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Coisa julgada
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Thereza Alvim
,José Manoel de Arruda Alvim Netto
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Tomo Processo Civil, Edição 2, Julho de 2021
O instituto da coisa julgada se destina a tornar definitiva uma solução dada pelo Poder Judiciário a determinada controvérsia que a ele tenha sido submetida. É dividida, em geral, em duas espécies, a coisa julgada formal e a coisa julgada material. A coisa julgada formal significa que, em determinado processo, houve uma última decisão, por meio da qual se colocou seu termo final, sem que contra ela tenha sido interposto qualquer recurso. Constitui-se a coisa julgada forma em uma imutabilidade do decisum somente no âmbito do processo em que foi prolatado. Por sua vez, a coisa julgada material é a qualidade de imutabilidade e indiscutibilidade, ou mais precisamente, a autoridade, com a qual resta revestida uma determinada decisão de mérito. Destina-se a coisa julgada material a garantir a segurança extrínseca das relações jurídicas, impedindo qualquer outra decisão a respeito da mesma lide.
1.Generalidades sobre o instituo da coisa julgada: distinção entre coisa julgada material e formal, e, preclusão, no direito brasileiro positivo
Parece-nos que se devem ter presente duas premissas importantes nesta temática, quais sejam: 1ª) a sentença pode ser visualizada, pelo menos em dois planos: a) como ato de raciocínio do juiz; b) como ato da autoridade estatal. No tema da coisa julgada afirmamos que este segundo plano é aquele sobre o qual se deve trabalhar.1 Esta metodologia afigura-se-nos tanto mais verdadeira, diante da observação de que, se se fosse, para além do momento de formação da coisa julgada, avaliar a lógica ou o raciocínio de que se serviu o juiz, estar-se-ia mesmo inutilizando a própria autoridade da coisa julgada. Não se pode subordinar, como regra quase absoluta, a ocorrência de coisa julgada à concordância com o raciocínio ou com o processo lógico de que se serviu o juiz. A coisa julgada vale como ato de autoridade estatal.
A chamada coisa julgada material ocorre no momento em que da decisão de uma lide, não mais cabem recursos. É este o rendimento que se pode emprestar ao art. 6º, § 3º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (antiga Lei de Introdução ao Código Civil), um dos textos existentes a respeito, em nosso direito positivo.2 Parece-nos que, esse artigo, ao lado de disciplinar aspecto temporal da ocorrência do fenômeno da coisa julgada, compreende também, ao menos nominalmente e em decorrência dos elementos descritos do texto, o fenômeno da preclusão. Mais especificamente, aí está abrangida, tanto a coisa julgada material, quanto a coisa julgada formal, como, ainda, há espaço para ver-se no texto como aí albergada a preclusão.
Tratar-se-á, primordialmente do instituto da coisa julgada material, que é efetivamente o que envolve a maioria das dificuldades, de que aqui cogitaremos. A coisa julgada material ocorre quando proferida sentença de mérito da qual não cabe mais recurso (O CPC/39 dispunha: “Art. 287. A sentença que decidir total ou parcialmente a lide terá força de lei nos limites das questões decididas”, e decidir a lide é sinônimo de decidir o mérito” tal como no CPC/73, art. 485, caput; e no CPC/2015, art. 966, caput”
É importante ter presente algumas premissas para uma melhor compreensão do assunto.
A coisa julgada material é a qualidade de imutabilidade, ou de imperatividade, ou, ainda, mais precisamente, a autoridade com a qual resta revestida a parte dispositiva de uma sentença; por outras palavras, essa autoridade significa o resguardo duradouro do comando da sentença, que é, sabidamente, de onde resulta a eficácia, residente na sua parte dispositiva. A parte dispositiva (nos sistemas de 39, 73 e no atual) é a parte do conteúdo da sentença sobre a qual gira e sobre o qual incide o regime da coisa julgada material. A chamada coisa julgada formal, a seu turno, significa que houve no processo uma última decisão, através da qual se colocou termo final a um determinado processo.
O termo preclusão (preclusão máxima) deve ficar reservado - ainda que muitos o confundam ou o usam como sinônimo da coisa julgada formal - para hipótese diferente. Significa que, devendo os atos processuais ser praticados dentro de certo tempo e, isto não ocorrendo, operar-se-á preclusão temporal; ou, então, se um dado ato processual já foi praticado, não podendo ser repetido ou praticado novamente, O termo preclusão (preclusão máxima) deve ficar reservado - ainda que muitos o confundam ou o usam como sinônimo da coisa julgada formal -- para hipótese diferente. Significa que, devendo os atos processuais ser praticados dentro de certo tempo e, isto não ocorrendo, operar-se-á preclusão temporal; ou, então, se um dado ato processual já foi praticado, não podendo ser repetido ou praticado novamente, ainda que com alguma mudança, dado que já terá ocorrido preclusão consumativa,3 configuradora da inviabilidade de ser praticado, mais de uma vez, o ato. Ainda, opera se a preclusão lógica - que é uma espécie de preclusão consumativa - a qual se configura quando já se praticou um determinado ato, que poderia não ter sido praticado, pois outro poderia ter sido praticado no seu lugar, mas, tendo sido praticado é logicamente incompatível com o que poderia vir a ser praticado e que não mais poderá vir a sê-lo, denominando-se a isto de preclusão lógica. Como defluiu nitidamente do exposto a coisa julgada formal, por sua vez, se constitui a partir da irrecorribilidade de ato jurisdicional final que confere indiscutibilidade à decisão que põe fim ao processo. Essa indiscutibilidade diz respeito, porém, tão só e exclusivamente em relação ao processo no qual foi exarada.
Desde logo, convém consignar, inexiste coincidência entre o conteúdo de uma decisão de mérito e o da respectiva coisa julgada material. As grandes dificuldades que se revelam envoltas decorrem, em larga escala, precisamente dessa descoincidência entre o conteúdo da sentença e o que, desse conteúdo, em menor escala, fica revestido pela autoridade da coisa julgada. Mais especificamente, o problema gira tendo-se em vista a fundamentação da sentença, com vistas a saber se essa fundamentação, ou parte dela, fica coberta pela autoridade da coisa julgada, tal como conste do dispositivo. Sublinhe-se que, pelo texto do art. 469, inc. II, do CPC/73 (CPC/39, art. 287), não se podia falar em coisa julgada sobre a fundamentação, fosse ela de fato, fosse de direito. No CPC/2015 (art. 504), tanto os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance (interpretação) da pare dispositiva, quanto à verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença (art. 504, I e II do CPC/2015) não são alcançadas pela coisa julgada material. Estes dois últimos textos são iguais ao art., 469, I e II, CPC/73
O inciso III do art. 469 do CPC/1973 estabelecia que a questão prejudicial não era, como regra geral, objeto de coisa julgada, salvo se proposta ação declaratória incidental (CPC 73, arts. 470, 321 e 5º). O CPC/2015 alterou substancialmente o tema ao prever expressamente que autoridade da coisa julgada material também poderá recair sobre a decisão que resolve questão prejudicial, desde que integralmente preenchidos os requisitos expostos no § 1º do art. 503, possibilitando a ampliação objetiva da coisa julgada.
Com a nova disposição legal torna-se, em regra, desnecessária a propositura de ação declaratória incidental para que a qualidade de imutabilidade e indiscutibilidade recaia também sobre a decisão que resolve questão prejudicial. Cumpre ressaltar, no entanto, que ainda mostra-se necessária a propositura de ação declaratória incidental nos processos iniciados na vigência do CPC/1973, diante do que dispõe o art. 1.054 do CPC/2015, aplicando-se a sistemática apenas os processos iniciados na vigência do novo código. Também excetua a legislação processual civil a resolução de falsidade documental incidentalmente resolvida, que não será acobertada pela coisa julgada. A qualidade de imutabilidade e indiscutibilidade somente se agregará à decisão sobre a falsidade de documento se a parte requerer que o juiz a decida expressamente como questão principla (art. 430, parágrafo único, e art. 433 do CPC/2015).
Para que a decisão que resolva expressa e incidentalmente uma questão prejudicial seja acobertada pela autoridade da coisa julgada material, é imprescindível que estejam integralmente presentes os requisitos do art. 503, § 1º do CPC/2015.
O primeiro requisito expressado no art. 503, § 1º, I do CPC/2015 é o de que o julgamento do mérito da ação dependa da resolução da questão prejudicial (art. 503,§ 1º, I do CPC/2015).
O segundo requisito é o de que, a respeito da questão prejudicial, tenha havido contraditório prévio e efetivo (art. 503, § 1º, II do CPC/2015). Em regra se considera observada a garantia constitucional do contraditório (CF/1988, art. 5º LV) com a oportunidade de manifestação da parte. Entretanto, nesta hipótese específica é exigido que a questão prejudicial tenha sido objeto de efetivo debate entre as partes, o que pode ser aferido por meio da análise do comportamento das partes, “quer argumentando, quer provando seu posicionamento, não perdendo oportunidades para tanto”4. Diante disso, não haverá coisa julgada sobre questão prejudicial em caso de revelia, quando houver restrições probatórias ou limitações à cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial (art. 503, § 1º, II, segunda parte, e § 2º, do CPC/2015), bem como quando se averigue o contraditório não pode ser qualificado como efetivo.
Por fim, o juízo competente para julgar a causa principal também deve ser competente, em razão da matéria e da pessoa, para resolver a questão prejudicial como principal, ou seja, não pode ser o juízo absolutamente incompetente para resolver a questão prejudicial, caso esta tivesse sido veiculada em ação autônoma.
Tanto a sentença de mérito, quanto a coisa julgada material que se lhe agrega, a primeira ato jurisdicional, e, a segunda, imprimindo ex lege imutabilidade ao comando emergente da sentença, são realidades que, ordinariamente, se verificam nos processos.
1.1. É conveniente considerarmos a coisa julgada e seu valor na ordem jurídica
2. Coisa julgada e superação de quaisquer possíveis vícios - indiscutibilidade do resultado
3. O princípio dispositivo
4. A eficácia direta e a eficácia reflexa da coisa julgada
5. Os limites temporais da coisa julgada
6. A decisão judicial e os pressupostos para que sobre ela recaia a coisa julgada material
Notas
1 Veja-se trabalho de Salvatore Satta, Giuseppe Chiovenda nel venticinquesimo anniversario della sua morte, in Colloqui e soliloqui di un giurista, p. 449. No direito brasileiro, CPC/39, esse entendimento existiu por texto legal, ou seja, dispunha-se nesse Código: “Art. 800. A injustiça da sentença e a má apreciação da prova ou errônea interpretação do contrato não autorizam o exercício da ação rescisória”. Durante a vigência do CPC/73 continuou a ser esse o entendimento e na deste CPC/2015 certamente permanecerá esse modo de entender.
2 Reza o art. 6º, § 3º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro o seguinte: “Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso”. Na realidade, esse art. 6º, § 3º, não se refere, ao menos linguística e necessariamente, a uma decisão de mérito, e, em rigor, também do ponto de vista linguístico, não se refere a uma decisão final do processo (com ou sem julgamento de mérito). Por isto é que esse texto abrange três realidades, quais sejam a coisa julgada, material e formal. CPC 73, art. 467; V. tb. art. 301, § 3º, 2ª frase; CPC/2015, art. 502; v. tb. art. 337, § 4º; no decorrer do texto procurar-se-á enfrentar a questão consistente em responder se preclusão e coisa julgada formal representam a mesma e idêntica realidade.
3 A preclusão consumativa pode-se dizer pura, quando o ato tenha sido praticado, e, por isso não pode ser praticado novamente; e, pode dizer lógica, quando o ato praticado impede que outro – que poderia ter sido praticado em lugar do que o foi – venha a ser praticado.
4 ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, p. 1.039.
5 ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada (exegese do Código de Processo Civil [arts. 444-475]), p. 191, com largo apoio na demonstração dessa significação.
6 Idem, p. 196; v. também, MOREIRA, José Carlos Barbosa. Eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada, nºs 5 e 6, Revista brasileira de direito processual, v. 32, pp. 47 e 49 ou Temas de direito processual, pp. 107 e 109.
7 Cf. MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil, p. 24. V. o que se diz na nota 9, infra.
8 Cf. NEVES, Celso. Coisa julgada civil, p. 504, 1ª conclusão.
9 V. TESORIERE, Giovanni. Contributo allo studio delle preclusioni nel processo civile, cap. I, 3, p. 35, ao transcrever texto de Chiovenda, nas Istituzioni di direitto processuale civile (Nápoles, 1935, I, p. 343), em que, este último também distingue a coisa julgada da preclusão, que produz efeitos internos ao processo.
10 Em contraste com essa ideia – segurança extrínseca das relações jurídicas – pode-se dizer que a preclusão, ao assegurar a irreversibilidade dos atos praticados no processo, realiza segurança intrínseca do processo, dentro do processo.
11 Cf. NEVES, Celso. Coisa julgada civil, p. 504, 3ª conclusão.
12 Cf. NEVES, Celso. Coisa julgada civil, 8ª conclusão. É, precisamente esta, a posição da lei brasileira (art. 469, I e II).
13 V. amplamente, ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada (exegese do Código de Processo Civil [arts. 444-475]), pp. 202 ss.
14 Cf. MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil, p. 24. O texto itálico e entre colchetes é nosso.
15 V. amplamente, MENDES, João de Castro. Op. cit., p. 46 e ss.
16 LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada, p. 53.
17 Idem, p. 50.
18 V. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado da ação rescisória, p. 193.
19 Cf. MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil, p. 32.
20 MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil, pp. 26-27. Em rigor, em tal hipótese caberá ação declaratória de inexistência de relação jurídica, sem prazo; há algumas decisões que tem admitido essa postulação no âmbito de ação rescisória, em rigor, aplicando o princípio da fungibilidade.
21 Cf. Idem, p. 31. Foi o caso do direito positivo português em dado momento, na linha, de resto, da tradição do direito português das três Ordenações (Cf., ainda, Idem, p. 31, nota 50).
22 A possibilidade de julgamento de questão prejudicial sem pedido refoge do âmbito do princípio dispositivo.
23 Cf. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, v. II, nº 87, p. 208.
24 Idem, p. 741.
25 Ibidem.
26 Cf. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, v. II, nº 299, p. 597.
27 ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada (exegese do Código de Processo Civil [arts. 444-475]), nº 75, p. 102.
28 Idem, nº 178, p. 251.
29 A indicação do texto de lei ou leis, em que se fundamentou o autor sempre foi considerada irrelevante, e, por isto, pode e deve, se for o caso, o juiz alterar o fundamento legal – v. V. amplamente, ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, v. II, p. 74.
30 A causa petendi é significativa de um fato (ou, mais fatos) que justifica a ação, vale dizer, que, dentre as condições da ação diz com o interesse de agir ou interesse jurídico. No direito italiano é chamada de ‘titolo della domanda’; no regime italiano de 1865, a propósito da identidade das ações, tendo em vista a coisa julgada, lia-se no art. 1.351 que a ação, para ser igual a outra, que estar fundada sobre a “medesima causa”. Outros autores, como Betti (cf. Diritto processuale civile, nº 40, p. 174) referia-se à “ragione dell’azione”.
31 Há acórdão da Corte de Cassação italiano, de 30.6.1954 (v. ROCCO, Ugo. Tratado de direito processuale civil, v. I, p. 352 que bem delimita os poderes do juiz: “[i]l potere del giudice di qualificare sotto l’aspetto giuridico i fatti, che la parte gli prospetta, incontra il limite constituido dal rispetto del principio della correspondenza tra il chiesto ed il pronunciato, nel senso che il giudice non può attribuire ai fatti esposti della parte, un effetto giuridico diverso da quallo che à domandado dalla parte stessa, ancorchè in linea di diritto tale effeto si ricolleghi ai fatti dedotti”.
32 V. nesse sentido as posições de Teresa Arruda Alvim (Nulidades do processo e da sentença, p. 346), Nelson Nery Júnior (Princípios do processo na Constituição Federal, pp. 66 a 79.) e Eduardo Talamini (Coisa julgada e sua revisão, pp. 351 a 353), entre outros.
33 V. amplamente, ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, p. 66. Para o direito alemão, austríaco e italiano, no particular, v. na obra imediatamente citada, vol II, notas 82 e 83, p. 145. Para que ocorra um dos fenômenos é irrelevante que se altere a posição de autor para a de réu, e vice-versa (V. amplamente, ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil, p. 145, nota 82). Esta inversão, do polo ativo ao passivo, não altera a identidade ou a condição jurídica da parte (v. WOLF, Karl. Grundriß des österreichischen Zivilprozeß, p. 207; igualmente, BÜLOW, Oskar. La teoría de las excepciones procesales, p. 37.)
34 Cf. HEINITZ, Ernesto. Limiti oggettivi della cosa giudicata, p. 13 (v. tb. pp. 87 e 129), o qual observa – com razão – que o fenômeno da coisa julgada não se exaure no trancamento da segunda ação, mas que indubitavelmente é esse o aspecto mais relevante do tema.
35 Há autores que entendem ser a chamada eficácia reflexa idêntica à chamada eficácia direta, que é havida como a eficácia, própria, da coisa julgada – é o caso de Girolamo A. Monteleone (I limitti soggettivi del giudicato civile, passim.)
36 O exemplo é de Castro Mendes – v. MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil, p. 51.
37 Assim também no direito processual português (art. 581, nº 3, do Código de Processo Civil português de 2013 – Lei 41, de 26 de junho de 2013), ainda que Castro Mendes tenha criticado a solução que o equivalente dispositivo de lei anteriormente vigente exigia (art. 498, nº 3, Código de Processo Civil português aprovado pelo Decreto Lei 44.129 de 28 de dezembro de 1961, na redação dada pelo Decreto-Lei 47.690, de 1967). (MENDES, João de Castro. Op. cit., pp. 353-361).
38 Cf. MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil, p. 59, observando, todavia, que situação anterior não fica coberta.
39 Diz João de Castro Mendes, diante disso, que uma sentença e, bem assim, a coisa julgada que a reveste, subsistem rebus sic stantibus. (Idem, p. 51)
40 No direito brasileiro o efeito preclusivo, através do qual se obsta a que à petição inicial se agreguem outros fatos, e, em relação à defesa, decorrem de momentos anteriores à possibilidade de formação da coisa julgada. A alteração do pedido não é mais possível depois da citação (art. 329, I, do CPC/2015), salvo consentimento do réu (art. 329, II, do CPC/2015), e, depois do saneamento do processo é inviável, de forma absoluta. Em relação ao réu é, fundamentalmente inviável proceder-se a novas alegações (art. 342, caput, do CPC/2015). Questões de fato, todavia, poderão ser propostas no juízo de segundo grau, quando apenas quando a lei expressamente autorizar (v. art. 342, III, do CPC/2015). Em regra, portanto, a cristalização do pedido e de sua causa de pedir, e, de outra parte, da contestação, ocorrem antes da coisa julgada. Desta forma, quando o art. estabelece que “[t]ransitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido” (art. 508 do CPC/2015), significa, basicamente o seguinte: a) não é, precisamente, quando passe em julgado a sentença que ocorre o óbice, aos dois sujeitos parciais, de deduzirem alegações que lhes sejam favoráveis; b) mas, diante da hipótese do art., poderá haver alegação de questões de fato, no juízo de apelação, desde que comprovada a força maior; c) mas, passada em julgado a sentença, tais alegações são absolutamente inviáveis, não só no processo, como também, em qualquer outro, dado que, reputar-se-ão repelidas pela própria sentença que passou em julgado. É certo, todavia, que alegações constituem-se em argumentos ou fatos inseridos dentro da causa petendi do processo em que se formou coisa julgada; se, todavia, tratar-se a alegação de outra causa petendi, não terá sido julgada e nem poderia ter sido; e, portanto, é incogitável que pudesse ficar coberta pela autoridade de coisa julgada.
41 É o que expressivamente sustenta-se na doutrina alemã – Cf. JAUERNIG, Othmar. Das Fehlerhafte Zivilurteil, p. 175 e nota 129, onde se veem as seguintes colocações, linguisticamente expressivas: a) trata-se, uma tal sentença, de um golpe no ar (‘Schlag in die Luft’- Hellwig, v. nota infra); b) de um golpe na água (Schlag ins Wasser, Seckel).
42 V. tb. HELLWIG. System des deutschen Zivilprozeß [Sistema de direito processual civil alemão], § 174, I, p. 174, que trata deste tema dentre as sentenças inexistentes, constituindo-se estas em sentenças a que faltam elemento(s) essencial(ais), e, pois, ainda que emanadas como sentenças, tais não podem ser consideradas (v. op. ult. cit., § 174, inc. II, p. 555).
Referências
ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. 17. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.
ARAGÃO, Egas Moniz de. Sentença e coisa julgada (exegese do Código de Processo Civil [arts. 444-475]). São Paulo: AIDE, 1992.
BÜLOW, Oskar, La Teoría de las Excepciones Procesales, Trad. Argentina. Buenos Aires: Jurídicas Europa-América, 1964.
GUASP, Jaime. Comentários a la Lei de Enjuiciamiento Civil. Madrid: Aguillar, 1942.
HEINITZ, Ernesto. Limiti oggettivi della cosa giudicata. Padova: CEDAM 1937.
JAUERNIG, Othmar. Das Fehlerhafte Zivilurteil. Frankfurt: Vittorio Klosterman, 1958.
MENDES, João de Castro. Limites objetivos do caso julgado em processo civil. Lisboa: Ática Limitada, 1968.
MONTELEONE, Girolamo A.. I limitti soggettivi del giudicato civile. Padova: CEDAM, 1978.
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada. Revista brasileira de direito processual, v. 32.
__________________. Eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada. Temas de direito processual, 3ª série. São Paulo: Saraiva.
NERY JR., Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal. 12. ed. rev. atual. e ampl. Sumulas do STF (simples e vinculante) e com o Novo CPC (Lei nº 13.105/2015), São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
NEVES, Celso. Coisa julgada civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1971.
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1976.
SATTA, Salvatore. Giuseppe Chiovenda nel venticinquesimo anniversario della sua morte, in Colloqui e soliloqui di un giurista. Padova: CEDAM, 1968.
TESORIERE, Giovanni. Contributo allo studio delle preclusioni nel processo Civile. Padova: CEDAM, 1983.
Citação
ALVIM, Thereza, ALVIM NETTO, José Manoel de Arruda. Coisa julgada. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Processo Civil. Cassio Scarpinella Bueno, Olavo de Oliveira Neto (coord. de tomo). 2. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2021. Disponível em: https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/177/edicao-2/coisa-julgada
Edições
Tomo Processo Civil, Edição 1,
Junho de 2018
Tomo Processo Civil, Edição 2,
Julho de 2021
Última publicação, Tomo Processo Civil, Edição 3,
Novembro de 2024