos dos arts. 71, 72 e 73 da Lei 4.502, de 30 de novembro de 1964, disposição encampada pelo art. 44, da Lei n. 9.430, de 27 de dezembro de 1966, tudo sem prejuízo de outras penalidades administrativas ou penais aplicáveis à espécie.
Dada a autonomia das pessoas constitucionais no pacto federativo, há milhares de diplomas municipais e dezenas de outros no âmbito do Estados e do Distrito Federal, sem contar a União, cada qual podendo dispor sobre a matéria, seja por regras genéricas, seja por legislação específica de cada tributo, o que torna realmente muito complexa a compreensão de sobrenumeráveis regras distintas normatizando uma mesma conduta.
Em realidade, seria razoável que o Congresso Nacional editasse legislação complementar dispondo sobre a matéria de modo uniforme, o que otimizaria a segurança jurídica dos contribuintes.
Por outro lado, a repercussão criminal da conduta substanciada em prática de Nota Fria, esta, sim, se subsume à legislação una na órbita penal, onde, merece destaque a Lei do Crime contra a Ordem Tributária.
Deveras, o diploma mencionado, no caso a Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. Em seu comando inserto no art. 1º, inciso III, tipifica a nota fiscal fria como crime contra a ordem tributária, estipulando a pena de dois a cinco anos de reclusão, além de dez a trezentos e sessenta dias-multa, nos termos do disposto no art. 8º da mesma Lei. Demais disso, o art. 9º permite que o magistrado converta a pena de reclusão em multa, revela o texto abaixo (grifos nossos):
“LEI Nº 8.137, DE 27 DE DEZEMBRO DE 1990.
Mensagem de veto
(Vide Lei nº 9.249, de 1995)
(Vide Decreto nº 3.000, de 1999)
Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei:
CAPÍTULO I
Dos Crimes Contra a Ordem Tributária
Seção I
Dos crimes praticados por particulares
Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (Vide Lei nº 9.964, de 10.4.2000)
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;
IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.
Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.
(...)
Art. 8° Nos crimes definidos nos arts. 1° a 3° desta lei, a pena de multa será fixada entre 10 (dez) e 360 (trezentos e sessenta) dias-multa, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.
Parágrafo único. O dia-multa será fixado pelo juiz em valor não inferior a 14 (quatorze) nem superior a 200 (duzentos) Bônus do Tesouro Nacional BTN.
Art. 9° A pena de detenção ou reclusão poderá ser convertida em multa de valor equivalente a:
I - 200.000 (duzentos mil) até 5.000.000 (cinco milhões) de BTN, nos crimes definidos no art. 4°;
II - 5.000 (cinco mil) até 200.000 (duzentos mil) BTN, nos crimes definidos nos arts. 5° e 6°;
III - 50.000 (cinqüenta mil) até 1.000.000 (um milhão de BTN), nos crimes definidos no art. 7°.
Art. 10. Caso o juiz, considerado o ganho ilícito e a situação econômica do réu, verifique a insuficiência ou excessiva onerosidade das penas pecuniárias previstas nesta lei, poderá diminuí-las até a décima parte ou elevá-las ao décuplo. (...)”.
Por derradeiro, impende esclarecer que o pagamento do tributo, inclusive dos seus acessórios, antes do recebimento da denúncia tem o condão de extinguir a punibilidade, conforme estabelecido no art. 34 da Lei n. 9.249, de 26 de dezembro de 1995, assim atremado:
“Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na Lei nº 4.729, de 14 de julho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia”.
Notas
1 HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa, p. 1675.
2 CHAVES DE MELLO, Maria. Dicionário jurídico – Law dictionary, p. 407.
3 MACHADO, Hugo de Brito. Dicionário de direito tributário, p. 161.
4 TENÓRIO, Igor; MAIA, José da Motta. Dicionário de direito tributário, p. 185.
5 HARADA, Kiyoshi. Dicionário de direito público, p. 271.
6 CASTARDO, Hamilton Fernando. Dicionário jurídico-tributário Castardo, pp. 162-163.
7 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Dicionário de direito tributário, pp. 284-285.
Referências
CASTARDO, Hamilton Fernando. Dicionário jurídico-tributário Castardo. Campinas: Millenium Editora, 2006.
CHAVES DE MELLO, Maria. Dicionário jurídico – Law dictionary. São Paulo: Gen-Editora Método, 2012.
HARADA, Kiyoshi. Dicionário de direito público. 2. ed., São Paulo: MP Editora, 2005.
HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Dicionário de direito tributário. São Paulo: Noeses, 2011.
MACHADO, Hugo de Brito. Dicionário de direito tributário. São Paulo: Atlas, 2011.
SÃO PAULO (ESTADO). Secretaria da Fazenda. Regulamento do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. São Paulo, SP. Disponível em: <http://info.fazenda.sp.gov.br/NXT/gateway.dll?f=templates&fn=default.htm&vid=sefaz_tributaria:vtribut>. Acesso em: 14.01.2017.
TENÓRIO, Igor; MAIA, José da Motta. Dicionário de direito tributário. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996.
Citação
JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira. Nota fria. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Tributário. Paulo de Barros Carvalho, Maria Leonor Leite Vieira, Robson Maia Lins (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/314/edicao-1/nota-fria
Edições
Tomo Direito Tributário, Edição 1,
Maio de 2019