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Sanções por ato de improbidade administrativa
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Wallace Paiva Martins Junior
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Última publicação, Tomo Direito Administrativo e Constitucional, Edição 2, Abril de 2022
A Constituição de 1988 elevou a probidade em função pública no § 4º do art. 37 à posição de direito subjetivo público, cuja natureza é difusa. Trata-se da sublimação da ética na gestão da res publicae. O dever de probidade que daí se irradia descende diretamente do princípio da moralidade administrativa explicitado no caput do art. 37 e no inciso LXXIII do art. 5º.
A regra em cena estabeleceu que o ato de improbidade administrativa (isto é, aquele que infringe o dever respectivo) implicarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade de bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
A Constituição não projetou nesse preceito tão somente as sanções contra a improbidade administrativa, senão em sentido mais amplo enumerou algumas das consequências jurídicas da prática desse ato ilícito, indicando sanções (perda da função pública, suspensão dos direitos políticos etc.) e providências cautelares (indisponibilidade de bens). Tampouco é possível afirmar que a norma constitucional esgota todas as perspectivas de repressão aos atos de improbidade administrativa.
A norma em foco tem o sentido de manifestar mandado de censura à improbidade administrativa a latere de sua repressão penal e deve ser examinada de modo sistêmico com a integralidade do texto constitucional e os princípios que lhe informam, como os princípios republicano, democrático e de responsabilidade.
A responsabilidade no exercício do poder é elementar ao regime republicano. É assaz difundida a lapidar observação de Geraldo Ataliba que “a simples menção ao termo república já evoca um universo de conceitos intimamente relacionados entre si, sugerindo a noção do princípio jurídico que a expressão quer designar. Dentre tais conceitos, o de responsabilidade é essencial. Regime republicano é regime de responsabilidade".1 Ela também se imbrica à concepção do princípio democrático, como discorria J. H. Meirelles Teixeira ao pontuar que “irresponsabilidade é característica de regime despótico. Só é responsável quem administra a própria fazenda, os próprios negócios ou interesses. Mas na democracia os governantes são, por definição, meros representantes do povo, meros depositários de sua confiança para realizarem o Bem Comum. E todo representante ou depositário, por definição também, deve prestar contas e responder pela sua gestão”.2
Assim, por exemplo, encontra-se na Constituição outras matrizes (diretas ou indiretas) de punição de pessoas (físicas ou jurídicas) pela prática de atos de improbidade administrativa como, verbi gratia, no âmbito eleitoral (arts. 14, § 9º, e 15, V), administrativo (art. 41, II), penal (art. 37, § 4º, in fine), e político-administrativo (art. 85, V), sem embargo da própria prevenção do patrimônio público em face de atos tisnados por esse sério e grave defeito (arts. 5º, LXXIII, e 129, III). Destarte, as sanções da improbidade administrativa não se exaurem no § 4º do art. 37.
1. Sanções contra a improbidade administrativa
A sanção é a consequência pelo descumprimento da norma jurídica. Consiste na previsão normativa de reação à prática da ação por ele não querida porque agride bem jurídico tutelado. A responsabilidade consiste na imposição de consequências jurídicas à violação (omissiva ou comissiva) do ordenamento jurídico. Trata-se de comando secundário inerente às normas proibitivas ou determinantes.
Em obséquio à reserva absoluta de lei (lei em sentido formal, legalidade absoluta), a imposição de sanção exige precedência e depende de previsão nessa sede específica porque a reprimenda é fator de diminuição, limitação, ou restrição de direitos e liberdades fundamentais. A articulação de sanções contra a prática de ato de improbidade administrativa não escapa à essa compreensão.
A lei, neste caso, deve observar os módulos constitucionais de repartição de competências normativas e do modo de produção dos atos normativos. No caso das sanções civis, político-administrativas ou penais em face da improbidade administrativa, a competência é da União em caráter privativo, nos termos do quanto estatuído no art. 22, I, da Constituição de 1988. Com relação ao processo legislativo, não há em face das matérias articuladas no § 4º do art. 37 da Carta Magna reserva de lei complementar nem de iniciativa legislativa. A lei deve ser a ordinária, proposto o correlato projeto de lei à luz da iniciativa comum ou concorrente, porque não constante o assunto das reservas constitucionalmente adotadas e que merecem interpretação de direito estrito como normas excepcionais e taxativas. Por envolver direitos políticos e processuais não se admite seu trato por medida provisória não bastasse carecer-lhe de antemão quaisquer traços de urgência.
1.1. Sanções civis, penais, eleitorais, administrativas e político-administrativas
Na conformidade do acima exposto, é possível resumir que a repressão à improbidade administrativa se articula por sanções de natureza eleitoral (arts. 14, § 9º, e 15, V), administrativo (art. 41, II), civil e penal (art. 37, § 4º) e político-administrativo (art. 85, V). Sem prejuízo da responsabilidade comum a que todos os agentes públicos se subordinam, há círculos de responsabilidade especial relativamente a determinados agentes e que instituídos por conta da peculiaridade de suas próprias funções.
A responsabilidade civil pessoal por ação ou omissão no exercício de função pública (lato sensu) é subjetiva, dependendo de dolo ou culpa, e se estadeia principalmente nas Leis da Ação Popular e da Improbidade Administrativa (Leis 4.717/1965 e 8.429/1992), sem embargo da regressiva com lastro no § 6º do art. 37 da Constituição de 1988 quando o Poder Público tenha sido condenado a ressarcir dano causado a direito alheio e, é claro, desde que a ação ou omissão seja diretamente imputável ao agente público.
A Constituição de 1988 franqueia à lei complementar o estabelecimento de outros casos de inelegibilidade para proteção da probidade administrativa (art. 14, § 9º). Dessa missão cuida a Lei Complementar 64/1990 robustecida pela redação dada pela Lei Complementar 135/2010 – conhecida como “Lei Ficha Limpa”. Inelegibilidade, todavia, não é sanção, senão consequência decorrente, entre outros, da imposição de uma sanção como, por exemplo, com base na Lei da Improbidade Administrativa. Além disso, a Lei 9.504/1997 delineia condutas vedadas nas eleições (em especial no art. 73) destinadas também a assegurar a probidade administrativa, prevendo sanções como cassação de registro ou de diploma e multa.
A responsabilidade administrativa decorre da previsão do art. 41, II, da Constituição Federal, e é elementar à hierarquia, à autotutela e à controlabilidade que iluminam a Administração Pública. Ela se manifesta na responsabilidade disciplinar pela prática de infração funcional – inclusive por improbidade administrativa (art. 132, VI, da Lei 8.112, v.g.) – expondo seu autor a sanções como advertência, suspensão, demissão, aplicáveis pela própria Administração Pública com observância do devido processo legal em todas as suas perspectivas e potencialidades. Além disso, há outras esferas de responsabilidade administrativa como as decorrentes do exercício do controle externo (art. 71 da Constituição de 1988; art. 5º da Lei 10.028/2000).
O art. 85, V, da Constituição Federal, estatui a responsabilidade político-administrativa do Presidente da República por crime de responsabilidade e, dentre suas figuras, a que atente contra a probidade na Administração. O assunto foi regulado na Lei 1.079/1950 – que se estende a outros agentes políticos ali discriminados (Governadores de Estado, Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Procurador Geral da República) – que no inciso V do art. 4º repete a norma constitucional e no art. 9º cataloga os crimes de responsabilidade contra a probidade na administração. Essas infrações sujeitam seu autor às sanções de perda do cargo e inabilitação para o exercício de qualquer função pública por prazo determinado, conforme julgamento do Poder Legislativo.
Prefeitos estão sujeitos à responsabilidade por infração político-administrativa (art. 4º do Decreto-lei 201/1967), que implica a cassação do mandato pela Câmara Municipal, sem prejuízo da responsabilidade criminal específica (art. 1º). Vereadores que façam uso do cargo para a prática de atos de corrupção ou de improbidade administrativa, sujeitam-se à cassação (art. 7º, I, do Decreto-lei 201/1967), assim como os membros do Congresso Nacional por procedimento incompatível com o decoro parlamentar como na hipótese de recebimento de vantagens indevidas (art. 55, II, § 1º, da Constituição Federal).
A tutela repressiva da improbidade administrativa começou na legislação penal. O Código Penal arrola os denominados crimes contra a Administração Pública praticados por agentes públicos como o peculato, a corrupção passiva, a concussão, o emprego irregular de verbas públicas etc. Leis penais extravagantes também tipificam crimes funcionais, típicos de agentes públicos, como a Lei de Abuso de Autoridade (Lei 4.898/1965), e que correspondem à noção de improbidade administrativa.
Além da sanção privativa de liberdade, o Código Penal prevê como efeito da condenação – que torna certa a obrigação de reparar o dano e a perda de bens produto do crime – a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo (a) igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública, ou (b) superior a 04 (quatro) anos nos demais casos, estabelecendo que esse não é automático, devendo ser motivadamente declarado na sentença (art. 92).
1.2. Independência de instâncias
A diversidade de regimes de responsabilidade é funcionalmente resolvida pela independência de instâncias que alija de seu contexto receio ao bis in idem. Seu fundamento radica-se na diferenciação de bens jurídicos tutelados – a disciplina interna da Administração, o direito subjetivo público ao governo honesto etc. – e na natureza da resposta institucional do ordenamento jurídico.
A independência de instâncias de responsabilidade é consagrada em tradicionais regras do direito positivo: art. 935, Código Civil; art. 67, Código de Processo Penal; art. 125 da Lei 8.112/1990. Esta também é a tônica da Lei 8.429/1992. O caput do art. 12 enuncia a aplicabilidade das sanções de seus incisos I a III independentemente das sanções, penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, complementado pelo inciso II do art. 21 ao prescrever o seu cabimento independentemente da aprovação ou rejeição de contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas.
As potenciais exceções à incomunicabilidade de instâncias correm por conta das expressas previsões normativas, como, por exemplo, a absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou negativa de autoria.
E além disso há se considerar que, em regra, as decisões de caráter administrativo ou político-administrativo se sedimentam sobre contornos diferenciados das jurisdicionais e não têm entre seus predicados a eficácia da coisa julgada, não se sobrepondo a estas.
2. Sanções civis
Como visto, a Lei da Improbidade Administrativa institui sanções civis em face de atos de improbidade administrativa. O § 4º do art. 37 da Constituição de 1988 diferenciou a repressão civil da penal relativamente à improbidade administrativa, embora ambas em comum demandem imposição por decisão judicial observado o devido processo legal. Aliás, a natureza restritiva de direitos das sanções constitucionalmente previstas inibe sua imposição em outra instância senão a judicial distinta da jurisdição penal.
A Lei 8.429/1992 arrola no art. 12 as sanções civis típicas contra atos de improbidade administrativa. Convém obtemperar que ela só estabelece sanções pessoais aos autores, beneficiários ou partícipes de atos ímprobos, o que não impede a imposição de provimentos jurisdicionais em face do próprio ato jurídico impugnado. Antes de sua edição, as sanções civis relativas à prática de ato de improbidade administrativa – para além do domínio da ação popular – se restringiam à perda de bens amealhados ilicitamente, como previsto na Lei 3.164/1957 e na Lei 3.502/1958 – conquanto esta última permitisse cumulativamente o ressarcimento integral do dano.
As sanções civis contra o ato de improbidade administrativa são (a) a perda de bens, (b) a perda da função pública, (c) a suspensão temporária dos direitos políticos, (d) o pagamento de multa civil, (e) o ressarcimento do dano, e (f) a proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Destas, só constam do § 4º do art. 37 da Constituição de 1988 a perda da função pública, a suspensão dos direitos políticos e o ressarcimento do dano. A Lei 8.429/1992 acrescentou outras como o pagamento de multa civil, a proibição de contratação com o Poder Público ou do recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, e a perda de bens ou valores ilicitamente acrescidos.
Como já discorrido anteriormente,3 o acréscimo tem suficiente respaldo constitucional com base no princípio conformador elementar à atividade normativa infraconstitucional, uma vez que compete à legislação subconstitucional o estabelecimento de sanções ou penalidades contra o ato ilícito. A literatura assinala que não há qualquer inconstitucionalidade como, ad esempia, o faz Juarez Freitas ao observar que as sanções previstas na Constituição são principais, mas, o art. 37, § 4º, remete à legislação infraconstitucional a repressão da improbidade administrativa em traços não taxativos,4 e Cláudio Ari Mello que afasta qualquer inconstitucionalidade das sanções estipuladas na Lei Federal 8429/1992, assinalando a inexistência de restrição à liberdade de conformação da legislação ordinária para formulação de casos específicos de improbidade administrativa, fixação de limites mínimos e máximos para as sanções e a criação de novas reprimendas.5
Adicione-se que a Constituição Federal nos incisos XLV e XLVI do art. 5º traça as sanções constitucionalmente admissíveis contra o ato ilícito, e no inciso XLVII do mesmo preceito, as inadmissíveis. A barreira ao legislador infraconstitucional só seria imponível às sanções constitucionalmente inadmissíveis e, por isso, os incisos XLV e XLVI do art. 5º aplicam-se a ilícitos de qualquer natureza. Deste modo, a definição de sanções civis, administrativas, tributárias etc. contra o ato ilícito são outorgadas à competência da legislação infraconstitucional, que deve adotá-las dentre as constitucionalmente admissíveis. No exercício da outorga constitucional deferida à legislação, esta, na repressão da improbidade administrativa, tinha a prerrogativa de estabelecer as sanções admissíveis constitucionalmente contra o ato ilícito e não poderia se furtar à imposição das sanções previstas no art. 37, § 4º, da Constituição Federal, que constituem o mínimo repressivo indicado.
O art. 37, § 4º, da Carta Magna, ao preceituar a repressão civil à improbidade administrativa, aliás, remete à conformação normativa infraconstitucional a disciplina da forma e da gradação das sanções.
2.1. Classificação das sanções civis
As sanções discriminadas no art. 12 da Lei n. 8.429/92 são as seguintes: (a) perda de bens; (b) perda da função pública; (c) suspensão temporária dos direitos políticos; (d) pagamento de multa civil; (e) ressarcimento do dano; (f) proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. A lei adotou compreensão ampla de sanção, pois, ressarcimento do dano não é tecnicamente sanção concebida em sentido estrito como punição, senão obrigação ou efeito ou consequência da prática de ilícito.
Elas podem ser classificadas de acordo com sua natureza em sanções punitivas e reparatórias. As reparatórias consistem (a) no ressarcimento do dano e (b) na perda de bens. As punitivas subdividem-se em (a) restritivas de direitos (suspensão temporária de direitos políticos; proibição temporária de contratação com a Administração Pública ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios), (b) pecuniárias (pagamento de multa civil), e (c) extintivas de situações jurídicas (perda da função pública).
Sob enfoque distinto, Silvio Antonio Marques anota que a Lei 8.429/1992 contém no art. 12 obrigações civis (ressarcimento do dano e perda de bens ou valores) e sanções de privação ou interdição temporária de direitos (perda da função pública, suspensão de direitos políticos, pagamento de multa civil, proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios).6
2.2. Prescritibilidade e imprescritibilidade
Regra no direito nacional é a prescritibilidade da perspectiva sancionatória em obséquio à segurança jurídica. A imprescritibilidade é exceção que corre por conta de expressas ressalvas na Constituição.
Por essa razão, o art. 23 da Lei 8.429/1992 estabelece prazos prescricionais relativamente às sanções civis contra a improbidade administrativa.
Eles são divididos tecnicamente à vista da natureza permanente ou efêmera do vínculo do agente público nos incisos I e II do mencionado art. 23 que, com o advento da Lei 13.019/2014, foi acrescentado do inciso III com disposição própria a particulares fomentados pelo Poder Público.
No primeiro caso, a prescrição das sanções para os ocupantes de mandatos eletivos, cargos de provimento em comissão e funções de confiança é de 05 anos a partir do término da investidura.
No segundo caso, cuida-se da prescrição referente aos agentes públicos investidos em cargos ou empregos públicos, situação na qual o prazo será idêntico ao previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego. É a lei específica, de cada âmbito federativo, que fornecerá o lapso prescricional.
No terceiro caso, o prazo também é de 05 anos a partir da data de apresentação à Administração Pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único do art. 1º da Lei da Improbidade Administrativa, isto é, de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de 50% do patrimônio ou da receita anual.
Algumas situações particulares não foram evidenciadas pela Lei n. 8.429/92. São exemplos dessa constatação a omissão de regras próprias para a prescrição de atos de improbidade administrativa relativamente a servidores temporários, agentes públicos civis especiais ou honoríficos, e particulares beneficiários ou partícipes do ato de improbidade administrativa, bem como não trata de situações singulares como a de servidor titular de cargo de provimento efetivo investido em cargo comissionado e da reeleição de agentes políticos.
Os servidores temporários, contratados com base no art. 37, IX, da Constituição Federal (contrato temporário), e os agentes públicos civis especiais (ou agentes honoríficos), não se submetem ao prazo prescricional do inciso II do art. 23, que é específico dos titulares de cargo ou emprego público, ou seja, de posições permanentes na organização do poder. A lacuna deve ser suprida pela adoção do prazo quinquenal previsto no inciso I do art. 23 em virtude da identidade da natureza do vínculo com o Estado, precário e transitório, que os assemelha aos agentes públicos políticos eletivos ou comissionados ou aos servidores ocupantes de cargos de provimento em comissão.7
Na hipótese de designação ou nomeação de servidor público titular de cargo de provimento efetivo para o exercício de cargo de provimento em comissão, o prazo prescricional parametriza-se pelo inciso I do art. 23, como enuncia decisão a timbrar que “exercendo cumulativamente cargo efetivo e cargo comissionado, ao tempo do ato reputado ímprobo, há de prevalecer o primeiro, para fins de contagem prescricional, pelo simples fato de o vínculo entre agente e Administração pública não cessar com a exoneração do cargo em comissão, por ser temporário”.8
E “no caso específico de mandato eletivo, consoante exegese do art. 23, I, da Lei 8.429/1992, na hipótese de reeleição do agente político, o prazo prescricional para a ação de improbidade administrativa começa a fluir após o término ou cessação do segundo mandato, pois, embora distinto do primeiro, há uma continuidade do exercício da função pública, com a permanência do vínculo existente entre o agente e o ente político, uma vez que a lei não exige o afastamento do cargo para a disputa de novo pleito eleitoral”.9
Em relação a pessoas físicas ou jurídicas beneficiárias ou partícipes do ato de improbidade administrativa, referidas no art. 3º da Lei 8.429/1992, entende-se adequada a extensão das regras de seu art. 23.10 Decisão estampa que “aos particulares, réus na ação de improbidade administrativa, aplica-se a mesma sistemática atribuída aos agentes públicos para fins de fixação do termo inicial da prescrição”.11
Também a lei não oferece soluções para as causas de suspensão ou de interrupção da prescrição, o que conduz ao esforço interpretativo. Sérgio Turra Sobrane sugere, com propriedade, a incidência do art. 200 do Código Civil preceituando que “quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva”, bem como as causas de interrupção do Código Civil e do Código de Processo Civil.12 Além delas, devem incidir, no caso do inciso II do art. 23 da Lei da Improbidade Administrativa, as causas de suspensão e interrupção da responsabilidade disciplinar, já que há remissão ao instituto da prescrição no âmbito administrativo relativamente aos agentes públicos permanentes.
Em relação aos agentes públicos que têm vínculo permanente – agentes políticos vitalícios (magistrados e membros do Ministério Público e do Tribunal de Contas), servidores públicos stricto sensu (investidos em cargos públicos de provimento efetivo) e empregados públicos (investidos em empregos públicos) – a baliza da prescrição é a remissão à prescrição da sanção disciplinar prevista em lei específica para as hipóteses de demissão.
Como os empregados públicos estão sujeitos à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e não ao estatuto, e aquela não prevê prescrição, é razoável dispensar-lhe, por analogia, o prazo prescricional do art. 23, I, da Lei 8.429/1992.13
Por fim, somente prescrevem as sanções, não a obrigação de reparação do dano e nem as penalidades objetivam a reparação do dano material e moral (perda dos bens ilicitamente acrescidos e pagamento de multa civil). O ressarcimento do dano é imprescritível por força de expressa ressalva constante no § 5º do art. 37 da Constituição de 1988. Como a norma constitucional não distingue é razoável concluir que a imprescritibilidade alcança a reparação e punição de danos materiais e morais.
2.3. Irrelevância de prejuízo patrimonial ou locupletamento ilícito
A responsabilidade civil por ato de improbidade administrativa arquitetada na Lei 8.429/1992 independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo, evidentemente, quanto ao respectivo ressarcimento. É o que se anuncia no inciso I do art. 21 que “tem como finalidade ampliar o espectro objetivo de incidência da Lei de Improbidade Administrativa para abarcar atos alegadamente ímprobos que, por algum motivo alheio à vontade dos agentes, não cheguem a consumar lesão aos bens jurídicos tutelados – o que, na esfera penal, equivaleria à punição pela tentativa”.14 O preceito “autoriza a aplicação da norma sancionadora prevista nas hipóteses de lesão à moralidade administrativa”.15
A norma, cujo caráter expletivo é manifesto, robustece a noção conceitual da improbidade administrativa como comportamento que viola não somente valores patrimoniais, mas, sobretudo, a moralidade administrativa em si mesma considerada. Assim sendo, e fiel à concepção das três espécies de improbidade descritas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/1992 é imperioso gizar que sua caracterização notadamente no enriquecimento ilícito de agentes públicos no exercício de função pública (art. 9º) e no atentado aos princípios da administração pública (art. 11) prescinde de resultado material negativa no patrimônio público, salvo quando uma de suas figuras exija em sentido contrário.
Essa constatação é corroborada, aliás, pela atenta leitura dos incisos I e III do art. 12 da Lei da Improbidade Administrativa que oferecem o ressarcimento do dano como sanção (lato sensu) condicionada nas hipóteses de improbidade administrativa de enriquecimento ilícito de agentes públicos no exercício de função pública (art. 9º) e atentado aos princípios da administração pública (art. 11), às quais correspondem, quando emprega as fórmulas normativas “quando houver” e “se houver”.
2.4. Eficácia temporal
A exequibilidade das sanções da Lei 8.429/1992 obedece às normas processuais civis salvo a perda da função e a suspensão dos direitos políticos à vista de exceção expressa. Com efeito, o caput do art. 20 estabelece que “a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória”. É assaz relevante anotar que a exequibilidade das sanções baliza-se pela liturgia procedimental da Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), cuja regra referente ao recebimento dos recursos é o efeito devolutivo apenas, e que prevalece por sua especialidade em relação ao Código de Processo Civil. Mesmo assim, o juiz pode conceder, excepcionalmente, eficácia suspensiva nos termos do art. 14 da citada lei.16
Outra abordagem proveitosa sobre a eficácia temporal das sanções da Lei 8.429/1992 respeita ao dimensionamento do impacto da Lei Complementar 135/2010 – a denominada “Lei Ficha Limpa” – que alterou a Lei Complementar 64/1990 (Lei das Inelegibilidades).
A Lei Ficha Limpa alterou o art. 1º, I, da Lei Complementar 64/1990, incluindo a alínea l no art. 1º com a previsão de inelegibilidade decorrente de condenação por improbidade administrativa.17 Os requisitos dessa causa de inelegibilidade (que é consequência da suspensão dos direitos) são: (a) improbidade administrativa na forma dolosa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito; (b) condenação à suspensão dos direitos políticos (transitada em julgado ou recorrível, mas, decorrente de julgamento colegiado). O prazo de inelegibilidade é de 08 anos.
Portanto, não é qualquer condenação por ato de improbidade administrativa que implicará a inelegibilidade, somente aquela que reunir os requisitos normativos cumulativamente. Assim estima a jurisprudência ao sublinhar que “não é qualquer condenação por improbidade que obstará a elegibilidade, mas, tão somente, aquela resultante de ato doloso de agente público que, cumulativamente, importe em comprovado dano (prejuízo) ao erário e correspondente enriquecimento ilícito”.18
Se a construção legal é meritória por colmatar um sério vácuo no tocante à exequibilidade da condenação por improbidade administrativa para fins de inelegibilidade, não está imune de críticas porque desconsidera as diferentes espécies de improbidade, excluindo figuras graves (art. 9º, II, III, IV, VI, XI e XII, da Lei 8.429/1992) ou condenações à suspensão dos direitos políticos de isolados casos dos arts. 9º ou 10 e do art. 11 da Lei 8.429/1992. Ademais, a improbidade dispensa, nos arts. 9º e 11, prejuízo material. A legislação, portanto, está aquém do § 9º do art. 14 da Carta Magna.
E exibe ainda incoerência se cotejada a norma ao art. 1º, I, "j", da Lei Complementar 64/1990. Este dispositivo inclui a locução “conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais”, que remete ao art. 73 da Lei 9.504/1997, cujo § 7º se conecta à Lei 8.429/1992 ao cunhar que “as condutas enumeradas no caput caracterizam, ainda, atos de improbidade administrativa, a que se refere o art. 11, inciso I, da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, e sujeitam-se às disposições daquele diploma legal, em especial às cominações do art. 12, inciso III”. Embora prevaleça a independência de instâncias (art. 78 da Lei 9.504/1997 c.c. art. 12 da Lei 8.429/1992), ocorrendo qualquer das condutas do rol do art. 73 da Lei 9.504/1997, sancionadas com cassação do registro ou do diploma pela jurisdição eleitoral (art. 73, § 5º), haverá inelegibilidade fundada em improbidade administrativa da espécie atentado aos princípios da administração pública (art. 73, § 7º, da Lei 9.504/1997 c.c. arts. 11 e 12, III, da Lei 8.429/1992), que, todavia, isoladamente considerada não é motivo de inelegibilidade à luz da alínea l do inciso I do art. 1º da Lei Complementar 64/1990.
Aliás, o mesmo art. 1º, I, da Lei Complementar 64/1990 também experimentou alteração na alínea "g" que trata da hipótese de rejeição da prestação de contas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa. Neste caso, compete à Justiça Eleitoral definir se acoimam a rejeição da prestação de contas irregularidades insanáveis e, ainda, se elas consistem em ato doloso de improbidade administrativa, de modo que a rigidez da alínea l pode ser superada.
Inelegibilidade não é penalidade; é consequência de pena. Daí porque tratando o art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa da eficácia da sanção restritiva de direitos (consistente na suspensão temporária de direitos políticos, decorrente da condenação por improbidade administrativa), cujo termo a quo é a partir do trânsito em julgado, não se incompatibiliza com a inelegibilidade inscrita no art. 1º, I, l, da Lei Complementar 64/1990 na redação dada pela Lei Complementar 135/2010, que antecipa os efeitos da decisão recorrível para fins de negação à elegibilidade. Convém observar, no ponto, que isso não é incompatível com a Constituição de 1988; ao contrário, concilia-se com o texto constitucional cujo § 9º do art. 14 inscreve como requisitos de elegibilidade a moralidade para o exercício do mandato e a vida pregressa do candidato, como destacou o Supremo Tribunal Federal.19
2.5. Dimensão subjetiva
No aspecto subjetivo as sanções delineadas no art. 12 são aplicáveis aos agentes públicos e, por força do art. 3º da própria Lei 8.429/1992, aos particulares, pessoas físicas ou jurídicas, que sejam partícipes ou beneficiárias (diretas ou indiretas) do ato de improbidade administrativa, desde que tenham obrado com dolo ou culpa (esta, na espécie do art. 10).
É deveras importante frisar que estão sujeitos à incidência da Lei 8.429/1992 pessoas físicas e jurídicas, agentes públicos ou não, despossuída de qualquer sentido interpretação restritiva a sublinhar que a Lei da Improbidade Administrativa somente se aplica a agentes públicos.
O art. 2º fornece amplo conceito de agente público abrangendo todo aquele que exerce lato sensu função pública em cargo, função (stricto sensu) ou emprego público e mandato mediante eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo. Portanto, abrange agentes políticos (vitalícios ou eletivos), servidores e empregados públicos, agentes honoríficos, contratados temporários etc.
Por sua vez, o art. 3º estende a responsabilidade por improbidade administrativa àqueles que não sendo agentes públicos sejam partícipes ou coautores do ato por indução ou concurso ou, ainda, dele sejam beneficiários diretos ou indiretos. A tais pessoas, físicas ou jurídicas, serão aplicáveis as sanções legais que não sejam privativas de agentes públicos (perda da função pública, v.g.), e se pessoas jurídicas as que não sejam peculiares a pessoas naturais (suspensão dos direitos políticos, v.g.).
O art. 8º da Lei 8.429/1992 institui a regra da transmissibilidade das sanções ao enunciar que “o sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança”. Respeitados os entendimentos doutrinários e pretorianos em sentido contrário, o preceito em tela merece interpretação restritiva. A transmissibilidade é condicionada às forças da herança e é pertinente ao perdimento de bens ou valores ilicitamente adicionados e ao ressarcimento do dano, e não às demais sanções de caráter punitivo e que, por isso, são pessoais e intransmissíveis ao sucessor,20 o que é corroborado por uma leitura sistêmica do ordenamento jurídico, notadamente o art. 5º, XLV, da Constituição de 1988, e o art. 943 do Código Civil.
Afigura-se proveitoso discorrer nesta oportunidade sobre as relações entre as Leis 8.429/1992 e 12.846/2013. Não há como vingar tese que infira a exclusividade da Lei Anticorrupção Empresarial (Lei 12.846/2013) para punição de pessoa jurídica, supondo equivocadamente a inaplicabilidade da Lei da Improbidade Administrativa às pessoas jurídicas. A Lei 8.429/1992 não contém qualquer ressalva ou distinção no aspecto subjetivo. A responsabilidade civil subjetiva de pessoa jurídica de direito privado por improbidade administrativa não constitui novidade. Antes do advento da Lei 12.846/2013, ela poderia ser responsabilizada civil e subjetivamente por improbidade administrativa na qualidade de beneficiária ou partícipe (art. 3º da Lei 8.429/1992), em conjunto ou não com sócios, administradores e empregados, sujeitando-se à imposição, para além do ressarcimento do dano ao erário, das sanções de perda de bens, multa civil e proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Como resumiu a jurisprudência, “o sujeito particular submetido à lei que tutela a probidade administrativa, por sua vez, pode ser pessoa física ou jurídica. Com relação a esta última somente se afiguram incompatíveis as sanções de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos”.21
Ademais, a Lei 12.846/2013 se aplica exclusivamente a pessoas jurídicas pela prática de atos lesivos à Administração Pública por particulares (art. 5º), sujeitas a sanções administrativas e judiciais baseada em responsabilidade objetiva (arts. 2º, 6º e 19), enquanto a Lei 8.429/1992 incide em relação a agentes públicos e beneficiários ou partícipes pessoas físicas ou jurídicas (arts. 2º e 3º), sujeitando-as a sanções judiciais, fundada em responsabilidade subjetiva por atos de improbidade administrativa (arts. 9º a 12) baseados em ação ou omissão de agentes públicos em proveito próprio ou de terceiros, inclusive pessoas jurídicas de direito privado.
Enquanto a Lei 8.429/1992 pune ações ou omissões praticadas por agentes públicos em consórcio ou não com particulares, a Lei 12.846/2013 objetiva a punição de ilícitos praticados por particulares contra a Administração Pública. Em outras palavras, a responsabilidade civil pela prática de improbidade administrativa é subjetiva e se sedimenta em ação ou omissão de agente público que implique enriquecimento ilícito no exercício de função pública, prejuízo ao patrimônio público (em que ocorre enriquecimento ilícito de particular), ou atentado aos princípios da administração pública, ao passo que a responsabilidade civil de pessoa jurídica de direito privado pela prática de atos lesivos à Administração Pública é objetiva, e não pressupõe necessariamente ação ou omissão de agente público, pois, se configura pela prática de comportamento ilícito de particulares sem a participação danosa de agentes públicos em detrimento do Poder Público.
Corroborando o exposto, assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça ao enunciar que “a conduta dos agentes públicos, que constitui o foco da LIA, pauta-se especificamente pelos seus deveres funcionais e independe da responsabilização da empresa que se beneficiou com a improbidade” e que “convém registrar que a recíproca não é verdadeira, tendo em vista que os particulares não podem ser responsabilizados com base na LIA sem que figure no polo passivo um agente público responsável pelo ato questionado, o que não impede, contudo, o eventual ajuizamento de Ação Civil Pública comum para obter o ressarcimento do Erário”.22
Logo, se não há ação ou omissão ímproba imputável a agente público, mas, somente lesão ao patrimônio público ou aos princípios jurídico-administrativos, a hipótese será de incidência da Lei Anticorrupção Empresarial, ao passo que havendo o comportamento ímprobo de agente público ainda que em benefício de pessoa jurídica de direito privado, a situação é de aplicação da Lei da Improbidade Administrativa.
Neste sentido, Mateus Bertoncini discorre que
“(...) os ilícitos da Lei 12.846 são cometidos isoladamente pela pessoa jurídica em face da administração pública, ao passo que os atos de improbidade administrativa são praticados pelo agente público contra a administração estatal, direta ou indireta, possuindo o terceiro, dentre os quais a pessoa jurídica, papel coadjuvante em relação à pessoa física do agente público, induzindo, concorrendo ou se beneficiando do ato de improbidade administrativa. Em outras palavras, não há ato de improbidade administrativa sem a figura do agente público, diversamente dos atos lesivos da Lei sob comento, praticados exclusivamente pela pessoa jurídica. A participação de pessoas físicas nesses casos, servidor ou não, importará noutras formas de responsabilização pessoal, na medida da sua culpabilidade, como se demonstrará adiante. Disso se pode concluir que os atos lesivos da Lei 12.846/2013 não possuem natureza de ato de improbidade administrativa”.23
Essa opinião é comungada por Antonio Araldo Ferraz Dal Pozzo et alii ao precisarem que
“(...) como não estamos diante de uma lei que cuida de ato de improbidade administrativa, para cuja prática se exige um servidor público, mas diante de atos lesivos à Administração Pública, que são praticados por particulares, a lei cuida da matéria como sendo, praticamente, o reverso da medalha em relação à Lei de Improbidade Administrativa: enquanto nesta, para ser alcançado, o particular necessita que o agente público pratique um ato de improbidade para o qual, no entanto, ele induz ou concorre (art. 3º da Lei de Improbidade Administrativa), em caso de atos lesivos à Administração Pública deve haver unicamente o comportamento do particular. A atuação conjunta do servidor público sem dúvida desloca o fato para a Lei de Improbidade Administrativa”.24
Segue-se daí a adequada exegese do art. 3º da Lei 12.846/2013 a excluir a responsabilidade subjetiva de dirigentes e empregados de pessoa jurídica por atos lesivos à Administração Pública pela Lei 8.429/1992.
O preceito enuncia a concorrência da responsabilidade das pessoas jurídicas e de seus dirigentes, administradores, empregados e terceiros ao cunhar que “a responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito”. Ele se harmoniza com o ordenamento vigente que não é infenso à responsabilização da pessoa jurídica, como exemplificam o § 5º do art. 173 da Constituição de 198825 e o art. 32 da Lei 12.529/2011,26 solidariamente ou não à pessoa natural.
A independência dessa esfera de responsabilidade é reiterada no § 1º desse art. 3º da Lei 12.846/2013 ao estabelecer que “a pessoa jurídica será responsabilizada independentemente da responsabilização individual das pessoas naturais referidas no caput”. Todavia, a responsabilidade de dirigentes ou administradores é subjetiva, como informa o § 2º do art. 3º da lei, ao condicioná-la à culpabilidade,27 de tal sorte que, na Lei 12.846/2013, percebe-se claramente a instituição de duas ordens distintas de responsabilidade em função do critério da pessoa: a objetiva, das pessoas jurídicas; e a subjetiva, de seus dirigentes ou administradores.
No entanto, a lei não indica as sanções das pessoas físicas, dirigentes, sócios, administradores ou empregados. Esse vácuo autoriza a incidência da Lei 8.429/1992? Em linha de princípio, a resposta é negativa por se tratar de diploma legal de natureza diversa que pune agentes públicos e pessoas físicas ou jurídicas por atos de improbidade administrativa, cujo esteio é ação ou omissão de agente público em proveito próprio ou alheio. A responsabilidade aí deve ser apurada de acordo com outras normas civis, comerciais, criminais, administrativas etc. De qualquer forma, a lacuna demonstra a imperfeição da Lei 12.846/2013. Pois, a latere das sanções das sanções (administrativas e civis) cominadas à pessoa jurídica alcançaria os objetivos por ela perseguidos o delineamento de reprimendas a pessoas físicas que fossem dirigentes, sócios, administradores ou empregados. Serve a tanto o recurso, a título de amostragem, à responsabilidade dos diretores, membros de conselhos administrativos, fiscais e semelhantes, e gerentes de instituições financeiras (Leis 4.595/1964 e 6.024/1974) ou a Lei de Defesa da Concorrência (Lei 12.529/2011) que estatui responsabilidade solidária entre pessoas jurídicas e seus administradores.
A derradeira questão que empolga a dimensão subjetiva da Lei 8.429/1992 é a referente à sua aplicabilidade ou não aos agentes políticos. Não se anima com postura que institui nicho de imunidade do poder no regime republicano nem que adorna o impeachment como jurisdição excludente da responsabilidade dos agentes políticos à vista da inexistência de cláusula constitucional nesse sentido. O Supremo Tribunal Federal já definiu que “as condutas descritas na lei de improbidade administrativa, quando imputadas a autoridades detentoras de prerrogativa de foro, não se convertem em crimes de responsabilidade”,28 e que o regime de responsabilidade política não exclui o da Lei 8.429/1992.29 Há, no Superior Tribunal de Justiça, tendência afirmando que “excetuada a hipótese de atos de improbidade praticados pelo Presidente da República (art. 85, V), cujo julgamento se dá em regime especial pelo Senado Federal (art. 86), não há norma constitucional alguma que imunize os agentes políticos, sujeitos a crime de responsabilidade, de qualquer das sanções por ato de improbidade previstas no art. 37, § 4º. Seria incompatível com a Constituição eventual preceito normativo infraconstitucional que impusesse imunidade dessa natureza”.30
2.6. Correlação das sanções com a espécie de ato de improbidade
Gira em torno dos arts. 9º, 10, 11 e 12 da Lei 8.429/1992 um sentido de correlação temática entre a natureza do ato e a sanção. Com efeito, a sistemática adotada na Lei da Improbidade Administrativa dedica blocos de sanções constantes dos incisos I, II e III do art. 12 que são correspondentes a cada uma das espécies de atos de improbidade administrativa arrolados nos arts. 9º, 10 e 11, respectivamente.
Anote-se, preliminarmente, que o ato de improbidade administrativa é externamente considerado grave, mas a legislação, atendendo à gradação que o art. 37, § 4º, da Constituição confere à lei, estabelece diferenciados níveis de gravidade interna. O que se contém nos incisos do art. 12, como outrora discorrido, é uma escala de gravidade interna: “é lógico que o enriquecimento ilícito no exercício de funções públicas é o ato mais grave, tanto que suas sanções são mais severas e agudas, enquanto os atos que importam prejuízo financeiro ao patrimônio público estão num grau intermediário ou médio e os que atentam contra os princípios da administração pública têm menor grau de gravidade”.31
Silvio Antonio Marques comunga deste entendimento reverberando a coerência do legislador “na definição qualitativa e quantitativa de cominações civis por ato ímprobo, que variam conforme a gravidade das condutas, as quais foram divididas em três modalidades que preveem tipos classificados em ordem decrescente de importância, na visão do legislador. Os atos mais deletérios ao patrimônio e a outros interesses públicos provocam as cominações mais severas, enquanto os menos graves legitimam consequências jurídicas mais leves”.32
Logo, ao ato de improbidade da espécie enriquecimento ilícito (art. 9º) o juiz deve aplicar as sanções do inciso I do art. 12 da Lei 8.429/1992; se, todavia, for o ato subsumido ao art. 10, as do art. 12, II; e, se, por fim, nem um nem outro se configurar, mas, ocorrer improbidade da espécie de atentado aos princípios da administração pública o juiz deve adotar as reprimendas do art. 12, III.
Note-se que o art. 11 da Lei 8.429/1992 desempenha a função de norma residual: se o ato não for classificado como enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário (arts. 9º e 10) e denotar improbidade nem por isso estará o agente isento de responsabilização, conforme decide o Superior Tribunal de Justiça,33 conquanto seja de bom grado timbrar que a improbidade administrativa não se caracteriza, para efeito do art. 11, em mera irregularidade ou simples ilegalidade dissociada de desvio ético de conduta, desonestidade, má fé.34
Não é lícito ao juiz combinar ou mesclar as penalidades em descompasso à classificação de espécies de improbidade ou adotar outras não previstas em lei. Não há possibilidade para fixação dos limites das sanções aquém ou além das balizas previstas em lei nem para criação de outros parâmetros. Neste sentido, corretamente foi decidido que “a sanção de suspensão de seus direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos, além de perda da função e de proibição de contratar com o Poder Público, assim como receber incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente pelo prazo de 5 (cinco) anos, é a prevista no inciso II do artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa, sendo defeso aplicar-se multa diversa da prevista nesse dispositivo legal, ante as correspondências que a própria lei estabelece para as espécies de improbidade administrativa que define e reprime”.35 Também já se cancelou “a imposição da pena consistente na ‘devolução em dobro’ dos valores desviados não corresponde à nenhuma das espécies de sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa (art. 12 e incisos)”.36
Como frisado, impera correlação entre a espécie de improbidade administrativa e o bloco sancionador respectivo. Assim, por exemplo, se ocorrido enriquecimento ilícito de agente público a sentença só pode aplicar as sanções do inciso I do art. 12, por sua correspondência ao art. 9º. Contemplando cada uma dessas relações sanções fixas ou variáveis em função do tempo e do valor a dosimetria deve esclarecer a quantidade ou dimensão adotada dentro de cada um dos limites legais. Se, contudo, o ato praticado puder ser classificado em mais de uma espécie de improbidade administrativa, haverá o fenômeno da absorção, resolvendo-se pela espécie e consequente reprimenda de maior gravidade.
2.7. Aplicação cumulativa ou alternativa
Apesar de a Constituição Federal no art. 37, § 4º, ser impositiva ao determinar que aos atos de improbidade administrativa – sem distinção entre suas espécies – se aplicarem as sanções respectivas (o que indica sua natural cumulatividade), a Lei 12.120/2009 alterou o caput do art. 12 da Lei 8.429/1992 para explicitar que as sanções são aplicadas cumulativamente ou não, balizada a opção, motivada37 pelo juiz, pelos parâmetros legais de gravidade do fato, extensão do dano causado e proveito patrimonial obtido pelo agente (art. 12 e parágrafo único, da Lei 8.429/1992).
Se o juiz opta pela aplicação cumulativa ou não das sanções deverá fazê-lo, em qualquer caso, atendendo ao princípio da proporcionalidade (ou seja, da justa medida) que demanda o exame de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito e interdita tanto o excesso quanto a insuficiência (ou falta), fundamentando as razões pelas quais escolhe todas, algumas ou uma delas. Como já decidido, “a aplicação das penalidades previstas na norma exige que o magistrado considere, no caso concreto, ‘a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente’ (conforme previsão expressa contida no parágrafo único do art. 12 da Lei 8.429/1992). Assim, é necessária a análise da razoabilidade e proporcionalidade em relação à gravidade do ato de improbidade e à cominação das penalidades, as quais podem ocorrer de maneira cumulativa, embora não necessariamente”.38 Para esse fim, “o espectro sancionatório da lei induz interpretação que deve conduzir à dosimetria relacionada à exemplariedade e à correlação da sanção, critérios que compõem a razoabilidade da punição” sendo “necessária a observância da lesividade e reprovabilidade da conduta do agente, do elemento volitivo da conduta e da consecução do interesse público, para efetivar a dosimetria da sanção por ato de improbidade, adequando-a a finalidade da norma”.39
O legislador infraconstitucional, em atenção ao mandado constante do § 4º do art. 37 da Constituição de 1988 que se refere à forma e à gradação previstas em lei, estabeleceu blocos de sanções de natureza idêntica para as três espécies de improbidade administrativa, em que algumas são, todavia, variáveis em função do tempo e do valor de acordo com a gravidade do ato.
Da mesma maneira como obtemperado em relação à aplicação cumulativa ou não das sanções típicas da Lei de Improbidade Administrativa, o juiz deve fundamentar, em cada uma das escolhidas que admitem variação de tempo ou de valor, os patamares máximos ou mínimos.
Cumpre salientar que, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, o ressarcimento do dano, desde que ocorrida repercussão patrimonial negativa no erário, não é sanção, mas, consequência da lesão econômico-financeira, de tal sorte que é dever jurídico de restituição. Corolário é que “caracterizado o prejuízo ao erário, o ressarcimento não pode ser considerado propriamente uma sanção, mas apenas consequência imediata e necessária de reparação do ato ímprobo, razão pela qual não pode figurar isoladamente como penalidade”.40 Por isso, configurada a improbidade administrativa e pronunciada pelo juiz, (a) é inadmissível a isolada imposição desse dever convindo a adição de outras sanções cumulativamente ou não,41 e (b) se o agente resgata o dano nem por isso se elimina a imposição das sanções.42 Obviamente, se o juiz reputa que não houve improbidade administrativa não lhe é dado aplicar qualquer das sanções, mas, reconhecendo a ocorrência de dano, deve obrigar o responsável ao ressarcimento.
Como visto, não é possível repreender a improbidade exclusivamente pelo ressarcimento do dano. Se houve condenação somente a isso, então não se caracterizou improbidade (premissa que, aliás, vale para composição de lege ferenda). Não é dada a banalização da repressão à improbidade como se verificam em expedientes tendentes à imprecisão na tipificação do respectivo ato ou na compassiva aplicação de suas sanções, reduzindo-se generalizadamente o poderoso arsenal repressivo a sanções pecuniárias. Consectário é a inadmissibilidade, inclusive à luz da obrigatoriedade e da indisponibilidade, de o Ministério Público requerer na petição inicial esta ou aquela sanção.
3. Sanções em espécie
O exame particularizado de cada uma das sanções típicas (ou próprias) da Lei 8.429/1992 revela que o diploma legal dedicou a cada uma das espécies de atos de improbidade administrativa descritas nos arts. 9º, 10 e 11 blocos de sanções respectivas nos incisos I, II e III do art. 12, e que compreendem a perda de bens, a perda da função pública, a suspensão temporária dos direitos políticos, o pagamento de multa civil, o ressarcimento do dano, e a proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Como observado, é impossível a fixação dos limites das sanções aquém ou além das balizas previstas em lei nem para criação de outros parâmetros, pois, em matéria de sanções prevalece a reserva de lei e a adstrição aos seus limites.
Nesse catálogo há sanções variáveis e fixas. As fixas são a perda de bens ou valores ilicitamente acrescidos, a perda da função pública, o ressarcimento do dano. As sanções de suspensão temporária dos direitos políticos, pagamento de multa civil, e proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, são variáveis, como revelam os incisos I a III do art. 12, em função do período de restrição de direitos ou do valor da pena pecuniária. A doutrina aponta que a variação sopesa a “potencialidade lesiva” de cada espécie de ato de improbidade.43
A multa civil tem seu valor fixados em patamares máximo e mínimo e sua base de cálculo depende da natureza da infração. Em se tratando de ato de improbidade administrativa que substancia (a) enriquecimento ilícito, ela pode alcançar até 03 vezes o valor do acréscimo patrimonial, (b) prejuízo ao erário, até 02 vezes o valor do dano, e (c) atentado aos princípios da administração pública, até 100 vezes o valor da remuneração percebida pelo agente.
A suspensão de direitos políticos é de (a) 08 a 10 anos na hipótese de enriquecimento ilícito, (b) 05 a 08 anos no prejuízo ao erário, e (c) 03 a 05 anos no atentado aos princípios da administração pública.
Por sua vez, a proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pode se estender até (a) 10 anos na situação do art. 9º, (b) 05 anos na do art. 10, e (c) 03 anos na do art. 11.
3.1. Perda da função pública
A penalidade de perda da função pública deve ser entendida em sentido amplo alcançando todas as espécies de vínculo, funcional ou não, do agente público com a Administração Pública. Assim expressa o próprio art. 2º da Lei da Improbidade Administrativa que fornece conceito lato sensu de função pública, abrangente de relação jurídica estabelecida com o Estado mediante mandato, cargo, função (em sentido estrito), ou emprego público - independentemente de sua natureza vitalícia, política, efetiva, estável, precária, comissionada, remunerada, gratuita etc. - decorrentes de qualquer procedimento de investidura como eleição, nomeação, designação, contratação, credenciamento, requisição etc. Somente o particular desvinculado da Administração Pública, beneficiário ou partícipe do ato, escapa dessa penitência, como explicita a própria lei no art. 3º.
Como já discorrido,44 sua finalidade é extirpar da Administração Pública aquele que exibiu inidoneidade (ou inabilitação) moral e desvio ético para o exercício de função pública, expandindo-se para qualquer função pública que exerça, mesmo se em nível de governo diferente daquela executada quando praticado o ato ímprobo. Seria um evidente bill of indenity alforriar o sujeito da perspectiva da perda da função pública somente porque veio exercer função distinta daquela contemporânea aos fatos. O ordenamento jurídico vigente colima a perda da função pública ao agente público ímprobo justamente porque ele no exercício de cargo, emprego ou função pública, caracterizou-se como portador de inabilitação moral para o seu desempenho. Essa inabilitação moral não é restrita ao cargo que ocupava quando praticado o ato ímprobo, como se a mudança ou alteração da investidura cessasse imediatamente a sua incapacidade; acompanha o agente público porque ela é uma condição personalíssima, somente sendo abdicada a incidência da sanção de que se cuida, se o agente público não tem mais nenhum vínculo com a Administração Pública, de qualquer um dos níveis de governo ou de poderes.
Nesta linha, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “a sanção de perda da função pública visa a extirpar da Administração Pública aquele que exibiu inidoneidade (ou inabilitação) moral e desvio ético para o exercício da função pública, abrangendo qualquer atividade que o agente esteja exercendo ao tempo da condenação irrecorrível”,45 sendo “desinfluente o fato de exercer função pública distinta da de outrora” ou exercer mais de uma função pública o agente público, como ponderam Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves.46
Se inativo, a improbidade praticada na atividade era causa que impunha a desvinculação compulsória, motivo pelo qual a sentença cassa-lhe a aposentação.47
Mesmo sendo vitalícios magistrados e membros do Ministério Público podem ser processados por improbidade administrativa, admitida a imposição da perda da função porque decorrente de decisão transitada em julgado em processo judicial.48 Em se tratando de militares, a competência para o processamento e julgamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa é da Justiça Comum, e não da Militar, e não há óbice à perda da função pública. Neste sentido, explica a jurisprudência que
“(...) a jurisprudência do STF, que editou a Súmula 673, a demonstrar que a parte final do art. 125, § 4º, da CF/1988 não impede a perda da graduação do militar mediante procedimento administrativo. Assim consequentemente com muito mais razão, não deve haver impedimento quanto à perda da patente ou graduação resultar de condenação transitada em julgado na Justiça estadual comum, em razão das garantias inerentes ao processo judicial. Tendo tudo isso em conta, concluiu que a perda do posto, da patente ou da graduação dos militares pode ser aplicada na Justiça estadual comum nos processos de sua jurisdição sem afronta ao disposto no referido artigo da CF/1988”.49
3.2. Perda de bens
O ato de improbidade administrativa de enriquecimento ilícito do agente implica a perda dos respectivos bens ou valores dele oriundos porque o acréscimo não tem justa causa. Trata-se de sanção de natureza ressarcitória inspirada por um componente preponderantemente moral.50 Como expõe Eurico Ferraresi, “o agente público ou o terceiro não perdem bens ou valores; apenas restituem o que ilicitamente tomaram do Estado. Tecnicamente, a perda dos bens ou valores não tem natureza de sanção, mas de restituição do que subtraído do patrimônio público”.51 Em verdade, bens ou valores foram ilicitamente acrescidos ou porque desviados do patrimônio estatal ou porque foram apropriados de particulares sem causa lícita por conta de função pública exercida.
Tais bens revertem à pessoa jurídica lesada (art. 18 da Lei 8.429/1992) e, segundo a jurisprudência, “como bem posto por Emerson Garcia ‘é relevante observar ser inadmissível que ao ímprobo sejam aplicadas unicamente as sanções de ressarcimento do dano e de perda de bens, pois estas, em verdade, não são reprimendas, visando unicamente à recomposição do status quo’ (Improbidade Administrativa. Editora Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2ª ed., 2004, p. 538)”.52 Bem por isso, é impositiva e compulsória sua aplicação havendo enriquecimento ilícito.
A perda de bens se assenta sobre os requisitos do locupletamento de uma parte, do empobrecimento de outra, da falta de justa causa e do nexo de causalidade. A perda só tem lugar em razão da ilicitude ou da imoralidade do enriquecimento. O perdimento alcança o objeto do enriquecimento ilícito, bem como seus frutos e produtos. Se os bens são fungíveis (como o dinheiro) incide, se consumido, sobre o equivalente existente no patrimônio do infrator (art. 884 e parágrafo único, Código Civil), como outrora explicado.53
A Constituição Federal admite a perda de bens como penalidade, sujeita ao devido processo legal (art. 5º, XLV, XLVI e LIV), e que não se confunde com o confisco.54 Não há como sustentar seu descabimento por falta de previsão constitucional: “se o constituinte a previu como consequência da prática da improbidade foi, precisamente, no intuito de se impor ao autor da ilicitude a perda de tais bens, ou seja, como antecedente lógico e necessário do perdimento, como remédio predisposto a restauração da integridade do erário”,55 já que “o sequestro e o perdimento de bens têm origem constitucional (art. 5º, XLV, XLVI, alínea b; e art. 37, § 4º, da Constituição Federal)”.56
A perda de bens incide sobre o proveito, direta ou indiretamente, positiva ou negativamente, acrescido ao patrimônio. Será obrigatória nos casos de enriquecimento ilícito (arts. 6º, 9º e 12, I), mesmo que a vantagem indevida tenha sido obtida por prestação negativa, circunstância que autoriza a desapropriação do importe equivalente constante do patrimônio do réu pela verificação do que efetivamente poupou com a obtenção da vantagem. Nos casos de prejuízo ao erário (art. 10), é condicionada a existência dessa circunstância (art. 12, II), admitindo-se a cumulação, como se dá nas hipóteses dos art. 9º, IV e XII, e art. 10, XII e XIII, pois, de um lado haverá a perda do proveito acrescido e, de outro, o ressarcimento do gasto injusto suportado pelos cofres públicos para que aquele proveito ocorresse. A mesma cumulação ocorre nas hipóteses previstas no art. 9º, II a IV, e no art. 10, II, IV e V. Aplica-se ao agente público, aos terceiros beneficiários, partícipes e aos seus sucessores nos termos do art. 8º da lei.
Em muitos casos, será o beneficiário que deverá perder em favor do erário os bens ou valores ilicitamente acrescidos quando o agente público facilita para que ele enriqueça ilicitamente mediante, por exemplo, o uso de bens ou serviços públicos ou mesmo o partícipe que, por simulação, adquiriu em seu nome bens produto do enriquecimento ilícito de agente público. Por isso, ela pune o enriquecimento direto do agente público ou indireto, quando este usa terceiros. O art. 6º revela que o enriquecimento ilícito provocará a perda dos bens ou valores acrescidos ao patrimônio do agente público, partícipe ou do terceiro beneficiário, demonstrando que estes últimos estão sujeitos a essa sanção e, não somente, o agente público.
Esta disposição geral do art. 6º liga-se às sanções previstas no art. 12, I e II, da Lei 8429/1992, explicitando o seu alcance, sendo complementada pela regra do art. 18, que indica o destinatário de sua eficácia. O perdimento, que atinge bens e valores, é sanção e não efeito da condenação, como ocorre na instância criminal.
3.3. Suspensão temporária dos direitos políticos
As pessoas físicas, agentes públicos ou particulares beneficiários ou partícipes de atos de atos de improbidade administrativa estão sujeitas à suspensão temporária dos direitos políticos. Sua previsão se encontra, para além do § 4º do art. 37 da Constituição de 1988, no inciso V do art. 15 da Carta Magna.57
A penalidade visa a subtrair a capacidade cívica do cidadão, impedindo disputa e investidura em mandato eletivo porque tolhe a elegibilidade, a assunção de qualquer outra função pública (cargo ou emprego público, de natureza efetiva, comissionada ou vitalícia; função honorífica), e o direito de promoção de ação popular.
Constitui restrição de direitos, substanciando a inabilitação temporária para o exercício de função pública. Se o agente público encerrou sua investidura definitiva ou temporária, não se escoima dessa inabilitação projetada para o futuro. Outrossim, se o agente ainda exerce o posto, ou é detentor de outro em acumulação, a suspensão temporária dos direitos políticos tem o efeito de gerar a perda da função pública, pois, o inabilita para o exercício de qualquer função pública. A cidadania, não é ocioso obtemperar, é condição de acesso a cargos, funções ou empregos públicos, bem como de sua permanência. Neste sentido, a literatura pondera que se a suspensão dos direitos políticos for aplicada a ato anterior e o agente estiver exercendo outra função pública durante sua execução, ela “produz o seu afastamento do cargo, tenha ou não sido ele condenado à pena de perda da função pública” porquanto fulmina seus direitos políticos que compreendem o jus suffragi, o jus honorum, o jus ad officium e o jus in officio, isto é, os direitos de votar e ser votado, de ocupar cargos, funções ou empregos públicos e o de neles permanecer.58
Essa sanção é variável conforme a espécie de improbidade administrativa praticada, como revelam os incisos I a III do art. 12, tendo o juiz arbítrio para fixação do mínimo e do máximo legais previstos, considerando o disposto no parágrafo único do art. 12. Entretanto, não tem o julgador liberdade total, pois, acentua Fábio Medina Osório, que a regra “é a imposição da sanção nos limites mínimo e máximo previstos pelo legislador”.59
A finalidade da suspensão dos direitos políticos, punitiva da inabilitação moral do sujeito, é suprimir por prazo certo o gozo dos direitos políticos, evitando que mantenha ou adquira outra ou nova função pública, pois o ato praticado revela sua inabilitação ética para tanto.
A sanção é exequível desde o trânsito em julgado da condenação (art. 20 da Lei 8.429/1992). Ela, como visto, poderá gerar inelegibilidade nos termos do art. 1º, I, l, da Lei Complementar 64/1990, desde que oriunda de decisão irrecorrível ou recorrível proferida por órgão judicial colegiado por enriquecimento ilícito e lesão ao patrimônio público dolosos, incidente desde a publicação da decisão.
3.4. Pagamento de multa civil
A multa civil representa uma sanção pecuniária contra o dano moral60 experimentado pela Administração Pública. Neste sentido, Juarez Freitas explica que a multa civil, potencialmente de elevada monta, reúne forças mais do que razoáveis para assumir o lugar deste ressarcimento por dano moral.61 A doutrina se divide em torno de sua natureza jurídica: entende Eurico Ferraresi, fazendo coro a Sérgio Turra Sobrane,62 que ela tem natureza sancionatória e não ressarcitória,63 enquanto Silvio Antonio Marques a considera indenizatória.64
Não se deve olvidar que a tutela de interesses transindividuais abrange também o dano moral, como esclarece a Lei 7.347/1985. Por isso, a multa civil é própria para punição do dano moral pela prática de ato improbidade administrativa, cumulada ou não com o ressarcimento de dano material.
Ela tem alíquota e base de cálculo variável, conforme a espécie de improbidade administrativa praticada. Esta multa é receita extratributária da entidade interessada (art. 1º), fixada nos limites máximos e mínimos, segundo os critérios de dosimetria do parágrafo único do art. 12, sendo revertida para o patrimônio da entidade interessada.65
3.5. Proibição de contratação com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios
A proibição de contratação com o Poder Público e de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios consiste em suspensão temporária do exercício de direitos por aqueles que praticaram ato de improbidade administrativa, impedindo que possam negociar com a Administração Pública ou se beneficiar de fomento público.
A penalidade tem singular eficácia contra o particular beneficiário da improbidade administrativa que não se alforria do dever de boa-fé em suas relações com o Poder Público, sancionando aquele que demonstrou inidoneidade.
É uma sanção de prazo certo, fixado nos limites previstos variáveis, conforme a espécie de improbidade administrativa (art. 12, I a III), sendo semelhante a que existe em outros diplomas legais – por exemplo, o art. 86, III, da Lei 8.666/1993.
Essa suspensão é absoluta, irradiando-se para todo e qualquer nível de governo (federal, estadual e municipal) e de administração (direta, indireta e fundacional). O ressarcimento do dano não cessa sua eficácia. A vedação admite a forma indireta, exemplificando a lei que se aplica ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, de modo que é plenamente cabível nos casos de sucessão societária, consórcios, sociedade em conta de participação etc. Embora seja aplicável à pessoa jurídica também, nada impede sua incidência sobre seus sócios com o emprego da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Assim como não se impede aplicação da desconsideração inversa, tal como prevista no Código de Processo Civil (art. 133, § 2º) e cujos contornos foram fixados pela jurisprudência.66 Se na desconsideração se alcança a pessoa física porque a pessoa jurídica é o artifício para a prática de ilícitos e não tem bens para responder, na desconsideração inversa se atinge a pessoa jurídica porque a prática de ilícitos é imputável ao administrador que é insolvente.
A sanção prevista no art. 12 da Lei 8.429/1992 aplica-se tanto a agentes públicos, quanto a particulares e se projeta em qualquer nível administrativo (federal, estadual ou municipal),67 mas, adverte a literatura, que, no tocante ao fomento público, veda somente a outorga de benefícios e incentivos fiscais ou creditícios condicionados e especiais, e não os gerais e incondicionados.68 No tocante à contratação com o Poder Público a lei utiliza fórmula que inibe tanto a participação em qualquer modalidade de licitação quanto o recurso a qualquer forma de contratação (ou convenção em sentido amplo).
3.6. Ressarcimento do dano
O ressarcimento do dano, já previsto no art. 5º da Lei da Improbidade Administrativa, é preceito que se enraíza nas tradicionais disposições do sistema jurídico, consistindo na recomposição do patrimônio lesado. Como já acenado, não se trata propriamente de sanção, mas, obrigação resultante da prática de ato ilícito.
Na Lei 8.429/1992, ela é de imposição obrigatória na hipótese de prejuízo ao erário (art. 10), e condicionado à sua efetiva prova nas de enriquecimento ilícito e atentado aos princípios da administração. De qualquer modo, se não houver dano patrimonial nestas hipóteses, isso não descaracteriza a improbidade, como esclarece o art. 21, I.
Sob o ângulo subjetivo, ela alcança o agente público e terceiros particulares beneficiários ou partícipes ex vi da cláusula do art. 3º da Lei 8.429/1992, em regime de solidariedade. A obrigação é transmissível aos sucessores no limite das forças da herança (art. 8º da Lei 8.429/1992).
Para tanto, é mister o concurso dos seguintes requisitos: ação ou omissão dolosa ou culposa, repercussão financeira negativa (resultado) e nexo causal entre a ação ou omissão e o resultado (inclusive nos casos de benefício indireto), ainda que a lesividade possa ser presumida como ocorre nos casos do art. 10 da Lei 8.429/1992 a exemplo do que se dá no art. 4º da Lei 4.716/1965 (Lei da Ação Popular).
O ressarcimento do dano deverá ser integral, ou seja, abrangerá tudo aquilo que representa a expressão do dano, prendendo-se a noção de restitutio in integrum, impondo, portanto, correção monetária, juros etc. O ressarcimento integral do dano é o corolário do ato ilícito e é sanção imprescritível nos termos do art. 37, § 5º, da Constituição Federal. A quantificação do dano não corresponde obrigatoriamente à totalidade de um dispêndio público, podendo ser encontrada pela apuração da quantia correspondente à lesão e à redução patrimonial experimentada.
O ressarcimento do dano visa à recomposição do prejuízo material experimentado pela entidade lesada pelo ato de improbidade administrativa, e, por isso, a ela reverte nos termos do art. 18 da Lei 8.429/1992 que prevalece sobre o art. 13 da Lei 7.347/1985 em virtude do critério da especialidade.
Suportam o ressarcimento do dano os bens do patrimônio do devedor – presentes, pretéritos ou pósteros (art. 942, Código Civil; art. 789, Código de Processo Civil).
Notas
1 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição, p. 65.
2 TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de direito constitucional, p. 466.
3 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 370-371, n. 58.
4 FREITAS, Juarez. Do princípio da probidade administrativa e sua máxima efetivação. Revista de direito administrativo, nº 204/73.
5 MELLO, Cláudio Ari. Improbidade administrativa - considerações sobre a Lei nº 8.429/92. Cadernos de direito constitucional e ciência política, nº 11/57.
6 MARQUES, Silvio Antonio. Improbidade administrativa: ação civil e cooperação jurídica internacional, p. 131.
7 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 381-382, n. 60.
8 STJ, REsp 1.060.529-MG, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 08-09-2009, v.u., DJe 18-09-2009.
9 STJ, AgRg-REsp 1.510.969-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Regina Helena Costa, 27-10-2015, v.u., DJe 11-11-2015.
10 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, p. 384, n. 60.
11 STJ, AgRg-AREsp 161.126-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Assusete Magalhães, 02-06-2016, v.u., DJ 13-06-2016.
12 SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa e coisa julgada, pp. 187-193.
13 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, p. 384, n. 60.
14 STJ, REsp 1.014.161-SC, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 17-08-2010, v.u., DJe 20-09-2010.
15 STJ, REsp 711.732-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 28-03-2006, v.u., DJ 10-04-2006, p. 139.
16 STJ, REsp 1.523.385-PE, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, 13-09-2016, v.u., DJe 07-10-2016.
17 Aos que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena.
18 STJ, MC 17.110-PE, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 10-08-2010, m.v., DJe 20-09-2010.
19 STF, ADI 4.578-AC, ADC 29-DF, ADC 30-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, 16-02-2012, m.v., DJe 29-06-2012.
20 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, p. 325, n. 45.
21 STJ, REsp 1.038.762-RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, 18-08-2009, v.u., DJe 31-08-2009.
22 STJ, REsp 896.044-PA, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, 16-09-2010, v.u., DJe 19-04-2011.
23 SANTOS, José Anacleto Abduch; BERTONCINI, Mateus; COSTÓDIO FILHO, Ubirajara. Comentários à Lei 12.846/2013: Lei anticorrupção, p. 155.
24 Antonio Araldo Ferraz Dal Pozzo, Augusto Neves Dal Pozzo, Beatriz Neves Dal Pozzo e Renan Marcondes Facchinatto. Lei Anticorrupção: apontamentos sobre a Lei nº 12.846/2013, pp. 52-53.
25 “A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular”.
26 “As diversas formas de infração da ordem econômica implicam a responsabilidade da empresa e a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores, solidariamente”.
27 “Os dirigentes ou administradores somente serão responsabilizados por atos ilícitos na medida da sua culpabilidade”.
28 RTJ 211/225.
29 “MEDIDA CAUTELAR INOMINADA INCIDENTAL – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – AGENTE POLÍTICO – COMPORTAMENTO ALEGADAMENTE OCORRIDO NO EXERCÍCIO DE MANDATO DE GOVERNADOR DE ESTADO – POSSIBILIDADE DE DUPLA SUJEIÇÃO TANTO AO REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO POLÍTICA, MEDIANTE ‘IMPEACHMENT’ (LEI Nº 1.079/50), DESDE QUE AINDA TITULAR DE REFERIDO MANDATO ELETIVO, QUANTO À DISCIPLINA NORMATIVA DA RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI Nº 8.429/92) – EXTINÇÃO SUBSEQUENTE DO MANDATO DE GOVERNADOR DE ESTADO – EXCLUSÃO DO REGIME FUNDADO NA LEI Nº 1.079/50 (ART. 76, PARÁGRAFO ÚNICO) – PLEITO QUE OBJETIVA EXTINGUIR PROCESSO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, EM RAZÃO DE, À ÉPOCA DOS FATOS, A AUTORA OSTENTAR A QUALIDADE DE CHEFE DO PODER EXECUTIVO – LEGITIMIDADE, CONTUDO, DE APLICAÇÃO, A EX-GOVERNADOR DE ESTADO, DO REGIME JURÍDICO FUNDADO NA LEI Nº 8.429/92 – DOUTRINA – PRECEDENTES – REGIME DE PLENA RESPONSABILIDADE DOS AGENTES ESTATAIS, INCLUSIVE DOS AGENTES POLÍTICOS, COMO EXPRESSÃO NECESSÁRIA DO PRIMADO DA IDEIA REPUBLICANA – O RESPEITO À MORALIDADE ADMINISTRATIVA COMO PRESSUPOSTO LEGITIMADOR DOS ATOS GOVERNAMENTAIS – PRETENSÃO QUE, SE ACOLHIDA, TRANSGREDIRIA O DOGMA REPUBLICANO DA RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS – DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO À AÇÃO CAUTELAR – INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DE AGRAVO – PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA POR SEU IMPROVIMENTO – RECURSO DE AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO” (STF, AgR-AC 3.585-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, 02-09-2014, v.u., DJe 28-10-2014).
30 STJ, Rcl 2.790-SC, Corte Especial, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, 02-12-2009, v.u., DJe 04-04-2011.
31 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, p. 327, n. 46.
32 MARQUES, Silvio Antonio. Improbidade administrativa: ação civil e cooperação jurídica internacional, p. 129.
33 STJ, REsp 1.026.516-MT, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 22-02-2011, v.u., DJe 07-04-2011; STJ, REsp 1.038.736-MG, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, 04-05-2010, v.u., DJe 28-04-2011; STJ, REsp 884.083-PR, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, 18-10-2007, m.v., DJe 16-04-2008.
34 “3. O entendimento majoritário desta Corte Superior é no sentido de que a configuração de ato de improbidade administrativa exige, necessariamente, a presença do elemento subjetivo, inexistindo a possibilidade da atribuição da responsabilidade objetiva na esfera da Lei 8.429/92” (STJ, REsp 875.425-RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Denise Arruda, 09-12-2008, v.u., DJe 11-02-2009).
“9. A exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público, deve se realizada cum granu salis, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público, preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir além de que o legislador pretendeu” (STJ, REsp 797.671-MG, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 05-06-2008, v.u., DJe 16-06-2008).
35 STJ, REsp 365.087-PR, 1ª Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 17-11-2009, v.u., DJe 03-12-2009.
36 STJ, REsp 1.376.481-RN, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 15-10-2015, v.u., DJe 22-10-2015.
37 STJ, REsp 658.389-MG, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, 26-06-2007, v.u., DJ 03-08-2007, p. 327.
38 STJ, REsp 1.376.481-RN, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 15-10-2015, v.u., DJe 22-10-2015.
39 STJ, REsp 1.130.198-PR, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 02-12-2010, v.u., Dje 15-12-2010.
40 STJ, REsp 1.376.481-RN, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 15-10-2015, v.u., DJe 22-10-2015.
41 STJ, REsp 1.019.555-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, 16-06-2009, v.u., DJe 29-06-2009.
42 STJ, REsp 1.009.204-MG, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, 01-12-2009, v.u., DJe 17-12-2009.
43 SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa e coisa julgada, p. 156.
44 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 363-364, n. 56.
45 STJ, REsp 924.439-RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, 06-08-2009, v.u., DJe 19-08-2009.
46 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa, pp. 449-450.
47 O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo expressou que “a perda da função pública deve ser compreendida em sentido amplo, alcançando as várias espécies de vínculo, funcional ou não, do agente público com a Administração Pública, de modo a valer então, para o agente inativo, da seguinte maneira: a improbidade praticada na atividade era causa que impunha a desvinculação compulsória, motivo pelo qual a sentença anula a aposentação e aplica-lhe a perda da função pública” (TJSP, ACP 81.025-0/7-00, São Paulo, Órgão Especial, Rel. Des. Palma Bisson, m.v., 29-07-2009). Nesse julgamento foi trazida à baila a impossibilidade do decreto de cassação da aposentadoria em razão do caráter contributivo do sistema previdenciário. Ora, assentado que a cassação da aposentadoria equivale à demissão e à perda da função pública por motivo ocorrido na atividade, o caráter contributivo de benefício previdenciário não impede sua incidência, reportando-se o julgado a pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal (MS 23.219-9-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 30-06-2005, DJ 19-08-2005).
48 STJ, REsp 1.298.092-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Regina Helena Costa, 09-08-2016, v.u., DJe 15-09-2016; STJ, REsp 1.191.613-MG, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 19-03-2015, v.u., DJe 17-04-2015; STJ, REsp 1.249.531-RN, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 20-11-2012, v.u., DJe 05-12-2012; STJ, REsp 1.169.762-RN, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 10-08-2010, v.u., DJe 10-09-2010.
49 STJ, CC 100.862-MG, 1ª Seção, Rel. Min. Castro Meira, 10-06-2009, v.u., DJe 18-06-2009.
50 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 346-349, n. 53.
51 FERRARESI, Eurico. Improbidade administrativa: Lei 8.429/92 comentada, p. 139.
52 STJ, REsp 1.019.955-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, 16-06-2009, v.u., DJe 29-06-2009.
53 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 346-349, n. 53.
54 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1967, t. V, pp. 196-200; FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira, pp. 602-603; MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal anotada, pp. 444-445.
55 PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade administrativa, pp. 133-134.
56 ARAÚJO, Edmir Netto de. O ilícito administrativo e seu processo, pp. 231-232.
57 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 369-370, n. 57.
58 MARQUES, Silvio Antonio. Improbidade administrativa: ação civil e cooperação jurídica internacional, p. 135.
59 Fábio Medina Osório. Improbidade administrativa: observações sobre a Lei 8.429/92, p. 173.
60 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 370-374, n. 58.
61 Juarez Freitas. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais, p. 118.
62 SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa e coisa julgada, pp. 160-161.
63 FERRARESI, Eurico. Improbidade administrativa: Lei 8.429/92 comentada, p. 146.
64 MARQUES, Silvio Antonio. Improbidade administrativa: ação civil e cooperação jurídica internacional, p. 136.
65 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 370-374, n. 58.
66 “III – A desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador. IV – Considerando-se que a finalidade da disregard doctrine é combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios, o que pode ocorrer também nos casos em que o sócio controlador esvazia o seu patrimônio pessoal e o integraliza na pessoa jurídica, conclui-se, de uma interpretação teleológica do art. 50 do CC/02, ser possível a desconsideração inversa da personalidade jurídica, de modo a atingir bens da sociedade em razão de dívidas contraídas pelo sócio controlador, conquanto preenchidos os requisitos previstos na norma. V – A desconsideração da personalidade jurídica configura-se como medida excepcional. Sua adoção somente é recomendada quando forem atendidos os pressupostos específicos relacionados com a fraude ou abuso de direito estabelecidos no art. 50 do CC/02. Somente se forem verificados os requisitos de sua incidência, poderá o juiz, no próprio processo de execução, ‘levantar o véu’ da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens da empresa” (STJ, REsp 948.117-MS, 3ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, 22-06-2010, v.u., DJe 03-08-2010, RT 901/169).
67 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa, pp. 370-374, n. 58.
68 SOBRANE, Sérgio Turra. Improbidade administrativa: aspectos materiais, dimensão difusa e coisa julgada, p. 164.
Referências
ARAÚJO, Edmir Netto de. O ilícito administrativo e seu processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.
ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998.
DAL POZZO, Antonio Araldo Ferraz; DAL POZZO, Augusto Neves; DAL POZZO, Beatriz Neves; FACCHINATTO, Renan Marcondes. Lei Anticorrupção: apontamentos sobre a Lei nº 12.846/2013. 2. ed. São Paulo: Contracorrente, 2015.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição brasileira. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 1984.
FERRARESI, Eurico. Improbidade administrativa: Lei 8.429/92 comentada. Rio de Janeiro: Forense, 2011.
FREITAS, Juarez. Do princípio da probidade administrativa e sua máxima efetivação. Revista de direito administrativo, v. 204, abr./jun., 1996.
__________________. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. São Paulo: Malheiros Editores, 1997.
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
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MELLO, Cláudio Ari. Improbidade administrativa - Considerações sobre a Lei nº 8.429/92. Cadernos de direito constitucional e ciência política, v. 11, abr./jun., 1995.
MELLO FILHO, José Celso de. Constituição Federal anotada. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1986.
MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987. Tomo V.
PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Márcio Fernando Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade administrativa. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1998.
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TEIXEIRA, J. H. Meirelles. Curso de direito constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991.
Citação
MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Sanções por ato de improbidade administrativa. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Direito Administrativo e Constitucional. Vidal Serrano Nunes Jr., Maurício Zockun, Carolina Zancaner Zockun, André Luiz Freire (coord. de tomo). 2. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2021. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/29/edicao-2/sancoes-por-ato-de-improbidade-administrativa
Edições
Tomo Direito Administrativo e Constitucional, Edição 1,
Abril de 2017
Última publicação, Tomo Direito Administrativo e Constitucional, Edição 2,
Abril de 2022
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