• Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana

  • Maria Rita Ferragut

  • Tomo Direito Tributário, Edição 1, Maio de 2019

Neste artigo trataremos do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU, previsto no art. 156, I, da Constituição Federal. 

O IPTU é o único imposto sobre a propriedade cuja instituição e cobrança é atribuída aos Municípios, revelando-se de extrema importância para os orçamentos municipais, tendo em vista que, nas pequenas cidades, a receita advinda do ISS e do ITBI costuma ser pouco representativa.

Importante característica desse imposto é trazida pelo § 1º do art. 156 da Constituição, que trata da progressividade. Pela norma, o imposto poderá ser progressivo em razão do valor, localização e uso do imóvel, exercendo importante função extrafiscal na medida em que alíquotas menores incidirão sobre propriedades igualmente menores, não localizadas em áreas melhor estruturadas e que exerçam a função social.

Por fim, o IPTU encontra-se previsto nos arts. 32 a 34 do Código Tributário Nacional – CTN.


1. Competência tributária para a instituição do IPTU

Nos termos do art. 156, I, da Constituição Federal, o IPTU, incidente sobre a propriedade de imóveis localizados dentro das áreas urbanas dos Municípios, é de competência dos Municípios e do Distrito Federal.

Competência tributária é norma jurídica de estrutura, veiculada em patamar constitucional, que prescreve a permissão para as pessoas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) legislarem sobre matéria tributária.

As normas de estrutura que circunscrevem o objeto da competência normativa demarcam o campo material possível para a criação de novas normas jurídicas, representado pelo conjunto de fatos, situações ou relações objeto da disciplina jurídica sobre as quais as normas podem constituir permissões, obrigações ou proibições.

Cabe à norma de competência indicar o sujeito da enunciação. É ele que deve desempenhar o ato ou conjunto de atos necessários à produção válida de normas no sistema jurídico. É também essa norma que vincula, por meio de uma relação jurídica, o sujeito competente e os demais sujeitos de direito. No cerne desse vínculo encontra-se a possiblidade de editar normas sobre uma matéria qualquer. 

Portanto, no que diz respeito ao imposto objeto desse artigo, cabem aos Municípios e ao Distrito Federal instituir o imposto por meio de lei ordinária (regra-matriz de incidência tributária), bem como promover todas as demais alterações que se fizerem necessárias.


2. Regra-matriz de incidência tributária do IPTU

Nas palavras do Professor Paulo de Barros Carvalho,1 “a criação de um esquema seguro para dar parâmetros racionais à tributação, com fundamento em estrutura lógica, permitiu à Ciência do Direito Tributário colaborar na limitação da vontade arrecadatória do legislador. A regra-matriz veio à lume, justamente, para instaurar critérios seguros, permitindo identificar a natureza do tributo e relacioná-la com o regime jurídico que querem lhe impor”. 

Regra-matriz de incidência tributária é norma jurídica – significação organizada numa estrutura lógica hipotético-condicional (juízo implicacional), construída pelo intérprete a partir do direito positivo, seu suporte físico. Tem por função regular condutas intersubjetivas. 

Difere das demais normas existentes no direito positivo apenas em virtude de seu conteúdo, que descreve um fato típico tributário e prescreve a relação obrigacional que se estabelece entre os sujeitos ativo e passivo, tendo por objeto o pagamento de uma prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, não decorrente de ato ilícito (tributo). 

É formada, internamente, por um antecedente que contempla os critérios material, espacial e temporal. No consequente, é formada pelo critério pessoal (sujeitos ativo e passivo) e pelo critério quantitativo (base de cálculo e alíquota).

Como é sabido, a regra-matriz de incidência tributária permite estudar o tributo na sua integridade constitutiva, percebendo os elementos essenciais à incidência tributária, quais sejam, circunstâncias de espaço e tempo em que o tributo se torna devido, a modalidade de fato que se ajusta à hipótese normativa, quem deve pagar, quem deve receber, como deve ser calculado o valor da obrigação tributária. Essa é a abordagem de maior alcance operacional, pois, como assina Paulo de Barros Carvalho em preciosa lição, oferece todas as informações imprescindíveis à aplicação da norma tributária no caso concreto.2 


2.1. Critério material

O critério material do IPTU é ser proprietário, ter o domínio útil ou a posse do bem imóvel. 

Proprietário, nos termos do art. 1.228 do Código Civil, é aquele que tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

A propriedade, antes considerada direito subjetivo absoluto, atualmente ressurge sob outra concepção, ao aliar a função social às faculdades de usar, gozar e dispor.

O princípio da função social relativiza o individualismo que marcou o tratamento do direito de propriedade que se tinha até o Código Civil de 2002. A propriedade não deixou de ser direito subjetivo tutelado pelo ordenamento jurídico, mas a função social alterou a estrutura e o regime jurídico do respectivo direito, atuando sobre o seu conceito e o seu conteúdo. 

A propriedade que não cumpre sua função social não pode ser tutelada pelo ordenamento, que submete os interesses patrimoniais aos princípios fundamentais. Nessa medida, a Constituição garante o direito de propriedade, desde que este exerça sua função social. 

Já domínio útil é a ingerência direta sobre a coisa, ou seja, o gozar, dispor, usar e reaver o bem.

A posse, por sua vez, encontra-se prevista no art. 1196 do Código Civil: “considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”.

Infere-se, portanto, que posse é o exercício, pleno ou não, dos poderes inerentes à propriedade.

A legislação associa posse a exercício. A despeito de todo o dissenso doutrinário acerca da conceituação da posse e da sua natureza jurídica, que não nos cabe nesse momento aprofundar, a posse pode ser definida como um poder que alguém exerce sobre a coisa; direito real subjetivo de usar, gozar e dispor de uma determinada coisa. É fato que, considerado em si mesmo, gera efeitos jurídicos, razão pela qual tal exercício goza tanto de proteção legal contra terceiros (como ocorrem nas ações possessórias), como reconhecimento, que pela passagem do tempo, outorga aos possuidores o direito de adquirir a propriedade, através da ação de usucapião.

Nesse contexto, registramos que a doutrina3 e a jurisprudência4 já se posicionaram entendendo que não é qualquer posse que autoriza a exigência do imposto, mas tão somente aquelas em que o possuidor se comporta como legítimo proprietário do imóvel. Por isso, o locatário, o comodatário e outros que a esses se assemelhem não são contribuintes do IPTU.

Considerando que o domínio útil e a posse são atributos intrínsecos a um direito maior, que é o direito de propriedade, tem-se que o CTN não ultrapassou o limite constitucional.


2.2. Critério temporal 

Por critério temporal deve-se entender o momento em que a ocorrência do fato de repercussão jurídica é relevante, competindo à lei ordinária a sua fixação. No IPTU, o critério temporal é verificado no primeiro dia de janeiro de cada ano.

O próprio princípio da anterioridade tributária (art. 150, III, “b” e “c”, da Constituição), ao qual o IPTU se submete, contribui para afastar qualquer periodicidade inferior a um ano. Assim, se a lei que vier a majorar este tributo só poderá incidir no exercício financeiro seguinte ao de sua entrada em vigor, o valor da propriedade predial e territorial urbana do contribuinte somente poder ser aferido anualmente.

A cobrança, por sua vez, ocorre por meio do envio de carnê aos contribuintes, documento que formaliza o lançamento de ofício a que o imposto está sujeito. 


2.3. Critério espacial 

A princípio, o critério espacial do imposto é a zona urbana do Município em que o imóvel se encontra.

O CTN, no § 1º do art. 32, define o que é zona urbana, justamente para diferenciá-la da zona rural, sobre a qual há incidência do Imposto Territorial Rural (ITR). Assim, para uma zona ser considerada urbana e, portanto, passível de cobrança do IPTU, deve possuir pelo menos dois dos melhoramentos descritos em referido artigo, construídos ou mantidos pelo Poder Público. São eles:

(i) meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; 

(ii) abastecimento de água; 

(iii) sistema de esgotos sanitários; 

(iv) rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;

(v) escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

Ainda, nos termos do § 2º do mesmo art. 32, a lei municipal pode considerar como área urbana as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas taxativamente como urbanas. 

Por fim, não poderíamos deixar de mencionar que por um segundo motivo o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial 1.112.646/SP, considerou que a regra “localização fora da zona urbana” não é absoluta, ao entender que terrenos localizados em zona urbana – portanto, a princípio sujeitos à incidência do IPTU – sujeitam-se ao ITR, se a destinação do imóvel for rural. Confira-se a ementa de referida decisão:

“TRIBUTÁRIO. IMÓVEL NA ÁREA URBANA. DESTINAÇÃO RURAL. IPTU. NÃO-INCIDÊNCIA. ART. 15 DO DL 57/1966. RECURSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC. 1. Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 do DL 57/1966). 2. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.”

Com isso, é possível ter um imóvel em área urbana que possua duas ou mais das características previstas em lei para a incidência do IPTU, mas não incidir este imposto, e sim ITR quando estiver presente a condição de “destinação rural do imóvel”.


2.4. Critério quantitativo

O critério quantitativo indica os fatores que conjugados exprimem o valor pecuniário da dívida. É normalmente composto por base de cálculo e alíquota. 


2.4.1. Alíquota

A alíquota é o critério legal, em regra expresso em percentagem (%). No caso do IPTU, a alíquota aplicada o Município de São Paulo varia de 1% a 1,5%, nos termos da Lei 6.989/1966, que sofreu diversas alterações, em especial, pela Lei 15.889/2013. Esta legislação estabelece que:

1. para os imóveis construídos utilizados exclusiva ou predominantemente como residência, o imposto é calculado à razão de 1% do valor venal, com acréscimos e descontos definidos por faixas de valor venal; e

2. para os demais imóveis construídos e terrenos, o imposto é calculado à razão de 1,5% do valor venal, com acréscimos e descontos também definidos por faixas de valor venal. 

 A Constituição permitiu, no art. 182, II, § 4º, a utilização de alíquotas maiores para imóveis em desacordo com o plano diretor urbano, pretendendo elevar a tributação sobre tais imóveis, com a finalidade de desestimular o aproveitamento errôneo do solo urbano. 

Nestes casos, o IPTU será utilizado como instrumento para desestimular comportamentos definidos em lei e o imposto será utilizado prioritariamente em caráter extrafiscal. 


2.4.2. Progressividade, capacidade contributiva e o IPTU

Segundo o Prof. Roque Carrazza,5 princípio jurídico é um enunciado lógico implícito ou explícito, que, por sua grande generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam”. 

A Constituição Federal pode ser compreendida como uma ordem de valores, composta por princípios e regras, que nada mais são do que normas jurídicas. Pela supremacia da Constituição, a observância dos princípios é uma exigência que se impõe a todos os órgãos do Estado.

Princípio significa fundamento, ponto de partida. Isso não significa que seu conteúdo esteja pronto. Como toda norma, depende da construção do intérprete. Mas princípios são postulados fundamentais que informam a interpretação e aplicação das normas jurídicas, e têm como função importantíssima a de servir de integração para o sistema, permitindo soluções onde exista falha ou lacuna normativas.

Diante do Texto Constitucional, quem confere o status de princípio a um comando normativo é a dogmática jurídica. O que diferencia princípios das demais regras é que eles são portadores de elevada carga axiológica, a ponto de informar a produção e interpretação de diversas outras normas.

Nos termos do art. 145, § 1º, da Constituição, todos os impostos, independentemente de seu caráter real ou pessoal, devem guardar relação com a capacidade contributiva do sujeito passivo.

De acordo com o princípio da capacidade contributiva, sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a possibilidade econômica do contribuinte. 

Como decorrência da igualdade tributária, o princípio da capacidade contributiva impõe, por sua natureza subjetiva, que a base de cálculo dos tributos seja mensurada conforme o potencial contributivo de cada indivíduo, distribuindo-se a carga tributária equitativamente, numa medida de justiça fiscal. Já sob o seu viés objetivo, o princípio exige do legislador impositivo a leitura da materialidade constitucional como a possibilidade de tributar unicamente eventos representativos de riqueza, que respeitem o mínimo vital e a manutenção da atividade produtiva e que não gerem efeitos confiscatórios.

Capacidade econômica é essencial, mas não suficiente para a tributação, por conta justamente de ser necessário a ela somar-se a aptidão para contribuir. Rubens Gomes de Sousa6 define-a como a “soma de riqueza disponível depois de satisfeitas as necessidades elementares de existência, riqueza essa que pode ser absorvida pelo estado sem reduzir o padrão de vida do contribuinte e sem prejudicar as suas atividades econômicas”. 

Capacidade contributiva, assim, requer a preservação do mínimo vital, nesta rubrica compreendidos não só os direitos básicos garantidos pela Constituição Federal aos indivíduos (vale dizer, saúde, educação e propriedade), mas também aqueles assegurados às entidades econômicas (ou seja, livre iniciativa e livre concorrência). 

Considerando o princípio de que ora tratamos, bem como os impostos considerados “diretos” (ou seja, os que não repercutem, como o IPI e o ICMS), será legítima a adoção de alíquotas progressivas mesmo antes da EC 42/2003, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal, no RE 562.045-RG/RS e no Agravo Regimental no RE 720.945, dentre outros.

Vejamos parte do voto do Ministro Ricardo Lewandowski, nos autos do RE 562.045, in verbis:

“Antes de adentrar ao cerne da discussão, convém assentar que a progressividade é uma das formas pelas quais a graduação dos tributos é levada a efeito pelo Estado. Não se deve, todavia, confundir “seletividade” – técnica aplicável aos impostos reais – com “progressividade”, sistemática que usualmente é empregada para modular os impostos pessoais. Nesta, as alíquotas aumentam em função do valor da base de cálculo, onerando mais pesadamente aqueles que possuem maior capacidade econômica, de forma proporcional à sua riqueza. Já naquela, as alíquotas variam em razão dos objetos tributados, tendo em mira a realização de determinada política fiscal, de modo a estimular ou desestimular a produção ou o consumo de certos bens. A função essencial da progressividade consiste em dar concreção ao princípio da capacidade contributiva de modo a promover a justiça social em matéria tributária, servindo como importante instrumento de desconcentração da riqueza.

Coerentemente com tal entendimento, o dispositivo constitucional em tela estabelece que a graduação dos impostos somente pode ser levada a efeito se guardar relação com a capacidade contributiva do sujeito passivo. Tal liame, como é sabido, melhor se evidencia nos tributos de natureza pessoal, ao menos do ponto de vista da proporcionalidade e razoabilidade da exação. O texto constitucional - como ressaltou o STF nos julgados acima referidos – é expresso ao determinar que a graduação dos impostos há fazer-se “segundo a capacidade econômica do contribuinte”, facultando-se à administração tributária, para conferir efetividade a tal desiderato, identificar, respeitados os direitos individuais, e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas daqueles que irão suportá-lo. 

[...] Assim, vê-se, que, além da progressividade, prevista no § 1º do art. 145, aplicável aos impostos de natureza pessoal, o constituinte admitiu-a, pontualmente, para alguns impostos reais, sempre buscando a obtenção de efeitos extrafiscais, a saber:  

i) no art. 153, § 4º, I, quanto ao Imposto sobre Propriedade Territorial Rural – ITR, “como forma de desestimular a manutenção de propriedades improdutivas”; 

ii) no art. 156, § 1º, I, incluído pela Emenda Constitucional 29/2000, relativamente ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana - IPTU, como faculdade, conferida ao legislador municipal, de estabelecer a progressividade com base no valor do imóvel para, no entender de Hugo de Brito Machado, “de desestimular vultosas imobilizações de recursos em terrenos para fins meramente especulativos, dificultando o crescimento normal das cidades”; e 

iii) no art. 182, § 4º, II, também quanto ao IPTU, sob a modalidade de progressividade no tempo, como instrumento de política urbanística, objetivando assegurar o cumprimento da função social da propriedade, de modo a exigir “do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento”.


2.4.3. Planta Genérica de Valores 

A planta genérica de valores consiste em uma tabela onde estão descritos todos os critérios concretos dos métodos de avaliação utilizados para se chegar ao valor venal dos imóveis. É na planta genérica que está definida a valorização dos imóveis de cada rua do Município. Ali se define, por exemplo, quantos reais por metro quadrado vale cada imóvel situado em determinada rua. Há ainda na planta de valores a valoração de outros fatores, seja dos terrenos, seja das edificações. A aplicação desses fatores em fórmulas definidas na própria planta genérica, em conjunto com os dados do cadastro imobiliário, terá como consequência a apuração do valor venal dos imóveis.

A elaboração da planta genérica de valores deve ser feita criteriosamente pelo Município, para que se alcance um valor venal em valores bem próximos aos que são praticados pelo mercado, evitando-se, assim, insatisfação do contribuinte quanto aos imóveis superavaliados, ou evasão de receita, nas hipóteses de imóveis subavaliados. 


2.4.4. IPTU Predial e Territorial: constitucionalidade da diferenciação de alíquotas

Prédio é a edificação permanentemente incorporada ao solo, que serve para a habitação ou para o exercício de quaisquer atividades, inclusive esportivas. Assim, além das casas, dos edifícios de apartamento, das garagens etc., também são prédios os campos de futebol, as pistas de atletismo, as quadras de tênis etc., justamente porque exigem construções, ainda que apenas no nível do solo e do subsolo. E por exclusão, o imóvel sem qualquer aproveitamento ou edificação (solo sem benfeitorias) será, inclusive para fins de IPTU, terreno.

A diferenciação de alíquotas para imóveis construídos (predial) e terrenos/glebas (territorial), localizados na zona urbana e sujeitos ao pagamento do IPTU, não encontra qualquer óbice constitucional, e tem sido permitida pela jurisprudência. Vários são os motivos para se considerar válida a diferenciação de alíquotas entre imóveis edificados ou não. 

Primeiramente, não se trata de progressividade de alíquotas, na medida em que não há graduação de percentuais de acordo com a elevação do valor venal do imóvel tributado. Em segundo lugar, inexiste qualquer dispositivo constitucional que imponha uma alíquota única para a cobrança do IPTU. Por fim, inexiste limitação constitucional, imposta ao legislador municipal, que impeça a previsão de mais de uma alíquota para o IPTU.

Não há que se falar, ainda, em tratamento desigual entre contribuintes na mesma situação fática, ou, de outra forma, em violação ao princípio da isonomia. As características de cada propriedade (imóvel construído ou não, terreno localizado em zona de alta ocupação urbana ou não) põem em categorias diferenciadas os contribuintes proprietários dos diferentes imóveis, evidenciando que eles não se encontram em situação equivalente. 

Há de se lembrar, diante das normas constitucionais, que, não havendo qualquer afronta às disposições constitucionais expressas ou postas em leis complementares, os Municípios podem exercer sua competência tributária plenamente, sendo válidas todas as disposições que não impliquem afronta a regras ou princípios constitucionais. 

Por fim, a diferenciação de alíquotas para contribuintes em situações diversas é prática da atividade tributária de todos os entes federados. Têm-se, como exemplos, as alíquotas do ISS, variáveis conforme a atividade desenvolvida, ou as alíquotas do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), conforme o tipo de veículo automotor, e as alíquotas do Imposto sobre a Renda, diversas para pessoas físicas e jurídicas.


2.4.5. Base de Cálculo

Entende-se por base de cálculo o aspecto dimensível da hipótese de incidência. Ao lado da função mensuradora, a base de cálculo confirma, afirma ou infirma o aspecto material do antecedente normativo.

Nos termos do art. 33 do CTN, a base de cálculo do IPTU é o valor venal do imóvel, não se considerando o valor dos bens móveis mantidos, em caráter permanente ou temporário, no imóvel, para efeito de sua utilização, exploração, aformoseamento ou comodidade. 

O valor venal de um imóvel é o preço de venda, levando-se em consideração o terreno acrescido de suas edificações, estimado por critérios técnicos prescritos em lei municipal. É o valor provável do imóvel, aquele que o bem alcançaria para compra e venda à vista, conforme as condições usuais do mercado imobiliário.

O valor venal do imóvel, por ser a base de cálculo do imposto e um dos critérios da regra-matriz de incidência, só pode ser fixado ou majorado por lei. 

O que se pode estabelecer por meio de ato do Poder Executivo é a atualização monetária do imposto, a teor do disposto no § 2º, do art. 97 do CTN. Via de regra, cabe à Administração apurar o correto valor do imóvel, o que normalmente é feito através da elaboração da Planta Genérica de Valores. Permite-se também algumas vezes que o contribuinte faça declaração do valor do seu bem para efeitos de cadastramento. A Administração Pública, porém, tem o dever de apurar o correto valor do imóvel, comparando-o, se for o caso, com o valor declarado. 

Avaliando de ofício o valor do imóvel ou comparando-o com o valor declarado pelo contribuinte, a Administração deve levar em conta a localização, a existência de serviços públicos, as possibilidades do comércio e, sobretudo, o valor de alienações recentes de imóveis idênticos na mesma localidade. Em caso de divergência entre o valor declarado pelo contribuinte e o real valor do imóvel, o Município pode arbitrar o valor, ato esse submetido à contestação do contribuinte. 


2.5. Critério pessoal 

O sujeito ativo (titular do direito subjetivo de exigir a prestação pecuniária) é a União Federal. Já o sujeito passivo é o contribuinte, ou seja, a pessoa física ou jurídica, proprietária ou detentora do domínio útil ou a posse do bem rural (conforme art. 34 do CTN), que tem por domicílio tributário o Município de localização do imóvel, vedada a eleição de qualquer outro.

Além disso, é considerado responsável pelo crédito tributário o sucessor, a qualquer título, nos termos dos arts. 128 a 133 do CTN.


3. Imunidade

Atendidos os requisitos constitucionais, são imunes do Imposto Predial e Territorial Urbano:

Os imóveis integrantes do patrimônio da União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público (CF, art. 150, VI, a e §2º);

Os templos de qualquer culto (CF, art. 150, VI, b);

Os imóveis integrantes do patrimônio dos partidos políticos, inclusive suas fundações; do patrimônio das entidades sindicais dos trabalhadores; das instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos e atendidos os requisitos da lei (CF, art. 150, VI, c); e das instituições de Educação e de Assistência Social.

Referidos imóveis deverão, ademais, cumprir com dois requisitos: (i) o imóvel objeto do pedido deve ser integrante do patrimônio da entidade e (ii) ser utilizado nas finalidades essenciais da entidade.

Por fim, as entidades não poderão distribuir parcelas de seu patrimônio ou de suas rendas a qualquer título, bem como deverão aplicar seus recursos integralmente no país, na manutenção de seus objetivos institucionais e manter escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.


4. Isenção

Por ser um tributo municipal, a isenção varia de acordo com cada Município. A título de exemplo, consideremos a isenção vigente em São Paulo, em 2017, para o aposentado, pensionista ou beneficiário de renda mensal vitalícia:

Não possuir outro imóvel no município;

Utilizá-lo como residência;

Rendimento mensal que não ultrapasse 5 (cinco) salários mínimos no exercício a que se refere o pedido; 

O imóvel deve fazer parte do patrimônio do solicitante; e

O valor venal do imóvel seja de até R$ 1.176.311,00 (um milhão, cento e setenta e seis mil e trezentos e onze reais).


Notas

1 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método, pp. 589-590.

2 Idem, p. 590.

3 Ver: CEZAROTI, Guilherme. A incidência do IPTU sobre propriedade com limitações de uso. IPTU – aspectos jurídicos relevantes, p. 233. Ver ainda: COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988 – sistema tributário.

4 RESP 117.771/SP e RESP 172.522/SP.

5 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário, pp. 32 e 35.

6 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária, p. 95.

Referências

BARRETO, Aires Fernandino. Base de cálculo, alíquota e princípios constitucionais. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1998.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 28. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2012.

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

CEZAROTI, Guilherme. A incidência do IPTU sobre propriedade com limitações de uso. IPTU – aspectos jurídicos relevantes. Marcelo Magalhães Peixoto (coord). São Paulo: Quartier Latin, 2002.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à constituição de 1988 – sistema tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1990.

SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. Edição póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1981.


Citação

FERRAGUT, Maria Rita. Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Tributário. Paulo de Barros Carvalho, Maria Leonor Leite Vieira, Robson Maia Lins (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/291/edicao-1/imposto-sobre-a-propriedade-predial-e-territorial-urbana

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